O que que eu faço com este “quê”? Como evitar o queísmo em textos

Sérgio Barcellos Ximenes
21 min readJan 4, 2020

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Tema: o uso abusivo de quês em textos literários, e as técnicas disponíveis para se evitar esse vício de linguagem denominado queísmo.

Recursos oferecidos:

1. Exemplos de alterações possíveis: 150 modificações realizadas em frases do romance Mongólia, de Bernardo Carvalho (2003), para eliminar os quês, sem alteração do sentido pretendido pelo autor.

2. Estratégia de eliminação de quês em textos literários.

Observação

. Este post atualiza um texto original do meu antigo Blog do Romance (2003–2005), publicado mais tarde no capítulo homônimo do livro digital A Técnica do Romance: Dicas de Análise e Criação (2015).

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Apresentação

No âmbito do estilo, uma das palavras mais incômodas para um escritor é o que. As mais de vinte funções cumpridas pelo que ou quê em nosso idioma…

Veja algumas delas aqui: https://centraldefavoritos.com.br/2018/03/01/funcoes-do-que-e-do-se/

… já indicam a alta probabilidade de ocorrência do termo em uma oração. Quando as frases se sucedem, o uso repetido dessa palavra pode ameaçar a impressão de zelo com o texto, uma das marcas do profissionalismo na escrita. E a sonoridade dura trazida às frases pelos quês pode incomodar leitores de ouvido sensível.

Embora o cuidado deva ser maior no texto artístico, mesmo em textos jornalísticos a palavra recebe atenção especial, como prova este trecho reproduzido do Manual de Redação da “Folha de S. Paulo”, versão online:

. que Evite o excesso de ques, para tornar o texto mais elegante e a leitura mais ágil. Muitas vezes é melhor usar ponto e dividir o período em dois: O ministro disse que o governo vai investigar a fraude. Prometeu demitir os culpados em breve em vez de O ministro disse que o governo vai investigar a fraude e que os culpados serão demitidos em breve.

https://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/manual_texto_q.htm

A recomendação do manual da Folha se refere somente à repetição da palavra no texto.

O trecho abaixo reproduz uma recomendação do Manual de Redação e Estilo do “Estado de S. Paulo”, versão online:

. Que é, que era, que foi. Suprima a expressão, sempre que possível: A polícia só admitirá manifestações (que forem) pacíficas. Empresas obtêm lucros muito acima do (que era) previsto. O homem (que é) esforçado vence na vida. O ladrão (que foi) preso pela multidão conseguiu escapar.

https://www.estadao.com.br/manualredacao/esclareca/q

A recomendação do manual do Estadão dá exemplos de eliminação do quê supérfluo em frases.

O criador dos modernos manuais de estilo, o francês Antoine Albalat, reservou ao tema uma seção de seu livro A Arte de Escrever Ensinada em Vinte Lições, intitulada “O emprego dos ‘ques’”.

Folha de rosto da tradução em português

. “Uma das grandes causas da dureza no estilo é o emprego frequente dos ‘ques’, e aqui esbarramos num hábito inveterado nos bons autores do século XVII. […] todos os autores daquela época, fosse qual fosse o seu gênero, empregaram correntemente os ‘ques’, em detrimento da harmonia.” (pp. 138–139, tradução de Cândido de Figueiredo.)

Mais adiante, Albalat registra a mudança de critério ocorrida na história da Literatura:

. “Flaubert proscrevia-os, como ao maior escolho da harmonia.” (p. 142.)

Na mesma página, o escritor sugere uma regra geral flexível:

“É preferível não os multiplicar e servir-vos deles sobriamente; mas não há que hesitar, quando a clareza e a originalidade se impõem.” (p. 142.)

No passado e no presente

O uso do quê era livre em histórias do século XIX. Mesmo jornalistas enfileiravam quês em seus textos de ficção, sem realizarem o teste auditivo (ou mesmo visual) da frase.

Alguns exemplos:

1. Uma comédia numa tragédia, Justiniano José da Rocha (1837) ― 4 usos.

. […] que diverso que foi o espetáculo que achei, do espetáculo que esperava.

2. A Moreninha, Joaquim Manuel de Macedo (1844) ― 5 usos.

. — Eis aqui, meu Augusto, o lamentável estado em que me acho. Lembra-te que foram os teus conselhos que me obrigaram a experimentar uma paixão romântica; portanto, não só por amizade, como por dever, conto que me ajudarás no que te vou propor.

3. O Guarani, José de Alencar (1857) ― 3 usos.

. ― [..] Diz a Escritura que não há pior surdo do que aquele que não quer ouvir. [Repare na combinação sonora com aquele e quer.]

4. Lésbia, Maria Câmara Benedita Bormann, a Délia (1890) ― 4 usos.

. — E por que não escreverei tudo que me vem à mente?… Acaso sofreram mais do que eu os que escrevem?…

5. A Rainha do Ignoto, Emília Freitas (1899) ― 5 usos.

. Ele concordou logo que Valentim tinha um pouco de razão, pois estava fora de dúvida que por aquelas paragens existia a verdadeira causa que dava origem à crença do povo; mas, em que sítio morava essa rica senhora, que se comprazia em mistificar os simples habitantes daquela povoação com seus caprichos romanescos?

6. Machado de Assis.

Uma das (muitas) críticas do inimigo assumido Sílvio Romero a Machado de Assis, no tempo de vida do Bruxo do Cosme Velho, foi justamente o abuso dos quês. Nas traduções de poemas, Romero contou 118 utilizações dessa partícula. Além disso:

“Há em seus romances pequenos, capítulos de dez a doze linhas com seis a oito quês.

“Igual defeito nota-se nas poesias, Nas Ocidentais, por exemplo, Mundo Exterior, em catorze versos, tem oito; A Mosca Azul, em dezesseis quadras, dezoito; os vinte e quatro versos dedicados a Victor Hugo (pág. 325) onze; Perguntas sem resposta, em dezessete quadras, dezesseis, e assim por diante.”

Outros Estudos de Literatura Contemporânea, página 9, Sílvio Romero, Rio de Janeiro (RJ), 1906 — https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/4490

Também em textos literários modernos, qualquer leitor focado nesse detalhe estilístico pode encontrar exemplos de uso desnecessário do quê.

Alguns exemplos:

1. Manuscrito Encontrado em Acra, Paulo Coelho (2012) ― 4 usos.

. “Agora que estou no fim da vida, deixo para os que vierem depois tudo aquilo que aprendi enquanto caminhava pela face da Terra. Que façam bom uso.”

2. Um Lugar Perigoso, Luiz Alfredo Garcia-Roza (2014) ― 5 usos.

. […] passou a anotar em ambos os lados de cada folha quadriculada de uma caderneta aquilo que julgava importante dessas leituras, que em muitos casos eram releituras. Era de opinião que a perda da memória era progressiva e irreversível, que a princípio fazia desaparecer as palavras para depois apagar ou embaralhar as imagens, embora fosse de opinião que o processo não apagaria o pensamento.

3. Meia-Noite e Vinte, Daniel Galera (2016) ― 4 usos.

. […] mas, se houve um antes e um depois, um marco entre a vida que parecia que eu iria ter e a vida que tive, esse marco foi a notícia de que o Andrei havia sido assassinado num assalto à mão armada, na noite anterior […]

4. Os Visitantes, Bernardo Kucinski (2016) ― 5 usos.

. É claro que não. Deu para ver pelo livro que o senhor escritor não fala iídiche. Eu disse: Realmente não falo iídiche, respondi. Ela disse: É sobre o holocausto, o senhor escritor escreveu que os alemães registravam todas as pessoas que matavam, mas isso não é verdade! Só registravam os que eram separados para o trabalho forcado, e só em Auschwitz.

5. Como se Estivéssemos em Palimpsesto de Putas, Elvira Vigna (2016) ― 4 usos.

. Não fica nas que estão no térreo do Fredimio e que são sujas e barulhentas e barra­-pesada. Vai para a melhor boate que dá para ir a pé, e que é a Barbarella.

No livro A Fórmula do Texto (2004), de Wander Emediato, um subitem do capítulo 3 tem por título Um vício de subordinação a ser evitado: o queísmo. As cinco sugestões do autor estão incorporadas às alterações realizadas abaixo nas frases do romance Mongólia, de Bernardo Carvalho.

Atualmente, várias apostilas impressas e páginas da Web sobre o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) contêm, no item queísmo, sugestões de como evitar ou reduzir o uso dos quês na redação obrigatória desse exame.

Use a palavra queísmo no Google para consultar essas apostilas.

O quê no romance Mongólia, de Bernardo Carvalho

Uma das primeiras impressões causadas pela leitura do romance de Bernardo Carvalho, na área do estilo, foi justamente a presença frequente do quê nas frases. Depois de algumas páginas, voltei ao início e marquei, por curiosidade, todos os quês utilizados até aquele ponto da história.

Descontada a primeira página da história, na qual o texto ocupa somente metade do espaço, as seis páginas seguintes apresentam estas ocorrências da palavra que, para uma página de 31 linhas: 15, 16, 11, 17, 20, 18 vezes. No total, 97 quês em 6 páginas.

Usarei cento e cinquenta trechos do romance para demonstrar as alternativas disponíveis a um escritor quando ele deseja evitar o uso dessa palavra. As alternativas vão desde a simples eliminação do quê até a reformulação total da frase.

Evidentemente, outros critérios poderiam se sobrepor, em um texto artístico, aos de economia no uso do quê e de harmonia auditiva. Além disso, muitas alterações propostas abaixo substituem verbos (palavras designativas de ações) por substantivos ou adjetivos (palavras designativas de coisas, seres, situações, condições, qualidades ou estados), acarretando perda no dinamismo das sentenças. Em uma história com as características de Mongólia, baseada em diários, contada em ritmo lento e desprovida de conflitos empolgantes, os verbos acabam funcionando como um contraponto desejável à falta de vivacidade da narração.

As mudanças realizadas abaixo, portanto, visam somente provar como é viável a busca de uma alternativa quando o autor se depara com um quê escrito por ele mesmo, sem representarem uma crítica à escolha estética de Bernardo Carvalho.

Os itálicos indicam as partes substituídas e as substituições efetuadas.

* * *

1. “Foi chamado de Ocidental por nômades que não conseguiam dizer o seu nome […]” (p. 9.)

… por nômades incapazes de dizer o seu nome…

2.Fazia tempo que eu não ouvia falar dele, […]” (p. 9.)

Fazia tempo eu não ouvia falar dele,…

3. “[…] só pode ser o que nasceu em Xangai, […]” (p. 9.)

… só pode ser o nascido em Xangai,…

4. “[…], o que pode ter servido de explicação para alguns, mas não para mim.” (p. 9.)

…, explicação satisfatória (ou plausível) para alguns,…

5.Ao que parece, […]” (p. 9.)

Aparentemente,…

6. “Os policiais o seguiram assim mesmo, sem que ele percebesse.” (p. 9.)

… o seguiram assim mesmo, sem serem percebidos.

7. “A polícia alega que foi imprudente. Liguei para um diplomata do Itamaraty que vive em Varsóvia e que o conhecia desde pequeno.” (p. 10.)

A polícia alegou imprudência do Ocidental. Liguei para um diplomata do Itamaraty, residente em Varsóvia e conhecido dele desde pequeno.

8.Do que ouviu de amigos comuns, […]” (p. 10.)

Com base no relato de amigos comuns,…

9.Desde que me aposentei, […]” (p. 10.)

Desde a minha aposentadoria,…

10. “[…] pensando que era domingo, […]” (p. 10.)

pensando ser domingo,…

11. “[…] o dia em que costumava vir à praia […]” (p. 10.)

o dia da sua costumeira (ou habitual) vinda à praia…

12. “[…], era o que eu seguia repetindo […]” (p. 10.)

… , eu seguia repetindo…

13.Aonde é que eu vim morrer?” (p. 11.)

Aonde eu vim morrer?

14. “[…] os netos, que aparecem raramente e de hábito sem avisar, […]” (p. 11.)

…os netos, visitas raras e habitualmente inesperadas,…

15. “[…] protelar mais uma vez o projeto de escritor que venho adiando desde que entrei para o Itamaraty […]” (p. 11.)

… o projeto de escritor, adiado desde a minha entrada no Itamaraty,…

16. “Bastaria começar a escrever. Ninguém vai prestar atenção no que eu faço.” (p. 11.)

… ninguém vai prestar atenção no resultado (ou na minha tentativa). (O sentido não está claro.)

17.O fato é que a notícia da sua morte me deixou […]” (p. 11.)

A notícia de sua morte me deixou…

18. “[…] deviam estar comigo as coisas que ele tinha deixado na embaixada […]” (p. 11.)

… as coisas deixadas por ele na embaixada…

19. “[…] deixar de dizer o que pensava por respeito à hierarquia […]” (p. 11.)

… deixar de expressar seus pensamentos por respeito…

20. “Eu sabia bem o que era isso.” (p. 12.)

Eu conhecia bem essa experiência.

21.Era provável que, ao voltar para Xangai, […]” (p. 12.)

Provavelmente, ao voltar para Xangai,…

22. “[…] decidido a abandonar a carreira, que largou um ano antes, […]” (p. 12.)

… decidido a abandonar a carreira, largada um ano antes,…

23. “Não tenho dúvidas de que tive um papel determinante na decisão.” (p. 12.)

Não tenho dúvidas sobre o meu papel determinante na decisão.

24. “[…] comodidade que o Itamaraty me dava […]” (p. 12.)

… comodidade oferecida pelo Itamaraty…

25.Eu tive que assumir a embaixada […]” (p. 12.)

Fui obrigado a assumir a embaixada…

26. “[…] o cônsul teve que ser deslocado.” (p. 12.)

… o cônsul teve de ser deslocado.

27. “[…] fazia um ano que ela decidira […]” (p. 12.)

… fazia um ano ela decidira

26. “Me pareceu gratuito, um mero capricho, que se recusasse a acatar […]” (p. 13.)

Me pareceu gratuita, um mero capricho, a sua recusa em acatar…

27. “No fundo, sempre achei que fossem documentos sem importância.” (p. 13.)

No fundo, sempre os considerei documentos sem importância.

28. “[…] sem nem ao menos saber do que tratavam [os documentos].” (p. 13.)

… sem nem ao menos saber o seu teor.

29. “[…] os arquivos mortos e as tralhas inúteis que me sobraram de tantas viagens e […]” (p. 13.)

… e as tralhas inúteis, resquícios (ou sobras) de tantas viagens…

30. “[…] passei horas à procura da pasta em que devia ter metido aqueles papéis, que encontrara por acaso […]” (p. 13.)

… da pasta onde devia ter metido aqueles papéis, encontrados por acaso…

31. “Mas é lógico que, se ele tivesse […]” (p. 14.)

Mas, logicamente, se ele tivesse…

32. “[…] um diário que ele escreveu na forma de uma longa carta à mulher, e que nunca enviou.” (p. 14.)

… um diário redigido na forma de uma longa carta à mulher, e jamais remetido a ela.

33.E foi só então que toda a história […]” (p. 14.)

Só então toda a história…

34. “[…] tinha pedido ao Itamaraty que tomasse as devidas providências e o ajudasse a encontrá-lo.” (p. 14.)

… tinha solicitado ao Itamaraty as devidas providências, além de uma ajuda para encontrá-lo.

35. Tínhamos que mandar alguém […]” (p. 14.)

Precisávamos mandar alguém…

36. “[…] não queriam que as autoridades mongóis fossem avisadas […]” (p. 14.)

não queriam avisar às autoridades mongóis…

37.Achei que tinha acontecido alguma coisa terrível.” (p. 15.)

Suspeitei da ocorrência de alguma coisa terrível.

38.Fingi que não tinha ouvido.” (p. 16)

Fingi não ter escutado.

39. “[…] e pedi que se retirasse, […]” (p. 16.)

e solicitei a sua retirada…

40. “[…] cidade que chamava de p*** na carta-diário […]” (p. 16.)

… cidade qualificada de p***…

Asteriscos destinados a evitar a classificação do blog como adulto.

41. “[…] a partir do instante em que entendeu que não podia recusar a missão, […]” (p. 16.)

tão logo percebeu a impossibilidade de recusar a missão…

42.Desde que pusera os pés em Pequim, […]” (p. 16.)

Desde a sua chegada a Pequim,…

43. “[…], que era justamente do que ele vinha tentando escapar.” (p. 16.)

…, justamente a situação da qual vinha tentando escapar.

44. “[…] acirravam as contradições que lá permanecem até hoje nos traços da urbanização.” (p. 17.)

… as contradições mantidas (ou vigentes) até hoje…

45. “As casas que hoje não se tornaram museus foram ocupadas […]” (p. 17.)

As casas não transformadas em museus foram…

46.Há um palácio dentro da Cidade Proibida que me impressionou ainda mais que os outros, e você é a única pessoa no mundo que pode entender do que estou falando.” (p. 19.)

Um palácio dentro da Cidade Proibida me impressionou além (ou acima) de todos os outros, e você é a única pessoa do mundo capaz de entender o motivo.

47. “[…] o seu testamento com o nome do filho que o sucederia e […]” (p. 19.)

… com o nome do filho destinado a sucedê-lo e…

48. “Você pode imaginar todas as intrigas que isso provocava, […]” (p. 19.)

… todas as intrigas provocadas por isso,…

49. “Tínhamos discutido sobre Pequim na semana em que ele chegou, […]” (p. 20.)

… na semana de sua chegada,…

50. “[…] a riqueza do confronto que se manifestava na arquitetura […]” (p. 20.)

… a riqueza do confronto manifestada (ou manifestado) na arquitetura…

51. “Transcrevo outros trechos do diário que falam da cidade: […]” (p. 20.)

… outros trechos do diário referentes à cidade:…

52.Sempre que posso, caminho pela cidade […]” (p. 21.)

Quando posso, caminho…

53. “[…] o parque é tomado por velhos que se exercitam de várias maneiras, […]” (p. 21.)

… é tomado por velhos se exercitando de várias maneiras,…

54. “Bastou eu pôr os pés de novo nas ruas para voltar a impressão de que estava diante de […]” (p. 21.)

… para voltar a impressão de estar diante de…

55. “É possível que haja uma minoria ativa […]” (p. 21.)

Pode até haver uma minoria ativa…

56. “A impressão é que a cultura não valoriza nenhum sentido estético além do mais absolutamente imediato […]” (p. 22.)

A impressão é de uma cultura incapaz de valorizar algum sentido estético além…

57. “Daí que acabei chegando à conclusão […]” (p. 22.)

Daí, concluí

58. “Demorei a perceber que havia humildade na sua aparente arrogância […]” (p. 23.)

Demorei a perceber a humildade na sua aparente arrogância…

59. “[…] quando soube que ele se interessava por arte.” (p. 23.)

… quando soube do seu interesse pela arte.

60. “E a princípio até que gostei do tom peremptório com que defendia o seu ponto de vista […]” (p. 23.)

E a princípio até gostei do tom peremptório empregado na defesa do seu ponto de vista…

61. “Minha tese, que me dizem ser superficial, já que não falo nem leio chinês, […]” (p. 24.)

Minha tese, tachada por alguns de superficial, pois não falo…

62. “Mas ao mesmo tempo perderiam o que têm de mais precioso.” (p. 25.)

… perderiam sua qualidade mais preciosa.

63. “Infelizmente, parece que esse processo é irreversível”. (p. 25.)

Infelizmente, esse processo parece irreversível.

64.Eram argumentos que só expunham o seu desespero de saber que nunca poderia compreender aquela cultura, que havia todo um mundo do qual ele nunca poderia participar, por mais que se esforçasse, por mais que batesse o pé.” (p. 25.)

Esses argumentos só expunham o seu desespero de saber-se para sempre incapaz de compreender aquela cultura, para sempre alijado de todo um mundo do qual ele jamais poderia participar, não importava o seu esforço, não importava a sua insistência.

65. “Para um chinês que tivesse acabado de chegar ao Brasil, […]” (p. 25.)

Para um chinês recém-chegado ao Brasil,…

66. “Mas por causas que eram evidentemente outras.” (p. 26.)

Mas por causas evidentemente diversas.

67. “[…], mesmo que não fosse de todo infundada.” (p. 26.)

…, embora não fosse totalmente infundada.

68. “…, sempre achei que houvesse um tipo de incompatibilidade […]” (p. 28.)

…, sempre suspeitei existir um tipo de incompatibilidade…

69. “Já no que se refere às artes, até que cheguei a concordar […]” (p. 28.)

quanto às artes, cheguei mesmo a concordar…

70. “Na literatura, pelo pouco que eu conhecia, minha impressão era que já disseram tudo.” (p. 28.)

Na literatura, a valerem meus parcos conhecimentos, minha impressão era já terem falado tudo.

71. “E foi só por isso que eu lhe falei de Lu Xun, que ele nunca tinha lido.” (p. 28.)

E só por isso eu lhe falei de Lu Xun, cujas obras ele nunca tinha lido.

72. “Está convencido de que é herói.” (p. 28.)

Está convencido de ser um herói.

73. “[…] é uma alegoria da literatura moderna, que só é possível quando os nomes […]” (p. 29.)

… uma alegoria da literatura moderna, possível quando os nomes…

74. “[…] que marca a civilização ocidental (mas que é bem menos clara no Oriente) […]” (p. 29)

evidente na civilização ocidental (mas bem menos clara no Oriente)…

75. “Eis um trecho do diário do dia em que partiu, em que revela a ironia de sentir […]” (p. 31.)

… um trecho do diário no dia de sua partida, no qual revela…

76.Muito do que ele dizia da China, […]” (p. 32.)

Muitas de suas afirmações sobre a China…

77.Foi só depois desse telefonema, no entanto, que o pai do desaparecido […]” (p. 33.)

depois desse telefonema, no entanto, o pai do desaparecido…

78. “O filho, que era fotógrafo profissional, […]” (p. 33.)

O filho, fotógrafo profissional,…

79. “[…] ele decidiu que começaria ali o relato […] “ (p. 33.)

… ele decidiu começar ali ao relato…

80. “Um passageiro que viajava ao lado dele disse […]” (pp. 33–34.)

Um passageiro a seu lado disse…

81. “Não sei até que ponto posso confiar no que escreveu, já que ele mesmo […]” (p. 34.)

Não sei o quanto (ou até onde) posso confiar no seu relato, pois ele

82. “[…] mausoléu soturno em que supostamente estavam guardados […]” (p. 34.)

… mausoléu soturno onde supostamente…

83.É possível que já tivesse aprontado alguma no passado.” (p. 35.)

Possivelmente já aprontara alguma no passado.

84. “Queriam que tudo fosse feito na maior discrição […]” (p. 35.)

Queriam tudo feito na maior discrição…

85. “[…] não tinham certeza nem mesmo de que ele estivesse desaparecido.” (p. 35.)

… nem mesmo de seu desaparecimento.

86. “[…] e com quem, ao que tudo indicava, […]” (p. 35.)

… e com quem, assim tudo indicava,…

87. “[…] naquele inverno, um dos mais rigorosos de que já se tivera notícia.” (p. 35.)

… naquele inverno, um dos mais rigorosos já registrados (ou vividos).

88. “[…], assim que avistou o Ocidental, […]” (p. 36.)

…, ao avistar o Ocidental,…

89. “Deve haver outro [diário], em que ele transcreveu os últimos dias […] “ (p. 36.)

Deve haver outro, no qual ele transcreveu…

90. “[…] com as reservas que de pronto o guia manifestou em relação ao colega […]” (p. 36.)

… com as reservas manifestadas de pronto pelo guia em relação…

91. “Também havia casais que conversavam na esquina, […]” (p. 38.)

Também havia casais conversando na esquina…

92. “É de bom agouro […] , sempre que depara com um.” (p. 41.)

É de bom agouro,…, ao se deparar com um.

93. “[…] é uma darkhad que se casou com um tsaatan, […]” (p. 44.)

… é uma darkhad casada com um tsaatan…

94. “É uma precaução para que não sejam atacadas pelos lobos.” (p. 44.)

para evitar um ataque dos lobos.

95. “[…] pendurá-la numa espécie de berço que pende, na vertical, das vigas que sustentam a tenda, […]” (p. 45.)

… numa espécie de berço pendente, na vertical, das vigas onde a tenda se apoia,…

96. “A vida dura faz com que pareçam muito mais velhos do que na realidade são.” (p. 45.)

A vida dura envelhece a sua aparência.

97. “Foi quando descobriu que podia falar com os espíritos […]” (p. 45.)

… descobriu o seu dom de falar com os espíritos…

98. “[…] como se consultasse alguma coisa que não podemos ver.” (p. 45.)

… alguma coisa invisível para nós.

99. “[…], motivos que se espalham e se repetem por toda a Mongólia, […]” (p. 47.)

… motivos difundidos e recorrentes por toda a Mongólia,…

100. “[…]; o Palácio da Cultura, que era um edifício medonho e alto […]” (p. 47.)

… ; o Palácio da Cultura, um edifício medonho e alto…

101. “Até que o dinheiro chegasse, […]” (p. 48.)

Até o dinheiro chegar,…

102. “O percurso que ele queria fazer era uma loucura […]” (p. 48.)

O percurso planejado por ele era uma loucura…

103. “[…] mas, ao que tudo indicava, só deixaram mesmo de se falar depois que o rapaz desapareceu.” (p. 48.)

… mas, assim tudo indicava, só deixaram mesmo de se falar depois do desaparecimento do rapaz.

104. “[…] e por ter voltado para UB sem o seu cliente, o que era inadmissível.” (p. 48.)

… sem o seu cliente, algo (ou uma conduta) inadmissível.

105. “Ao voltar a UB, […] , houve uma manhã em que o rapaz decidiu […]” (p. 51.)

Ao voltar a UB,… , em uma das manhãs o rapaz decidiu…

106. “Enquanto admiro a estátua imensa que há dentro do templo, […]” (p. 51.)

… admiro a estátua imensa no interior do templo,…

107. “[…] a lhe entregar os pertences do desaparecido, para que os remetesse ao Brasil” (p. 52.)

… , para remetê-los ao Brasil.

108. “[…], na Mongólia, ao contrário do que ocorria em outras partes do mundo, […]” (p. 57.)

… , na Mongólia, ao contrário do costume em outras partes do mundo,…

109. “E foi enquanto esperava que lhe trouxessem as malas, que já tinham sido despachadas, que ele teve a ideia.” (p. 57.)

E durante a espera pelas malas, então já despachadas, ele teve a ideia.

110. “[…] era uma mulher que só pensava nas coisas materiais e nos prazeres […]” (p. 59.)

… uma mulher obcecada pelas (ou totalmente voltada para as) coisas materiais…

111. “[…], idêntica à do diário que o Ocidental havia lido na véspera, […]” (p. 61.)

… idêntica à do diário lido pelo Ocidental na véspera, …

112.Tenho que falar com as monjas.” (p. 67.)

Preciso falar com as monjas.

113. “Atravessou salas e mais salas, até que chegou às pinturas religiosas, […]” (p. 73.)

…, até chegar às pinturas religiosas, …

114. “Ouve em silêncio o que Ganbold tem para lhe contar sobre o desaparecimento […]” (p. 75.)

Ouve em silêncio o relato de Ganbold sobre o desaparecimento …

115. “Ele lhe diz que é o mesmo que o havia acompanhado no ano anterior, na visita que fizeram ao mosteiro.” (p. 75.)

Ele lhe informa ser a mesma pessoa com a qual tinha visitado o mosteiro no ano anterior.

116. “Ganbold traduz para a monja o que digo em inglês.” (p. 75.)

… traduz para a monja a minha fala em inglês.

117. “Me deseja boa sorte no que procuro.” (p. 80.)

Me deseja boa sorte na minha busca.

118. “[…] além de montarem e desmontarem as iurtas sempre que mudam de acampamento.” (p. 81.)

… desmontarem as iurtas nas mudanças de acampamento.

119. “O vale é uma fenda que vai entrando e subindo pela montanha, […]” (p. 83.)

O vale é uma fenda entrando e subindo pela montanha…

120. “[…] sem, no entanto, entender o que isso significava.” (p. 86.)

… sem, no entanto, entender o significado disso.

121. “[…] onde ficavam os mosteiros que foram destruídos […]” (p. 90.)

… onde ficavam os mosteiros destruídos…

122. “Só quando chego no alto é que vejo a escadaria de blocos de pedra que desce do outro lado até […]” (p. 91.)

Só quando chego no alto eu vejo a escadaria de blocos de pedra descendo do outro lado…

123. “Os monges, vendo que o cerco se fechava, […] “ (p. 94.)

Os monges , vendo o cerco se fechando (ou se fechar),…

124. “[…] e fotografar o lugar exato em que o velho lama […]” (p. 96.)

… e fotografar o lugar exato onde o velho lama…

125. “[…] sobretudo no que se refere aos aspectos […]” (p. 97.)

… sobretudo quanto aos aspectos…

126. “[…] o lugar que a arte conquistou no Ocidente, […]” (p. 103.)

… o lugar conquistado pela arte no Ocidente,…

127. “A Igreja não permite que a arte se manifeste […]” (p. 103.)

A Igreja não permite manifestações artísticas

128. “O horror que o desaparecido demonstrava pela religião […] “ (p. 103.)

… o horror demonstrado pelo desaparecido ante a religião…

129. “Precisava de alguém que o guiasse pelo mesmo percurso […]” (p. 104.)

Precisava de alguém para guiá-lo pelo mesmo percurso…

130. “O Ocidental teve que pagar caro […]” (p. 104.)

O Ocidental teve de pagar caro…

131. “[…] os pais de Purevbaatar, que moravam em Altai desde que se aposentaram, […]” (p. 105.)

… os pais de Purevbaatar, residentes em Altai desde a aposentadoria,…

132. “Era a primeira vez que pisava na Mongólia.” (p. 105.)

Era a sua primeira ida (ou viagem) à Mongólia.

133. “[…] para ler a edição do ‘Mongol Messenger’, um jornaleco em inglês que alguém havia deixado no bolso do encosto […]” (p. 107.)

…, um jornaleco em inglês, deixado por alguém no bolso…

134. “Volta e meia a cidade era tomada pela nuvem de poeira que uma rajada de vento levantava.” (pp. 108–109.)

… tomada pela nuvem de poeira levantada por uma rajada de vento.

135. “Dos cinquenta e dois exemplares que foram reintroduzidos nos anos 90 […]” (p. 112.)

Dos cinquenta e dois exemplares reintroduzidos

136.É a paisagem mais bonita que já vi.” (p.116.)

Jamais vi paisagem tão bonita.

137.Se é que conseguiu voltar até ali, eles não o viram.” (p. 130.)

Se conseguiu voltar até ali,…

138. “E, como que por milagre, […]” (p. 136.)

E, como por milagre,…

139. “Com as horas que desperdiçaram consertando o jipe, […]” (p. 139.)

Com as horas desperdiçadas consertando o jipe…

140. “[…], só para ter o que fazer e me mostrar ocupado.” (p. 141.)

…, só para ter uma atividade e me mostrar ocupado.

141. “[…] a tempo de impedir que o Ocidental tirasse uma foto.” (p. 143.)

… a tempo de impedir o Ocidental de tirar uma foto.

142. “O ‘khoomi’ é um canto tradicional, que há séculos é praticado […]” (p. 145.)

… é um canto tradicional, praticado há séculos

143. “Entre os insetos rasteiros, havia um que parecia uma enorme barata selvagem, […]” (p. 151.)

Entre os insetos rasteiros, um se assemelhava a uma enorme barata…

144. “Havia uma criança loura que corria debaixo da chuva.” (p. 155.)

Havia uma criança loura correndo debaixo da chuva.

145. “[…] e viu ao longe um nômade a cavalo que vinha na sua direção.” (p. 156.)

… um nômade a cavalo, vindo na sua direção.

146. “[…] tem dificuldade de entendê-lo e de traduzir o que o velho diz.” (p. 160.)

… de entendê-lo e de traduzir a fala do velho.

147. “E foi o que bastou para o falcoeiro dizer que não podia pegar a águia no braço.” (p. 163.)

E foi o bastante para o falcoeiro recusar-se a pegar a águia…

148.Assim que recobrou as forças, […]” (p. 177.)

Tão logo recobrou as forças,…

149. “[…] por causa do emblema de metal que havia achado no bolso […]” (p. 177.)

… do emblema de metal encontrado no bolso…

150. “[…] um boné do mesmo tipo que o Ogro usava.” (p. 178.)

… um boné do mesmo tipo usado pelo Ogro.

* * *

Algumas fontes sugerem regras para facilitar essas alterações, como “Substitua a oração desenvolvida adjetiva por uma oração reduzida de gerúndio ou reduzida de particípio”.

Nem todos conhecem ou se lembram desses jargões da Gramática, mas a maioria dos escritores é capaz de reconhecer intuitivamente se uma alteração é ou não adequada.

Assim, uma dica mais útil seria experimentar a seguinte estratégia, adaptando-a depois ao jeito pessoal:

1. Identifique os quês em seu texto.

2. Varie a redação da frase, proibindo-se temporariamente o uso do quê.

3. Teste a variação escolhida, recorrendo à sua sensibilidade literária. Ao menor sinal de desconforto, busque outra forma.

4. Continue a variar a forma até sentir, de modo congruente, a aceitação interna do modo como a frase está redigida.

* * *

Em tempo: este post foi redigido sem nenhum uso do quê em suas frases. Exceto, é claro, em exemplos copiados de textos alheios.

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Sérgio Barcellos Ximenes

Escritor. Pesquisador independente. Focos: história da literatura brasileira e do futebol, escravidão e técnica literária.