Unicórnios

Rodrigo Dantas
5 min readJun 5, 2016

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Sempre questiono modelos pré-definidos e sugeridos por mercados diferentes do Brasil, quando o assunto é inovação. Cansei de receber conselho de venture capitalistas, empreendedores e palpiteiros de plantão, que estávamos ou precisávamos fazer algo diferente para crescer ainda mais. Isso de certa forma mexia comigo e com meus sócios, mas a cabeça financeira (dna da Vindi) sempre nos levou para longe de teses e teorias de que deveríamos mirar os unicórnios do Vale do Silício.

Pausa aqui para entender esse “ser mitológico e bonitinho”.

Os unicórnios

São seres puros e fortes, segundo a mitologia. E de acordo com as narrativas antigas, são dóceis; porém são as mulheres virgens que têm mais facilidade para tocá-los. Leonardo da Vinci também descreveu:

“O unicórnio, através da sua intemperança e incapacidade de se dominar, e devido ao deleite que as donzelas lhe proporcionam, esquece a sua ferocidade e selvajaria. Ele põe de parte a desconfiança, aproxima-se da donzela sentada e adormece no seu regaço. Assim os caçadores conseguem caçá-lo.”

unicornios do vale do silicio

A lenda de nunca terem existido, fizeram os venture capitalistas do Vale do Silício denominarem que as startups que ultrapassassem U$1 bilhão de valuation, seriam chamadas de unicórnios. Os empreendedores também são chamados assim.

Uber, Airbnb, Stripe, Facebook, Twitter, Snapchat, WhatsApp, Waze entre outras dezenas de nomes integram e integraram essa lista (única e excepcional) de startups que nasceram com o carimbo de unicórnio no dorso. Levantaram dinheiro como ninguém, foram adquiridas e etc.

Eu particularmente não tenho nada contra o termo “unicórnio” e você?

O próprio TechCrunch vem usando um novo termo “Cockroaches (baratas)” para comparar com os unicórnios. Existe um momento de ruptura e uma crise de valuation por lá.

Ok, que a comparação com unicórnio serve para ilustrar a dificuldade de se ter um case com avaliação acima de U$1 bilhão, mas o unicórnio é coloridinho demais para comparar com um negócio que sai do zero para o milhão, com caras sangrando e suando por trás, tentando ganhar a vida através de inovação.

Eis que no Criatec Day, evento que ocorreu no dia 26/04 no prédio da Fiesp, com o pessoal do Comitê Acelera Fiesp, o Fernando Silva, sócio da Bozano Investimentos (e meu sócio pelo Criatec2), lançou uma teoria que todos os presentes no auditório sorriram e balançaram a cabeça concordando com a teoria que unicórnios não são procurados por eles, e sim: cabras da montanha.

Essas sim, existem e são grandes realizadoras” — Fernando

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Comitê Acelera Fiesp, Bozano Investimentos e Criate2. Foto: Fiesp[/caption]

Aquilo caiu como um luva para mim e para os empreendedores que estavam do meu lado. Estou falando de gente que trouxe um “unicórnio” para o Brasil, fundadores da 5aSec, da Polishop, entre outras brasileiras que estavam presentes.

Fernando está certo. Certíssimo. O Brasil precisa desse pensamento para achar o caminho viável entre fundraising e inovação. Veja o texto “Wall Breakers” do Edson Rigonatti, da Astella Investimentos. Vai a favor com a “teoria da cabra”. Investidores separam de verdade, “raladores” de “fazedores.”

Ps: aconselho muito ficar de olho nos textos dele.

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Fernando (Bozano Investimentos) apresentando a teoria da “Cabra da Montanha”. Foto: Fiesp[/caption]

A teoria da Cabra da Montanha

Vamos primeiro conhecer esse animal fantástico. Não deve cheirar bem, não é bonita, tampouco é dócil como unicórnios, mas mesmo assim são admiráveis. E melhor de tudo, elas existem.

Elas são encontradas nos Alpes europeus e na África. E vivem em montanhas, literalmente. A matéria descrita no portal Hypeness “A vida das cabras que habitam as encostas mais perigosas do mundo”, foi direta ao ponto mostrando quão arriscada é a vida de uma cabra da montanha. Elas escalam lugares impensáveis atrás de refúgios e comida.

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“Crazy goats” (“cabras loucas”) no Marrocos. Foto: Hyperness[/caption]

Pra chegar ao topo, essas cabras se tornam verdadeiras equilibristas. Ainda correm o risco de serem comidas por águias que as derrubam propositalmente para servirem de alimento (procure no Youtube, é bizarro).

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Equilibristas. (Foto — Reprodução: mundodosanimais.pt)[/caption]

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Elas chegam no topo depois de grandes esforços e muito sangue. (Foto: Hypeness)[/caption]

A analogia do Fernando, em encontrar empreendedores e empresas resilientes, com maturidade para receberem investimento é tão acertada, comparando com a cabra da montanha com o empreendedor resiliente, que me motivou a analisar esse tema.

Na prática, o dia a dia do empreendedor é bem duro. Não vou entrar no mérito de quem é empreendedor e quem não é, mas gosto bastante de uma frase do Marco Gomes que diz:

Você só é empreendedor se tiver Produto, Dinheiro, Time e Clientes”.

É dura essa afirmação, mas é bem perto daquilo que acredito. Mas onde quero chegar com isso?

No livro “Economia do acesso”, que lancei semana passada, procurei dedicar pelo menos dois capítulos, sobre a desmistificação do empreendedorismo semente (especialmente de startups de tecnologia).

Cara, você vai quebrar a cara, achando que esse negócio é fácil. Especialmente se achar que sua ideia vale alguma coisa. Por isso baixar as expectativas é uma boa coisa a se aconselhar. E se preparar para problemas é melhor ainda. Pior será, se mirar em unicórnios.

Realidade x Expectativa

O Paul Graham, do Ycombinator, publicou um gráfico bem realista sobre a curva de crescimento de uma startup. Na maioria das vezes, investidores recebem projeções de crescimento conforme a figura abaixo.

Expectativa — como as startups apresentam as projeções nos decks e pitches.

startups brasileiras

Na prática elas performam de forma diferente. Bem diferente.

Realidade — Como elas realmente fazem, segundo estudo do Paul Graham.

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Uma das teses do livro, no qual tenho bastante orgulho, é que na maioria das vezes, quem ganha dinheiro é aquela Startup “feia”.

Assim como a cabra da montanha.

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