Foto feita por mim durante uma visita ao Centro de Triagem da VIla Pinto, no bairro Bom Jesus em 2019.

Campanha pede doações para catadores de resíduos de Porto Alegre

Uma ação coletiva do POA Inquieta visa angariar recursos para trabalhadores de cooperativas em tempos de coronavírus

Sílvia Marcuzzo
6 min readMar 25, 2020

--

Nos últimos dias tenho me envolvido em uma campanha que peço a colaboração de vocês. Trata-se das necessidades dos catadores de recicláveis de Porto Alegre na atual conjuntura frente ao novo coronavírus. Para quem não me conhece direito, trabalho com questões ambientais desde 1993, quando era repórter do jornal Correio do Povo. Já fiz muitas coisas na área de comunicação e meio ambiente em várias partes do País. Mas nos últimos tempos tenho procurado articular ações práticas na minha aldeia, a Capital dos gaúchos.

Porto Alegre já foi uma cidade referência na coleta seletiva. Na década de 90, a administração municipal implementou a gestão de seus resíduos sólidos ​​que possibilitou a criação de cooperativas de reciclagem. Muita coisa mudou de lá pra cá. Na atual administração municipal, as cooperativas das Usinas de Triagem de Resíduos Recicláveis vem passando por dificuldades por vários motivos. Desde a falta de repasse de verbas por parte da prefeitura, devido a contratos que não estão sendo cumpridos; às demandas que não são seguidas devido à complexidade do licenciamento dessa atividade até a falta de material porque é comum a prática da coleta clandestina.

Visita do grupo do POA INquieta na Embapel, empresa que compra recicláveis de membros de cooperativas.

Em outubro de 2018 conheci o POA Inquieta e em dezembro criei o "spin", de spinoff , POA Inquieta Sustentável daquele ano. Em fevereiro de 2019, criei o grupo de resíduos e mais outros, vinculados à sustentabilidade. Desde então, tenho interagido e conhecido mais a realidade das Centrais de Triagem de Resíduos de Porto Alegre. No coletivo, já fizemos visitas a empresas, a Centrais de triagem da Vila Pinto e da Restinga, além de termos feitos muitos encontros e debates para tratar desse assunto tão complexo.

Neste momento, em que todo o mundo está enfrentando uma pandemia provocada pelo novo coronavírus, os catadores precisam demais do apoio da comunidade. Os galpões de triagem, inclusive, podem ser bloqueados porque o vírus infecta também os materiais. Nos grupos de resíduos e sustentável, temos visto muitos pedidos de apoio às cooperativas mais organizadas, que podem se comunicar melhor através do WhattsApp, mas há muitos outros que não conseguem se articular. Por tudo isso, colocamos na rua a campanha CataDORES - Todo mundo cuida de todo mundo.

Alguns esclarecimentos

Por que a campanha é através de depósito bancário?

Porque neste momento, onde muitas pessoas estão confinadas, é a forma mais fácil e ágil para a distribuição dos recursos. Pensamos várias possibilidades e estamos aguardando o retorno de supermercados que também poderão aderir a nossa mobilização.

Como está sendo feita a campanha?

A mobilização conta com o envolvimento de colaboradores que integram ou o POA coletivo Inquieta, que visa promover a economia criativa através dos pilares da inclusão, sustentabilidade e criatividade. O que será arrecadado será destinado aos grupos que estão com maior necessidade.

Como será feita a distribuição do que foi arrecadado?

O representante das cooperativas Alex Cardoso assegura que os recursos serão distribuídos de forma igualitária, mas principalmente atendendo aquelas entidades que não estão com ações de arrecadação. Há cooperativas que já estão com campanhas na rua. Inclusive aceitamos também alimentos, materiais de limpeza e equipamentos de segurança. Quem quiser fazer esse tipo de doação, deve entrar em contato direto com o Alex, pelo cel 98922 6565.

Quem está envolvido na elaboração desta campanha?

A campanha está sendo puxada por mim e com a colaboração da Ana Krebs (que está fazendo a arte dos materiais), Antônio Duarte, Daniely Votto, Gabriella Bordasch, Karen Campos, Maria da Glória Tassinari Yacoub, Maister da Silva, Maria Mercedes Bendati, Rita Carnevale, Simone Poças Pinheiro e Thais Kapp Amorim.

Confira alguns depoimentos sobre a situação

Uma das integrantes do grupo de resíduos, Simone Pinheiro, é assessora das Unidades de Triagem Anjos da Ecologia e Reciclando Pela Vida e membro do Conselho Gestor do Fundo Municipal de Incentivo à Reciclagem e Inserção Produtiva de Catadores e secretária do Fórum de Catadores:

“Participo do POA Inquieta desde o ano passado e não imaginei em ter que pedir auxílio junto a este grupo. Atuo há quatro anos no segmento de resíduos, sou assistente social de formação e nunca imaginei que uma pandemia atingisse o mundo de forma tão rápida e avassaladora como a do coronavírus.

Dentro deste segmento que é formado por pessoas com baixa ou nenhuma escolaridade, egressos do sistema prisional, idosos e em especial mulheres a situação é caótica. Precisamos do apoio da população para esse parcela da sociedade que é excluída e invisível, e que são nossos verdadeiros agentes ambientais, pois eles são importantes elos da cadeia da reciclagem.

Esses trabalhadores estão expostos a contaminação sem EPIs e terão que em muito breve paralisar suas atividades em decorrência do “efeito cascata” da comercialização dos resíduos, pois seus compradores também estão entrando em quarentena.

Estas pessoas e suas famílias precisam sobreviver. Estão sem recursos financeiros, por isso pedimos a colaboração de todos para esta campanha, principalmente durante este período de quarentena”.

Alex Cardoso, (arquivo Google).

Já Alex Cardoso, catador de materiais recicláveis ​​e membro do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis ​​(MNCR), integrante da Cooperativa de Catadores de Cavalhada (ASCAT), coordenador desta campanha explica melhor a urgência:

“Nossa categoria obtêm a renda a partir da venda dos recicláveis. Pela obrigação de quarentena, compradores já pararam suas atividades, deixando o pessoal sem renda. Somos quase 800 catadoras e catadores, distribuídos em 23 organizações da cidade, com grupos pequenos como a Sabor da Vitória Reciclado, da Agronomia, com cinco mulheres catadoras, até a Usina de Triagem e Compostagem da Lomba do Pinheiro, com 80 integrantes. Alguns grupos tem uma rede de apoio e parcerias e outros estão em profunda dificuldade.

É hora de darmos as mãos virtualmente, de praticarmos a empatia, sermos mais humanos, de praticarmos nossa solidariedade, estendendo alimentos ou recursos para aquelas e aqueles que apesar de trabalharem duro, chegam neste momento de crise sem condições sequer de se alimentar.

Confira as palavras da promotora de justiça de defesa do meio ambiente de Porto Alegre, Annelise Steigleder.

“A Prefeitura de Porto Alegre, através do DMLU, ainda não se manifestou sobre a continuidade da triagem dos resíduos sólidos que vêm da coleta seletiva. Nesse momento, portanto, a triagem continua sendo feita pelos catadores, organizados em cooperativas, que são contratadas pelo município. Há um contrato de prestação de serviços e a remuneração não assegura renda, apenas o custeio de despesas de água, luz, telefone, gás, compra de EPIs. A remuneração desses contratos está atrasada, de modo que muitos dos grupos não têm os EPIs e um deles já sofreu corte da luz.

- Com a pandemia, os catadores não estão conseguindo vender os resíduos triados, pois as fábricas fecharam; dois trabalhadores já se contaminaram e estão doentes, e há muitos que estão no grupo de risco (idosos, mais de 60 anos, com morbidades).

- Há risco de o vírus se disseminar nas comunidades onde vivem os catadores (favelas).

- A atividade é de elevado risco de contaminação pela permanência do vírus em superfície, o que fez a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), em âmbito nacional, divulgar uma recomendação de suspensão da coleta seletiva. Ou seja, os resíduos devem ir para um aterro sanitário até a normalização da situação.

- Como os trabalhadores ficarão sem qualquer fonte de recursos, o MP, junto com o Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública do Estadp, Ministério Público de Contas, OAB/RS irá expedir uma recomendação ao prefeito Nelson Marchezan para que garanta uma renda mínima para os catadores que integram as UTs contratadas para coleta seletiva e para que, além dessa renda, o Município assegure o pagamento da remuneração fixa do contrato, que é destinada para custeio de água, luz, etc e não para o sustento das famílias”.

Contamos com teu apoio!

Depósitos na conta da Cooperativa de Catadores da Cavalhada — Ascat
Banco do Brasil
Agência 2821–5
Conta 27980–3
CNPJ 14.872.029/0001–78

Importante encaminhar o comprovante para Alex Cardoso 51 989226565 e Karen Campos 51 991769431.

--

--