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Solitude - a experiência positiva de estar só

Simone Carvalho
3 min readJan 22, 2019

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Qual o valor de estar só? Quando a solidão representa um fator construtivo e essencial na nossa existência?

Sabemos o quanto a sociedade contemporânea hipervaloriza a conexão e a interatividade. O imperativo de estar permanentemente conectado e ocupado esvazia a importância da experiência de estar só. A solidão é percebida como uma prática negativa e até mesmo patologizante, que deve ser domesticada e evitada.

As palavras solidão e solitude se originam de solitudo do latim, mas possuem significados diferentes. Enquanto solidão remete a isolamento e sofrimento, a palavra solitude traduz uma vivência positiva e necessária de estar consigo mesmo.

Esse estar só significa reservar espaços na vida para o recolhimento saudável, permeado de interiorização e reflexão. São momentos em que podemos explorar potenciais e desejos, examinar emoções e sentimentos, estimular o pensamento criativo, realizar atividades prazerosas ou até mesmo desfrutar do ócio e da contemplação.

É intrínseco ao amadurecimento da personalidade aprender a experimentar a solidão, estado constituinte na formação de diversos processos psíquicos. Entre estes estão a construção da identidade, a capacidade de simbolizar que engendra o pensamento e a linguagem, o desenvolvimento da criatividade, a construção da autonomia, assim como a capacidade de se conhecer e se relacionar consigo mesmo. Ou seja, estar só tem uma importância vital na formação da subjetividade.

Há estágios na nossa trajetória em que precisamos cultivar a solitude, especialmente quando somos desafiados a tomar decisões sobre a vida pessoal, os relacionamentos ou a carreira. Esses momentos demandam o acesso à interioridade para avaliar a situação e o contexto, conceber novas ideias, integrar razão e intuição na geração de soluções mais significativas. Sem esses espaços de introspecção, certamente faríamos escolhas menos acertadas.

Esse saber estar só é, igualmente, essencial para lidarmos com eventos de perdas, em que precisamos nos recolher para refletir sobre o que foi vivido. Freud chamava esse processo de elaboração do luto, relativo à perda de algo valoroso como, por exemplo, um relacionamento, uma pessoa estimada ou um emprego. Vivenciar esse tempo propicia a ressignificação dos sentimentos e memórias, com a consequente reconfiguração do eu, saindo mais autoconscientes e fortalecidos dessas experiências.

Constatamos que a sociedade atual nega a necessidade desse tempo imanente à elaboração da perda, fazendo com que as pessoas não se autorizem mais a sentir a dor e a trabalhar esse sentimento. Ao contrário, somos incentivados a não mergulhar em nossos afetos, mostrando externamente o quanto somos fortes e bem resolvidos ao não sentirmos falta do que já não temos, substituindo rapidamente o que foi perdido. Como consequência, deixamos de vivenciar o que, justamente, seria a base para uma reconstituição saudável do nosso ser.

Winnicott, psicanalista inglês, revelou a importância da solidão na formação da personalidade. É inerente ao sentimento de estar vivo a confiança em si mesmo e nos outros, a qual deriva da aprendizagem de estar só no processo de interação e vínculo da criança, primeiro com a mãe, depois com os outros e a cultura.

A solitude, portanto, tem um valor fundamental na nossa existência, sendo estruturante e necessária para o crescimento humano. A tomada de consciência de ser único e diferenciado dos demais, consequente da vivência de estar só, promove a capacidade de se autoconhecer e amadurecer, tornando possível a construção de relações mais autênticas e significativas com os outros.

Simone Carvalho - Psicóloga CRP 03/1507, Consultora em Desenvolvimento de Pessoas e Organizações.

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Simone Carvalho

Psicóloga. Psicoterapeuta. Facilitadora de Processos de Aprendizagem e Desenvolvimento.