Seinfeld: S01E04 — Male Unbonding

Sitconizando
5 min readNov 25, 2021
Jerry tendo problemas para “terminar” sua amizade.

Eu confesso pra vocês: um pouco me assusta pensar que, 30 anos depois, a humanidade ainda não foi capaz de inventar uma boa tática para encerramento de amizades. É muito mais fácil terminar com uma namorada(o), não tem nem comparação; “eu não consigo sossegar querida, quero sua amiga” ou “estou passando por uma fase na qual preciso ficar sozinho”, ou até “eu decidi esperar” são algumas das opções disponíveis quando você quer dar um fim no seu relacionamento amoroso. Aliás, como a própria série irá demonstrar mais pra frente, qualquer bobajada pode ser utilizada quando você quer dar um fora em alguém. Mas e um amigo? Como que você chega pra pessoa e diz “Oi tudo bom, eu gostaria de terminar a nossa amizade.”? Enquanto um namoro pode ser baseado em inúmeros fatores (tesão, paixão, vontade de constituir família), uma amizade (quase) sempre gira em torno do convívio ou da proximidade, e ter um amigo não é excludente, você pode ter quantos amigos quiser. Por isso que, falar para alguém que você não quer mais ser amigo dessa pessoa é, basicamente, o mesmo que dizer “Oi, você é chato pra caralho e eu não te quero mais na minha vida”.

Pois esta é a saga de Jerry Seinfeld nesse quarto episódio da temporada, na qual Joel, um sujeito incômodo e aparentemente sem muita experiência no convívio social, fica querendo forçar uma relação mais próxima com ele, sem perceber os diversos indícios de que Jerry não o suporta. Como se conheceram na infância, Joel cresceu com a ideia de que Jerry é seu melhor amigo — o que talvez possa significar que ele nunca teve ninguém em sua vida, já que a própria aproximação de Jerry foi 100% interesseira, baseada no fato de Joel possuir uma mesa de pingue-pongue.

“Eu seria amigo de Stalin se ele tivesse uma mesa de pingue-pongue!!”

Joel, vale dizer, é realmente um cidadão de qualidades únicas: egoísta (só sabe ouvir a si mesmo), insistente (me dói ver ele quase implorando para se encontrar com Jerry), maçante (nada do que ele fala é interessante) e, o pior de todos, impertinente — a ponto de obrigar Jerry a inventar uma lista de desculpas (o que pra mim é uma excelente ideia, diga-se de passagem), tamanha a profusão de mentiras que ele precisa utilizar para fugir do sujeito. Se a chatice fosse uma prova olímpica, Joel seria o Michael Phelps.

Entretanto, apesar do conceito interessante e de alguns momentos inspirados (Jerry falando nada com nada na mesa do café é lindo), a trama em si não oferece uma conclusão das mais memoráveis, sendo finalizada com Joel tendo um novo amigo (Kramer, nenhuma surpresa) e não resolvendo sua situação com Jerry. Claro, eu não assisto Seinfeld esperando por algum desenvolvimento sério, ou “questões resolvidas”, mas eles poderiam ter ido um pouco mais longe aqui. Penso que se esse plot tivesse ido ao ar algumas temporadas a frente, teríamos uma resolução um pouco mais marcante (ou, no mínimo, mais mirabolante).

O detalhe do quanto Jerry se aproxima do telefone, ansioso pra desligar a ligação com o insuportável que não se cala, é brilhante.

O episódio também apresenta mais duas subtramas: George se declarou e agora acha que a namorada irá deixá-lo e Kramer tem a ideia de uma pizzaria na qual o cliente faz a própria pizza. Enquanto a trama de George sofre por uma falta de atenção da própria narrativa, já que o público não VÊ nada do que ele vive, apenas temos noção do que ele conta para Jerry, a trama de Kramer sempre me soou cansativa e repetitiva. Dos quatro principais, acredito que Kramer seja o que menos está “no tom” de seu personagem nesse começo, mas é claro que o fato de sua história também ser relegada a diálogos, e não a cenas, piora sua situação.

Elaine, por outro lado, brilha sempre que tem a chance. Mesmo não tendo uma trama própria e aparecendo em apenas uma cena, sua fala é cômica, original e expõe muito do que é essa personagem. Sua expressão no momento que pergunta se eles teriam que conversar no café, e depois falando que iria se não tivesse que conversar, além de me fazer passar mal, é uma brilhante síntese de como ela pouco se importa com quem está ao seu redor. Não que algum dos quatro se importe, mas ela tende (ou tenderá) a estender essa apatia para os próprios amigos, por mais próximos que sejam.

“Eu vou se não precisar falar.” Não tem como não.

Moral do episódio: não importa o quão péssimo você seja, sempre vai ter aquele seu amigo que é pior. E não adianta, ele não vai sair da sua vida — nunca mais. O negócio é ter a sua própria lista de desculpas mesmo. Ou torcer pra ele morrer.

Alguns pontos curiosos (pra mim pelo menos):

  • Mesmo já calejado, ainda me surpreendo com o quanto Jerry é um ator horrível. Se vocês duvidam, reparem na quantidade de vezes que ele quase ri nesse episódio. O problema é que isso deixa ainda mais engraçada a sua atuação. No fim eu não sei o que achar, de coração. Só sei que me divirto. Talvez ele faça de propósito (não faz).
  • Mais um episódio e os quatro ainda não contracenaram juntos, na mesma cena. Ok, talvez eu esteja um pouco obcecado com isso.
  • Apesar de ter sua trama reduzida a pequenas exposições, dá pra se perceber o quanto George é uma pessoa doente. Quando ele fala que ficou com o sanduíche na cabeça mesmo depois do término, ou quando ele lamenta por “sempre expressar o que sente”, como se ISSO fosse o errado, por exemplo.
  • Eu sei que Jerry é um pouco autocentrado demais, o que o deixa cego com relação a si mesmo, mas ele chamando o Joel de egoísta me fez cuspir tudo aqui. É tipo, sei lá, o Seth Rogen chamar alguém de maconheiro. Ou o Bolsonaro chamar alguém de burro.
  • Me corrijam se eu estiver enganado, mas esse é o único episódio de Seinfeld que, a exceção dos clip shows, não tem o “The” no início, certo? Esquisito demais, porém interessante. Ou não.

Até o próximo (e último) episódio da temporada!

Nota: 3,0 de 5,0.

Lucas Thurow (24/11/21).

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quero ser levado sério, mas escrevo sobre sitcoms