Quem foi Margaret Thatcher?

Soberana
7 min readApr 8, 2022

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Em comemoração à morte de Margaret Thatcher no dia 8 de Abril de 2013, nós da Soberana preparamos esse fio para lembrar a todos as razões pelas quais odiá-la é obrigatório para todo membro da classe trabalhadora.

Pessoas comemoram a morte de Thatcher.

Thatcher foi Primeira Ministra do Reino Unido entre 1979 e 1990 e é uma das figuras mais proeminentes do neoliberalismo, que durante o período passou de doutrina econômica marginal para dominante e assim permanece até os dias de hoje. O governo da “Dama de Ferro”, como foi apelidada por um jornal soviético, foi marcado por privatizações, cortes de gastos públicos, desregulamentação, desindustrialização, financiamento de ditaduras militares, repressão de movimentos sociais, xenofobia, racismo e homofobia.

1. Leite

Em 1971, quando Thatcher ainda era Secretária de Estado para Educação e Ciência durante o governo Edward Heath, uma de suas medidas mais controversas foi o corte da distribuição de leite gratuito para crianças entre 7 e 11 anos de idade

Crianças bebendo leite na escola.

Desde 1940 o Reino Unido vinha distribuindo leite gratuito para crianças e mulheres grávidas com a finalidade de combater a desnutrição provocada pela Segunda Guerra Mundial. O corte promovido por Thatcher, de impacto orçamentário quase irrelevante, gerou o primeiro apelido que a futura Primeira Ministra receberia: Thatcher The Milk Snatcher (“Thatcher a Ladra de Leite”).

Distribuição de leite para crianças.

2. Pinochet

Thatcher foi uma veemente apoiadora do regime militar de Augusto Pinochet no Chile. Desde que assumira o cargo de Primeira Ministra, ela suspendera uma série de embargos que o Chile havia sofrido após o golpe em 1973. O Reino Unido voltou a exportar crédito para o Chile, reestabeleceu a venda de armas, indicou um embaixador novo (o Chile estava sem embaixador britânico desde 1973) e encerrou o programa de refugiados que fugiam da violência do regime chileno.

Augusto Pinochet.

Quando Pinochet foi preso no Reino Unido por violações de direitos humanos em 1998, uma das maiores ativistas a favor da sua liberdade foi Margaret Thatcher, que já não era Primeira Ministra havia 8 anos. Thatcher alegava que o Reino Unido deveria ser “fiel aos seus amigos” e que o regime Pinochet havia “iniciado uma nova era no Chile, fundada na verdadeira democracia”. O período foi marcado pela censura, perseguição, exílio, tortura e morte de milhares de integrantes da sociedade civil.

Margaret Thatcher ao lado de Pinochet.

3. Greve dos Mineradores

O período Thatcher foi decisivo para a desindustialização definitiva do Reino Unido. Um ano após ter sido eleita Primeira Ministra, Thatcher reduziu os postos de trabalho na indústria do aço de 156,600 para 88,200, causando demissões em massa nas fábricas. Alegando a necessidade de “recuperar a indústria”, essa medida seria o início da completa privatização do setor que se concluiriam em 1988.

Protesto de mineradores.

O setor que mais foi prejudicado pelas medidas do governo Thatcher foi o da mineração de carvão. Tradicional no Reino Unido desde o século XIX, a indústria do carvão era uma das que mais gerava postos de trabalho na Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte. Desde a década de 1960, o setor passava por mudanças em razão de três fatores: o esgotamento das principais minas da região, a mecanização do trabalho e a mudança para novas matrizes energéticas no Reino Unido.

Repressão policial nos protestos.

O governo Thatcher tinha a intenção de fechar dezenas de minas, e para isso estava se preparando para enfrentar o seu maior inimigo: o sindicato dos mineradores. Em 1981 há a primeira tentativa malsucedida de fechamento das minas, pois os sindicatos eram tão fortes que conseguiam parar o trabalho de maneira que causasse escassez interna de carvão e afetasse as outras indústrias.

Para evitar que isso acontecesse novamente, o governo Thatcher estocou carvão para seis meses, desregulamentou a importação de carvão para baratear os custos e, mais importante, mobilizou uma quantidade imensa de policiais para reprimir as greves. Em 1984, novamente o governo ameaça fechar as minas e os trabalhadores decretam greve. Essa greve seria uma das mais longas de toda a história da humanidade e ficaria marcada por episódios de violência como a “Batalha de Orgreave”, na qual aproximadamente 5 mil pessoas fizeram um piquete em uma fábrica e foram confrontados com 6 mil policiais que resultou em 120 pessoas feridas e 95 prisões.

Batalha de Orgreave.

Ao fim da greve que durou um ano, o sindicato havia perdido metade dos seus membros e foi forçado a se render às exigências do governo. Ao longo de toda a greve, 11,291 pessoas foram presas e 8,392 foram condenadas por “perturbar a paz”. Vinte minas de carvão foram fechadas, milhares de trabalhadores perderam seus empregos e vilas inteiras se transformaram em cidades-fantasma, pois existiam em torno da atividade mineradora.

Taxas e níveis de desemprego.

4. O Sangue

Durante a década de 1970, o Reino Unido começou a importar dos EUA um subproduto do sangue chamado Fator 8, que é utilizado em tratamentos para hemofílicos. O Fator 8 dos EUA era adquirido através de doadores remunerados, o que atraíam muitos usuários de drogas injetáveis. Com esse processo e com a total falta de fiscalização por parte do Reino Unido, aproximadamente 4000 pessoas foram infectadas com Hepatite C e aproximadamente 1200 com HIV, totalizando mais ou menos 76% dos tratados com Fator 8. O problema foi descoberto durante a década de 1980, quase nada foi feito por parte do governo Thatcher para tratar e indenizar os atingidos.

Crianças hospitalizadas.

Até os dias de hoje, nem a indústria farmacêutica, nem a NHS (National Health Service, o SUS Britânico), nem o govenro britânico admitem culpa no episódio. Em 2017, documentos inéditos revelaram um esforço ativo do governo de encobrir o escândalo e limitar o auxílio financeiro para as vítimas, a fim de não admitir culpa no escândalo. Estima-se que 2400 pessoas tenham morrido por complicações relacionadas às contaminações.

5. Seção 28

Em 1983, um livro dinamarquês chamado “Jenny Lives With Eric and Martin” foi traduzido e publicado no Reino Unido. O livro trata de um homem que vive com o seu namorado e a sua filha de cinco anos de idade. Por conta do pânico moral gerado pela publicação do livro, em 1988 o governo Thatcher introduz a “Seção 28”, que dizia: “Uma autoridade local não deve: (a) promover homossexualidade intencionalmente ou publicar material com a intenção de promover homossexualidade; (b) promover o ensino em qualquer escola da aceitação da homossexualidade como uma pretensa relação familiar”

Capa do livro “Jenny lives with Eric and Martin”.

O texto, extremamente vago, abriu precedentes para as famílias conservadoras hostilizarem professores LGBTQIAP+ e escolas, que por precaução removeram livros e filmes que debatiam homossexualidade de seus catálogos. Apenas no ano de 2003 a lei foi derrubada em todo o Reino Unido, graças ao esforço de ativistas e militantes que a combatiam desde a década de 1980.

Propaganda conservadora.

6. O Poll Tax

Até 1989, havia uma maneira de financiar os governos locais: o imposto baseado no valor do imóvel, chamado de “Rating System” (“Sistema por Classificação”). O valor era calculado de acordo com o tamanho do imóvel, quantidade de cômodos, de banheiros, etc.. Nesse ano, o Partido Conservador de Thatcher propôs uma mudança na forma como se calculava o imposto sobre imóveis, substituindo-o pelo “Poll Tax” (“Imposto por Cabeça”). Com o nome oficial de “Community Charge” (“Taxa Comunitária”), o imposto era calculado pelo número de pessoas que moravam em um imóvel. Isso na prática significava que um bilionário morando em uma mansão sozinho pagaria menos impostos que um trabalhador que mora com a esposa e os filhos.

Protesto contra o Poll Tax.

O imposto foi aplicado na Escócia em 1989 e depois na Inglaterra e no País de Gales em 1990. Imediatamente as pessoas começaram um boicote, sob o lema “Don’t Pay, Don’t Collect” (“Não Pague, Não Cobre”). Logo o boicote evoluiu para manifestações nas ruas que foram recebidas com violência pela polícia recém treinada e recém equipada pelo governo Thatcher. A medida se mostrou tão impopular que Thatcher renunciou ao cargo de Primeira Ministra em 1990, e a lei foi abolida em 1993.

Manifestações com repressão policial.

7. Conclusão

Talvez a frase mais famosa de Margaret Thatcher seja “Não há algo como sociedade, o que há são indivíduos e suas famílias”. Essa visão de mundo permeou os mais de 10 anos de governo que foram responsáveis pelo desemprego em massa da classe trabalhadora, pela explosão do setor financeiro e da concentração de renda e pelo abandono do Estado em relação aos mais necessitados. Seu legado será lembrado como a quintessência do capitalismo neoliberal: desumanizante, predatório e inconsequente.

Para saber mais sobre, o camarada Ian Neves tem um vídeo sobre o assunto:

“Por quê odiamos? Margaret Thatcher” do canal História Pública.

Originalmente disponível no Twitter. Acesse para ver mais vídeos e gifs no tópico: https://twitter.com/Soberana_TV/status/1512281685605462017

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