Catadora e escritora, Carolina de Jesus inspira coleta seletiva em São Paulo

SP Cidade Gentil
3 min readNov 27, 2016

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Negra, catadora de lixo e mulher cuja obra marca a literatura brasileira como um retrato poético e crítico da exclusão social. Essa foi a escritora e poeta Carolina Maria de Jesus, nascida em Minas Gerais e radicada em São Paulo. Moradora da favela do Canindé, ela sustentou a si e aos filhos catando papelão e ferro nas ruas da capital. Hoje, em sua homenagem, Carolina Maria de Jesus é o nome da Central Mecanizada de Triagem da EcoUrbis, inaugurada em julho de 2014 localizada em Santo Amaro, na zona sul.

Foto: Divulgação

Carolina nasceu em Sacramento (MG), em uma família de negros analfabetos, e chegou na capital paulista em 1947. Veio em busca de emprego. No primeiro trabalho, como empregada doméstica na casa de um médico paulista, teve contato com uma imensa biblioteca que, com a curiosidade e o pouco estudo, começou a ler. Ali a literatura surgiu diante de Carolina como paixão para depois se tornar um ofício.

Mãe solteira e, logo em seguida, desempregada, ela precisou buscar outras formas de sustento para sua família. Virou catadora de lixo nas ruas de São Paulo, onde juntava papel, papelão e ferros. Arredia e briguenta com seus colegas, nas horas vagas Carolina de Jesus escrevia sobre as situações que passava e das pessoas com quem convivia. Seus cadernos de anotações eram feitos com os papeis que coletava.

Foi numa das ruas da favela do Canindé, enquanto discutia com vizinhos, que Carolina conheceu o jornalista Audálio Dantas, que, ao ter contato com os textos dela, ajudou a publicá-los. Carolina de Jesus surpreendeu o País e o exterior com um livro autobiográfico, publicado na década de 1960, chamado “Quarto de despejo: diário de uma favelada” — um marco da literatura brasileira que revela a exclusão que ela viveu e viu outros viverem. Na obra, traduzida em mais de 20 países, a escritora fala sobre o dia a dia de luta pela sobrevivência e os preconceitos que sofria e conta as dificuldades de convívio com vizinhos e colegas.

“Enquanto escrevo, vou pensando que resido num castelo cor de ouro que reluz na luz do sol. Que as janelas são de prata e as luzes de brilhantes. Que a minha vista circula no jardim e eu contemplo as flores de todas as qualidades. (…) É preciso criar este ambiente de fantasia, para esquecer que estou na favela”, escreveu Carolina de Jesus.

Para a professora Maria José Palo, do Departamento de Literatura da PUC-SP, a grande riqueza da obra da mineira está em a autora fazer da sua experiência uma obra ficcional. “Ela teve capacidade para aflorar uma narrativa ficcional. Isso acontece nos indivíduos que têm maior receptividade e sensibilidade no contexto em que vivem”, afirma a professora.

Em 2014, se estivesse viva, Carolina Maria de Jesus teria completado 100 anos. Ela morreu em 1977, aos 63. Uma de suas filhas, Vera Eunice, é professora da rede pública de ensino da capital paulista. Em maio deste ano, a editora Veneta lançou a biografia de Carolina em HQ.

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