Imagem: Divulgação

A evolução dos trajes de natação

Uma breve história de como a tecnologia interfere no esporte

Talitha Adde
8 min readMay 31, 2016

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Para quem acha que as modalidades esportivas são as áreas menos afetadas pela tecnologia está completamente enganado. A tecnologia já se provou profunda aliada do esporte. Principalmente na natação. Graças aos placares eletrônicos os tempos dos nadadores nas provas de competição podem ser marcados e diferenciados com precisão. Mas não são só as tecnologias na beira da piscina ou de arbitragem que mudaram completamente a estrutura do esporte. Os chamados “trajes de competição” são, talvez, um dos maiores benefícios para os atletas de alto rendimento quando se trata de centésimos de diferença no tempo final.

A evolução dos maiôs acompanhou o desenvolvimento da natação no século XX. Tecidos cada vez mais finos e design que permite maior mobilidade e flutuabilidade dentro d’água são as grandes características de um dos maiores aliados do nadador na hora de competir. Os trajes surgiram após os Jogos Olímpicos em Atlanta em 1996 e ganharam evidência em nas Olimpíadas de Sydney, em 2000. No entanto, a evolução dos trajes nem sempre foi um mar de rosas. Polêmicas e debates rodeiam o assunto.

Veja a evolução dos trajes:

1900

Primeiro maiô de natação/Imagem: Divulgação

O primeiro maiô de natação pode ser comparado com a primeira bola de futebol. Totalmente ineficiente na água, os nadadores vestiam um traje de aproximadamente cinco quilos. Impossível de imaginar, certo?

1927

A marca escocesa Speedo lança o primeiro maiô do mercado feito de seda . O modelo chamado “Speedo Racer Back”, inicialmente, foi pensando para mulheres como um traje de banho de piscina ou praia. O revolucionário e também polêmico maiô, que deixava os ombros de fora e tinha uma abertura nas costas, o que proporcionava melhor rapidez na água, foi rapidamente adotado por nadadores profissionais.

O nadador sueco Arne Borg foi o primeiro atleta a quebrar o recorde mundial da prova de 1500 livre na piscina longa, no dia 2 de setembro de 1927, vestindo um “Speedo Racer Back”.

O nadador sueco Arne Borg, primeiro garoto-propaganda da Speedo/Imagem: Divulgação

1930 a 1950

A Speedo predominou no mundo da natação competitiva com um crescente número de atletas optando por utilizar seus produtos. A jovem australiana Clare Dennis foi a primeira mulher a vencer os 200 metros peito nas Olimpíadas de Los Angeles, em 1932, com o modelo de maiô de seda. Em 1950, a marca lançou o primeiro maiô de nylon e lycra.

Maio de laicra entre os 1930 e 1950 (Destaque para a seleção inglesa de natação)/Imagem: Divulgação

1973

Depois da Speedo se consagrar como a maior marca de equipamentos de natação do mercado, a Adidas fundou a Arena, marca para produção de produtos voltados para esportes aquáticos. O nadador norte-americano Mark Spitz, que nas olimpíadas de 1972, em Munique, havia conquistado sete medalhas e sete recordes mundias, foi convidado a ser o garoto-propaganda da marca.

O nadador norte-americano Mark Spitz, garoto-propaganda da Spedoo/ Imagem: Divulgação

O primeiro produto da Arena foi o Skinfit®, um maiô de alta performance desenvolvido com um tecido muito leve (pesava apenas 18 gramas) para se moldar ao corpo do nadador com extrema precisão, como se fosse uma segunda pele. No ano seguinte a marca assinou o primeiro contrato de patrocínio com a nadadora australiana Shane Gould, considerada na época a versão feminina de Spitz.

1976

Nos Jogos Olímpicos de Montreal em 1976, a equipe original de patrocinados pela marca Arena, que incluía nomes de grandes nadadores como Mark Spitz (EUA), Novella Calligaris (ITA), Steve Furniss (EUA), David Wilke (ING), Shirley Babashoff (EUA), Gary Hall (EUA), Klaus Dibiasi (ITA), Ulrika Knape (SUE) e Maxine King (EUA), utilizaram apenas maiôs e óculos especialmente desenvolvidos para as competições de alto nível. O resultado: os nadadores conquistaram 44 medalhas durante a competição.

Com a tecnologia no esporte, os nadadores praticamente voavam dentro d’água com a velocidade desse cachorrinho/Imagem: Divulgação

1991 e 1992

A Speedo lançou o primeiro tecido ‘rápido’ para esportes aquáticos (utilizado no maiô S2000), que foi usado pela primeira vez nas Olimpíadas de Barcelona em 1992, quando 53% das medalhas da competição foram conquistadas por atletas que usavam a marca. O traje caracterizava-se por ser feito de microfibra e elastano.

O nadador brasileiro Gustavo Borges com o maiô S200/Imagem: Divulgação

Um ano depois, a Arena lançou o modelo chamado “Aquarecer”, projetado para que os nadadores flutuassem sob a água devido ao seu tecido extremamente liso, sem perder a flexibilidade nos movimento.

1996

Lançado o maiô modelo ‘Aquablade’, da Speedo, na edição das Olimpíadas de Atlanta. Resultado: 15% mais aderente e 77% das medalhas olímpicas. Já a Arena lançou o modelo “X-Flat”, o primeiro traje de competição na versão high tech. Ele era o mais fino, leve e macio até então criado e foi amplamente divulgado pelo nadador russo Alexander Popov. Pela primeira vez, as pernas dos atletas são cobertas nas roupas de performance.

O modelo AquaBlade da Speedo/Imagem: Divulgação

2000

O Fast Skin, da Speedo, que imita a pele de tubarão/Imagem: Divulgação

Após quatro anos de trabalho, que contou com o apoio do Museu de Ciências Naturais de Londres, equipes formadas por técnicos especializados em várias áreas e um grupo de elite de nadadores, a Speedo desenvolveu um novo maiô para competição.

A missão principal era fabricar um produto mais rápido e melhor. Os estudos direcionaram-se para o tubarão, o animal mais veloz dentro d’água. Surgiu, então, o modelo chamado ‘Fast Skin’, que imita o desenho do tubarão. A grande chave de sucesso foram os dentículos presentes na roupa, parecidos com aerofólios e sulcos com formato em ‘V’, direcionando o fluxo da água sobre o corpo. Resultado? 13 dos 15 recordes mundiais cravados nas Olimpíadas de Sydney.

Nadar com o ‘Fast Skin’ era como se literalmente o tubarão estivesse atrás de você/ Imagem: Divulgação

Em contrapartida, a Arena lançou o o Powerskin, uma nova geração altamente tecnológica de trajes de competição que praticamente cobria o corpo inteiro dos atletas.

2008

A Speedo lança o modelo tecnológico LZR Racer. O maiô vestiu 18 dos 19 nadadores que quebraram recordes mundiais em 2008 e é feito com tecido ultrafino que repele a água e comprime os músculos. Assim, o nadador desliza com mais eficiência e menos esforço.

Para chegar a esse modelo, a Speedo investiu pesado em pesquisa, contando com profissionais da Nasa e de universidades da Inglaterra e da Nova Zelândia. Depois de avaliar mais de cem amostras de tecido, escanear o corpo de 400 atletas, testar o traje em túneis hidrodinâmicos (similar aos túneis de vento usados para testar carros de Fórmula 1, mas, claro, com água no lugar do vento) e contratar um estúdio de moda para assinar a peça, o resultado veio rápido. Até maio de 2008, 37 recordes mundiais (em piscinas de 25 e 50 metros) haviam sido batidos com o LZR Racer.

Maiô LZR Race/Imagem: Divulgação

O modelo tem duas vezes mais elastano (30%) do que uma sunga normal, o que faz com que o maiô fique mais colado à pele. Em função da maior quantidade de elastano no tecido, ele adere bem à pele, comprimindo a musculatura de modo a diminuir a vibração da superfície do corpo durante as braçadas e pernadas. Outro segredo do LZR é a ausência de costuras.

Em paralelo, a Arena lançou um modelo de maiô com as mesmas propriedades do LZR. Com lançamento do chamado ‘R-Evolution’, um traje 54 centésimos mais rápido que a versão anterior, o traje proporciona 20% a menos de redução de resistência e 24% a mais de manutenção de velocidade.

Vídeo de lançamento do LZR Racer, da Speedo, em inglês:

Vídeo: Reprodução/YouTube

2009: o ano da polêmica

A marca italiana Jaked lança o seu primeiro modelo de maiô tecnológico. O traje, feito inteiramente de poliuretano, favorecia uma maior aerodinâmica do atleta na água. Além do mais, o material permite que o maiô recubra melhor o corpo do nadador, retendo uma camada de ar que ajuda na flutuação. Com o lançamento do traje, acontece uma das maiores polêmicas do esporte na FINA (Federação Internacional de Natação).

Bermuda masculina aprovada pela FINA/Imagem: Divulgação

A federação decidiu proibir, a partir de 2010, os então chamados supermaiôs. Com a decisão tomada pela entidades, os trajes devem ser desenvolvidos com material têxtil e não mais a partir do poliuretano. Os maiôs também tem que cobrir uma área menor do corpo. A área de cobertura das roupas aquáticas nos atleta vai dos ombros apenas até os joelhos, no caso da mulheres, e apenas uma bermuda até os joelhos, no caso dos homens.

Traje feminino aprovado pela FINA/Imagem: Divulgação

Hoje, a melhor marca de maiôs tecnológicos considerada por atletas de alto rendimento é a marca espanhola Vadox. Mas é tudo questão de opinião (e teste dentro da água).

Entenda mais sobre o caso da proibição dos maiôs:

Vídeo: Reprodução/YouTube

Opinião

A evolução dos trajes de natação sempre foi motivo de muita polêmica no mundo da natação. Se, por um lado, as modalidades esportivas têm que obrigatoriamente acompanhar o desenvolvimento tecnológico e melhor a qualidade do esporte, por outro, acaba ‘elitizando’ a natação. Antes de a FINA regularizar as questões dos trajes, quem ganhava a prova era o que tinha condição de comprar (ou contar com um patrocinador que doasse) o melhor maiô.

Hoje, além de se preocupar com técnica de estilo e fundamentos da prova, todo atleta de natação deve se preocupar com o seu material para competir. Uma touca que permite menos atrito com a água, a escolha do óculos ideal e a qualidade do maiô interferem muito no resultado final.

Com a tecnologia inserida no esporte, não é apenas o talento e raça que conta no fim de cada prova. Dito isso, jogo a reflexão: até que ponto, a tecnologia cada vez mais crescente nos esportes, pode excluir quem é talentoso em determinada modalidade, mas desfavorecido financeiramente? Um dos pilares do esporte não é a inclusão? Sabe-se que, no Brasil, patrocinadores buscam atletas que já tem resultados significativos no esporte para financiar, e não aqueles em começo de carreira (salvo algumas exceções). Um cenário desanimador para esportistas que estão iniciando suas atividade

O vídeo abaixo exemplifica a polêmica antes da restrição da FINA:

Vídeo: Reprodução/YouTube

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