Evitando Armadilhas em Design de Software: O Perigo dos Modelos de Domínio Anêmicos na Concepção de APIs

Tania Storm
5 min readApr 17, 2024

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O Perigo do Modelo de Domínio Anêmico na Concepção de APIs

No universo do desenvolvimento de software, especialmente sob a ótica do Domain-Driven Design (DDD), a estruturação de um modelo de domínio robusto e coeso é crucial. Contudo, uma armadilha comum que se apresenta durante esse processo é a adoção do modelo de domínio anêmico, um anti-padrão que pode comprometer seriamente a integridade e a eficácia da arquitetura de software.

Caracterização do Modelo de Domínio Anêmico

Um modelo de domínio anêmico é caracterizado pela ausência de comportamento significativo nos objetos de domínio, os quais não encapsulam a lógica que deveriam modelar. Em vez disso, esses objetos são reduzidos a meros detentores de dados — estruturas com getters e setters, mas desprovidos de métodos ou regras de negócios significativos.

Esta abordagem pode parecer inicialmente atraente devido à sua simplicidade e à limpeza superficial na separação dos dados das operações. No entanto, a falta de coesão entre dados e comportamento no domínio leva a uma proliferação de serviços ou funções externas que manipulam estes objetos de dados, violando assim o princípio DDD de modelos de domínio ricos onde a lógica e os dados estão intrinsecamente integrados.

Impactos no Design de API

Quando um modelo de domínio anêmico é a base para uma API, os problemas se intensificam. Tais modelos geralmente resultam em APIs “verbosas” que exigem múltiplas chamadas de rede para executar operações simples, pois a lógica não está encapsulada nos objetos de domínio.

1- Consitência: faltam limites transacionais ou de consistência de dados entre serviços, muitas vezes levando a situações em que o cliente precisa participar para garantir a consistência dos dados nos serviços de back-end ou em que o gerenciamento de consistência no back-end é difícil de realizar.

2- Perfomance: Isso não só degrada a performance e escalabilidade da API como também a torna difícil de entender e manter. Com isso, o design superficial dos endpoints da API reflete a falta de profundidade do modelo de domínio, levando a um aumento na complexidade e na fragilidade da aplicação.

3- Foco exclusivo em operações CRUD: Muitas vezes, cada entidade no modelo de domínio anêmico leva à derivação de um serviço correspondente, por ex. um serviço RESTful. A dependência estrita de operações CRUD (Criar, Ler, Atualizar, Excluir) frequentemente exacerba suas deficiências. As operações CRUD, por sua natureza, são simplistas e não abrangem lógicas ou comportamentos de negócio complexos. Quando APIs são construídas em cima de um modelo de domínio anêmico, elas geralmente expõem essas operações CRUD diretamente, espelhando muitas vezes a estrutura do banco de dados ao invés das complexidades do negócio.

Implicações do Design Baseado em CRUD

Esta abordagem baseada em CRUD leva a várias questões:

  1. Interação Superficial: A API apenas facilita a manipulação básica de dados, sem integrar regras de negócio mais profundas ou lógica, falhando assim em capturar a verdadeira essência do domínio empresarial.
  2. Complexidade Aumentada para os Clientes: Consumidores da API muitas vezes são forçados a implementar a lógica de negócio no lado do cliente, levando a uma lógica duplicada em diferentes aplicações clientes e aumentando o potencial para inconsistências.
  3. Desafios de Escalabilidade e Manutenção: Conforme os requisitos de negócio evoluem, as limitações do modelo CRUD tornam-se mais evidentes. Ele luta para se adaptar a operações mais complexas além do manuseio básico de dados, levando a um sistema rígido e frágil que é difícil de escalar e manter.

Ao focar principalmente em operações CRUD, o design não aproveita todo o potencial de um modelo de domínio rico e orientado a comportamentos, onde as operações são projetadas em torno das capacidades e intenções de negócios, e não apenas a manipulação de dados.

Consequências e Custos

Essa abordagem fragmentada e desconectada inevitavelmente leva a um aumento nos custos de desenvolvimento e manutenção. As operações que poderiam ser gerenciadas dentro de um modelo de domínio rico acabam requerendo múltiplas integrações e sincronizações entre serviços distintos. Além disso, a manutenção de uma API baseada em um modelo anêmico frequentemente exige mais tempo e recursos para garantir que as mudanças em uma parte do sistema não quebrem outras partes.

Alternativas e Soluções

Para mitigar esses problemas, é crucial desenvolver modelos de domínio ricos ou fazer a transição de um modelo de domínio anêmico existente para um modelo mais rico e orientado a comportamentos. Nesses modelos, entidades e agregados são projetados para encapsular tanto os dados quanto as regras de negócio que governam seu ciclo de vida e interações.

Essa abordagem não apenas torna a API mais intuitiva e alinhada com os processos de negócio, mas também melhora a segurança e a integridade dos dados ao manter a lógica de negócio encapsulada dentro do modelo de domínio. Tal prática não só fortalece a coesão e a integridade do design do software mas também simplifica o desenvolvimento de APIs ao reduzir a necessidade de múltiplas chamadas e manutenção de consistência entre serviços. Ademais, um modelo de domínio bem definido e rico facilita a evolução do sistema e a adição de novas funcionalidades sem custos proibitivos.

Conclusão

Embora a tentação de adotar um modelo de domínio anêmico possa ser grande devido à sua aparente simplicidade inicial, os custos subsequentes em termos de complexidade e manutenção podem ser substanciais. Focar em um design de domínio robusto e integrado é essencial para desenvolver APIs eficientes e sustentáveis, permitindo assim que a arquitetura de software verdadeiramente sirva ao negócio e se adapte às suas evoluções.

Nos próximos artigos, exploraremos mais profundamente como modelar APIs usando os princípios do DDD, discutindo técnicas específicas, melhores práticas e exemplos práticos para orientar desenvolvedores e arquitetos de software na criação de sistemas mais coesos e alinhados com as necessidades do negócio.

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