Imagem: Death to Stock

Exercitando a escrita: sem medo do mudar um pouquinho os rumos

Ou como escrevi uma história de 11 mil palavras em 20 dias

Tati Lopatiuk

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Trabalhando de casa há quase três meses, percebo a minha criatividade brotar nos momentos mais inesperados. E percebo também que já não tenho mais tanto medo dela, deixo as ideias chegarem e tento tratar de resolver o conflito de “escrevo ou não escrevo?” o quanto antes e da maneira mais prática possível: escrevendo. Não tem jeito, o único jeito de fazer é fazendo.

Eu estava no meu horário de almoço, assistindo na TV a um jogo do Barcelona do dia anterior. Macarrão e carne moída escorriam com o calor (guardem essa frase), quando a câmera deu um close no rosto do Messi. O jogador argentino parecia triste com algo que não podíamos adivinhar, mas parecia vir de fora das quatro linhas. Eu pensei:

Cara, o Messi deve estar triste demais sem o Neymar.

No dia seguinte, eu já tinha 500 palavras de uma fanfic sobre a saída do Neymar para o PSG e como isso afetou sua relação com o Messi. Eu não queria escrever uma fanfic naquele momento. Eu não queria escrever nada. Tentei por 24 horas fugir de escrever essa história. Eu tenho mais o que fazer e, além do mais, quem é que precisa de uma fanfic em pleno 2017? E, no entanto, lá estava eu, empolgadíssima com pesquisa, ideias de estrutura para o livro e onde poderia hospedá-lo.

Messi e Neymar. Só de pensar dá um pouquinho de vergonha. Mas, caramba, a ideia era tão boa! Pensando com cinismo, tudo isso é um pouco ridículo. A coisa é que eu não conseguia parar de pensar nessa ideia. Tentei negociar. Escrever aquela história me era irresistível e eu podia resolver rapidinho, contanto que começasse logo. Então, fiz um acordo comigo mesma de terminar com isso de uma vez, tirar aquela ideia da frente para poder voltar para a outras em que já estava trabalhando.

Estou desde o começo do ano revisando livros que escrevi de 2014 em diante. Atualmente na revisão do quinto livro (são seis) e quase terminando, me vi em um ponto em que já estava saturada. Ainda amo aqueles personagens e suas histórias, mas sinto que já tive o tanto deles que era bom. Meu senso de continuidade (existe isso?) me cobra, diz que não posso deixar esse trabalho sem conclusão, preciso terminar essa revisão, colocar tudo no ar e aí seguir em frente. A grande questão é que pode acabar se tornando desmotivador confrontar diariamente uma escrita de quase cinco anos atrás. Embora eu ainda me reconheça nela, mudei muito meu modo de pensar uma história, e muitos vícios de escrita que eu tinha quando comecei me incomodam hoje. Olhando com objetividade o que escrevi nos meus primeiros livros, consigo enxergar todas as minhas intenções por trás de cada linha e ainda que esteja meu coração ali, nem de longe aquela escrita representa como eu escreveria um livro agora.

Então, durante a revisão dos livros, sempre me vinha um pensamento: “eu não escreveria assim hoje”. E de tanto pensar, se tornou uma provocação. Como você escreveria, então? Após aquelas primeiras 500 palavras, percebi com surpresa e muita alegria que a ideia da fanfic #NeyMessi era uma alternativa rápida de provar para mim mesma que meu caminho mudou. E isso me motivaria a voltar para a revisão com mais confiança assim que terminasse essa história em particular.

Comecei no dia 05 de novembro e terminei no dia 25 do mesmo mês. Foram quase doze mil palavras. Nesses 20 dias de intensivão de escrita, me diverti horrores, me atormentei entre me considerar um gênio e um lixo, e me realizei ao ver que posso escrever sobre o que eu quiser. Veja, não é que eu saiba escrever sobre o que eu quiser. Mas eu posso. Não preciso me justificar ou esperar aprovação alheia. Não preciso nem mesmo fazer sentido. Eu faço isso por mim e posso fazer o que eu quiser.

Rápido como começou, o desafio terminou. Hoje o livro está sendo lançado e está do jeito que eu queria que ele fosse, sem tirar nem pôr. E estou feliz demais por ter me permitido seguir em frente com essa ideia, mesmo que a princípio ela parecesse tão fora do que eu podia ou precisava.

Aprendi duas coisas ao escrever esse livro: um livro nunca é sobre o que você acha que é. E você só vai descobrir sobre o que é o seu livro escrevendo-o. Não tem como ficar divagando, imaginando, pensando como seria. Essa ideia vai te assombrar pelo resto da vida e te deixar empacado nela. Escreva logo a porcaria do livro, do artigo, do conto, do textão. Escreva logo e ao invés de ter uma grande e nebulosa ideia na gaveta, tenha dezenas de pequenas grandes ideias espalhadas por aí que postas em prática te prepararão para a Grande Ideia Definitiva que ainda chegará. Não se esqueça que escrever é um exercício no qual você fica melhor com a prática. E não tem como escrever dez livros sem escrever primeiro um.

(se bem que eu acho que essa Grande Ideia Definitiva nunca chega, porque quando ela parece vir, você já quer outra coisa, veja o meu caso, desesperada com cada nova ideia que tenho).

PS: Ah, sim. O livro está disponível completo gratuitamente no Wattpad. Macarrão e carne moída escorriam com o calor é uma das frases do capítulo inicial dele. Achei que merecia essa piada interna, depois de tanta loucura. :)

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