Primeiro dia do Francisco em casa

Como a maternidade me transformou em uma profissional UX

Estudar sobre design grávida me fez ter outra percepção sobre o mundo. Principalmente porque quando você entende que logo uma criança vai chegar, começa a se preocupar ainda mais com tudo ao redor, começa a querer deixar tudo mais confortável

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Minha transição de carreira começou na metade da gestação. Me lembro de completar a 20ª semana (5 meses — sei que essa informação pode ser confusa para algumas pessoas) e o porteiro do prédio onde eu morava me ligar: “- Dona Thalita, tem outro livro aqui na portaria”.

Era o livro da Torrey Podmajersky, o Redação Estratégica para UX, praticamente a bíblia de quem trabalha com UX Writing. Começava ali, em meio às azias que um bebê cabeludo me causava, a minha relação com um outro tipo de escrita, totalmente diferente de tudo o que já tinha feito.

Em meio às descobertas da gestação, tentei arranjar tempo para estudar algo totalmente novo, mas com um fundo familiar. Sou jornalista de formação e coração, sempre soube que queria trabalhar escrevendo. Tinha pavor de gente que me perguntava quando eu apareceria na TV. Trabalhei com revista, jornal impresso, redes sociais e produção de conteúdo para a internet. Mas nunca, de fato, com escrita para guiar e orientar.

E estudar sobre design grávida me fez ter outra percepção sobre o mundo. Principalmente porque quando você entende que logo uma criança vai chegar, começa a se preocupar ainda mais com tudo ao redor, começa a querer deixar tudo mais confortável.

Por que não simplificam a informação?

Só após saber que estava esperando um bebê foi que eu percebi o quanto as informações para as mães são confusas. Sejam em blogs de maternidade, aplicativos de acompanhamento gestacional, bulas de remédios, embalagens de produtos e até mesmo as orientações para os exames.

Mas acima de tudo, o que mais me causou dor, literalmente, foi a falta de informação (explicações simplificadas) sobre a amamentação. Existe um jeito certo de amamentar e fazer com que o bebê tenha a pega correta.

Além de ser frustrante e angustiante para o bebê e para a mãe, a pega incorreta faz com que o bebê não consiga drenar bem a mama, o que acarreta baixo ganho de peso, reduz a produção de leite e aumenta o risco de obstrução dos ductos mamários e mastite, coisas que eu só fui descobrir depois.

Depois que o bebê nasce

Francisco chegou ao mundo em uma quarta-feira do mês de março! Que felicidade, mas também que desespero! Exatamente nesse período passei a relacionar a pesquisa com a maternidade e toda a minha nova rotina, que até hoje é difícil e desafiadora.

Para fazer um choro cessar, eu precisava entender qual era o motivo: fome, sono, dor, fralda suja. Um bebê não fala, o que fazer então para adivinhar o que ele precisa?

Como não sabia, toda vez que ele abria o berreiro eu já logo oferecia o peito. Solucionava? Sim, mas muitas vezes não era o certo. E é isso que, metaforicamente, alguns produtos no mercado fazem com seus usuários/consumidores: não os escuta e empurram soluções goela abaixo.

Na primeira consulta com o pediatra, ele me falou que eu precisava escutar mais o choro para saber diferenciar dor e fome. Sim, cada choro de um bebezinho tem um timbre e quer dizer algo. Foi fazendo esse exercício, de escuta ativa, que passei a acalmar e socorrer de maneira assertiva.

A partir disso que eu também entendi o tamanho da importância de escutarmos os usuários para pensar em resoluções que façam a diferença.

Hey Jude de novo não!

Tem gente que ri quando falo, mas teve uma época que o Francisco só parava de chorar e ia dormir quando tocava Hey Jude. Em uma noite de desespero, por causa de uma cólica infernal, não havia “tetê” que fizesse ele se acalmar. Foi aí que o Jordan (meu marido) colocou a sua playlist na roda.

Assim que o Paul McCartney abriu a boca o choro parou. Ele passou o tempo da música inteirinha sem dar um pio. Um milagre. A música acabou e o berreiro voltou, o Jordan até tentou um Help, mas não deu certo. E dá-lhe repeat atrás de repeat. Ali, a gente encontrou a solução para as noites de cólicas, porque o luftal não fazia efeito.

O danadinho reconhecia a melodia, a voz, os instrumentos, tudo. Hey Jude começou a se tornar familiar para ele e nós começamos a mensurar isso. Se trocávamos de música, não era confortável para o Francisco, que não dormia e esperneava ainda mais. Chegou ao ponto de, por alguns dias, eu odiar meu Beatle preferido.

Solucionar uma dor com algo/uma mensagem que seja confortável e facilmente reconhecível é fundamental para o sucesso de uma jornada. Mas você só vai entender qual é a Hey Jude de um usuário se souber escutar e mensurar dados.

A introdução alimentar e o que vem com ela

Hoje o Francisco já tem 7 meses e nós começamos a apresentar a textura e o sabor dos alimentos para ele, que é muito exigente e reclama quando algo não lhe agrada. Familiar para você? Rs.

Brincadeiras à parte, essa também é uma fase desafiadora de uma rotina com um bebê. Aqui em casa está sendo muito difícil. Já conversei com outras mães que não tiveram problemas com a introdução, outras já estão passando o mesmo sufoco que o meu. Cada bebê, assim como um usuário, é único e especial. Tem suas necessidades e, mesmo não sabendo muito sobre aquilo que está sendo apresentado, opiniões e curiosidades.

É preciso mostrar, de forma simples e calma, como ele deve introduzir certos alimentos na boca, guiar os dedinhos e mostrar que ele pode realizar aquela tarefa sozinho, fazendo com que ele se sinta confortável. É claro que na maioria das vezes as coisas não vão sair como o esperado e você vai precisar entregar tudo amassadinho na colher.

Acompanhar toda a jornada e estar ali para acalmar se algo der errado é fundamental. Manter a tranquilidade e a paciência também.

De tudo o que aprendi durante esse pouco, tanto como mãe quanto uma profissional UX, o que considero mais importante é: não devemos subestimar nada ou acreditar que sabemos o que é o melhor para o outro. Não somos os nossos filhos, assim como não somos nossos usuários. Nosso papel é estar com olhos e ouvidos atentos para tornar as coisas mais fáceis e cheias de amor.

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