RESENHA: Gabriela, cravo e canela; de Jorge Amado

Thereza Nardotto
3 min readJul 15, 2019

Esse ano me propus a seguir uma novidade chamada Desafio Literature-se 2019 e ler um livro por mês para cada categoria. Em janeiro, a categoria designada foi “Uma história muito conhecida, não necessariamente pelo livro”. E automaticamente pensei em Gabriela.

Todos que conheço sabem quem é Gabriela. Seja através do corpo de Sonia Braga ou do corpo de Juliana Paes. Alguns nem se lembram que Gabriela é um livro. E um livro de ninguém menos que Jorge Amado. Eu não era nascida quando a personagem tomou corpo pela primeira vez e era nova demais pra me interessar por Juliana Paes. Mas hoje, perto de completar 20 anos, eu me apaixonei por Gabriela, com seu cheiro de cravo e sua cor de canela. Terminei a leitura querendo desesperadamente conhecer essa mulher, sentir seu toque, seu cuidado, ouvir sua voz, experimentar seu gosto, ter a oportunidade de amá-la. Eu nunca me apaixono por personagens, mas era como se eu pudesse tocar nela, vê-la, ela se tornou incrivelmente próxima.

Talvez muitos pensem nela como uma depravada, pensam em Amado como alguém que só escreve “putaria”. Eu gostaria de dar um exemplar de Gabriela a todos que pensam assim. É sim um livro carregado de várias cenas sensuais, mas estas são de uma beleza inigualável. Gabriela é muito ligada aos prazeres, e não apenas sexuais. Ela ama ser desejada, ama dormir com moço bonito, ama sentir o peso da perna de seu Nacib sobre suas ancas. Mas também ama andar descalça, ama colocar uma flor atrás da orelha, sorrir pra outros moços (mesmo os que não são bonitos), ama ir ao circo. De passeios intelectuais, gosta não. De andar de sapato que aperta o pé e colocar vestidos desconfortáveis para ir a festas em que as mulheres vão esnoba-la, gosta não.

Gabriela, em certo ponto, me parece uma precursora do tão discutido atualmente ‘amor livre’. Ela é alguém que não entende por que que, se é tão bom se deitar com alguém, se as duas pessoas querem, por que deveria se deitar apenas com um? Limitar seu desejo, ignorar suas vontades. Esse espírito é algo que Nacib não consegue compreender. Afinal, para um homem de sua época, se apaixonar pela cozinheira que já esteve com tantos homens é um absurdo, casar-se com ela então… Mas ele consegue passar por cima de preconceitos sociais para estar com Gabriela. Desposa-a, lhe dá seu nome. Mas se os preconceitos sociais podem ser deixados de lado, seus princípios permanecem ali. Ele não entende por que ela não pode se esforçar e ser uma dama de respeito para ele. Durante todo o livro ela se preocupa em não magoar seu Nacib, em não ofendê-lo. Suprime diversas vontades pensando que Nacib é bom demais e ela ruim. Essas passagens são de cortar o coração. É de sentir como se Nacib estivesse matando Gabriela aos poucos em nome do amor (e dos bons costumes).

Mesmo levando o título, nossa personagem e seu marido não são o único foco da estória. Aqui leremos sobre a época do cacau, sobre o progresso chegando a Ilhéus. E para quem gosta de história brasileira como eu, tudo nesse livro é fascinante. Porém, me desculpem, mas Gabriela ofuscou tudo para mim. Quero terminar tendo falado muito dela e te convidando a conhecer todo o resto.

Apesar do livro não falar somente de Gabriela, o romance de Nacib e Gabriela foi o fato mais notável daquele ano de 1925.

Término da leitura: 31 de janeiro de 2019.

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Thereza Nardotto

Me arrisco a escrever algumas coisas desconexas. Também compartilho minhas leituras.