A culpa é dos russos: A marcha final do PT

Thiago Holanda Dantas
vanitas
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8 min readOct 21, 2018
Adolph Northen [Domínio público], via Wikimedia Commons

Os russos sempre aparecem como os culpados pelas derrotas politicas de seus adversários (ou não), eles são elegidos como culpados de suas ações desastrosas. Napoleão Bonaparte, teve o inicio de sua derrota quando ousou enfrentar o inverno russo,e acabou derrotado, assim como Hitler, que ousou fazer o mesmo e perdeu para o clima e os russos na batalha de Estalinegrado. Os soviéticos já foram acusados por meio mundo de fomentar revoluções, Cuba, Vietnã e China são alguns dos exemplos. Na atualidade temos Putin acusado pela imprensa norte-americana de ter manipulado as últimas eleições e ter elegido Donald Trump. A influência russa é algo particular na politica internacional.

Mas não quero atribuir a derrocada do PT no brasil e a esquerda à Rússia ou a União Soviética, não a Lenin, Stalin, Trotski e companhia, muito menos a Putin. Quero atribuir a uma historia bem brasileira, ao nosso Mané — Mané Garrincha:

Uma historia famosa, na qual conta que na Copa de 1958 o então técnico da seleção brasileira Vicente Feola, chamou todos os atletas do time, para montar a estratégia para a partida contra a União Soviética. E em uma das jogadas, Zito e Didi trocariam passes no meio do campo. Vavá atrairia a marcação da defesa russa indo para o lado esquerdo do campo. Em seguida Nílton Santos lançaria para direita, na direção de Garrincha, para que Mané, no seu melhor estilo, driblasse o zagueiro e entregasse a bola para Mazzola, que faria o gol.

Ao final, Garrincha, muito atento, balbuciou a cabeça e perguntou: Tá legal, Seu Feola… mas o senhor já combinou tudo isso com os russos?[1]

O cenário estava todo armado. O PT montou uma narrativa de opressão e perseguição. Sua narrativa inicia-se com o primeiro mandato de Lula, um torneiro-mecânico pobre, nordestino, representante dos pobres, semi-analfabeto, que foi eleito pela maioria da população em 2002. Seu grande ato foi ter conseguido tirar da pobreza cerca de 36 milhões de Brasileiros[2], internacionalmente, colocou o Brasil no mapa dos investimentos e como ator principal em várias ações, por exemplo, pagaram a divida externa[3], engajam-se com a ONU na missão de paz no Haiti. Ainda no campo internacional, foi com a intervenção Lulista, que o Brasil pôde receber os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo. Além do mais, Lula abriu universidades e deu oportunidade para que jovens sem perspectiva pudessem ascender socialmente através da educação. Sua frase máxima era: ”Pobre agora viaja de avião”. Os índices de desemprego nunca antes haviam estado tão baixos[4]. Essa onda de prosperidade nacional foi levada com grande maestria em dois mandatos presidenciais e pela vontade da população, a antiga ministra-chefe da Casa civil, Dilma Rousseff, sendo também eleita por dois mandatos seguidos. Entretanto, após tantos avanços sociais, essa era de prosperidade chegou ao fim. Com a anuência das elites e da classe média que não estavam satisfeitas com o “pobre no poder” e sua ascensão financeira, no ano de 2015, acusaram injustamente a “presidenta” Dilma por crime de responsabilidade, as famosas “pedaladas fiscais” e por improbidade administrativa, nesse processo, ela foi acusada e sentenciada com o Impeachment e retirada do Palácio da Alvorada[5], e seu vice-presidente, Michel Temer, que estava alinhado às elites insatisfeitas, tomou o poder. Nisso o golpe deu inicio, mas não foi somente à presidenta, toda a cúpula do PT também foi acusada injustamente, seus maiores lideres como José Dirceu, Palocci, Delúbio Soares, José Genuíno e companhia presos[6].

Para revelar toda essa orquestração, Lula faria com que sua campanha eleitoral de 2018 fosse uma resposta do povo brasileiro às elites, que repudiavam toda essa armação contra o PT e Lula, porém, o maior golpe de todos ainda viria, a prisão sem provas de Luiz Inácio Lula da Silva, numa grande farsa orquestrada pelo Ministério Público, o senado e a policia federal. Entretanto, isso não foi capaz de pará-lo, Lula começou sua campanha, mesmo dentro da prisão, com as mídias reafirmando seu desejo e colocando seu nome entre os possíveis candidatos ao pleito[7]. Esse teatro foi levado até as últimas consequências, quando a improvável candidatura de um presidiário, foi impugnada[8] e como num passe de mágicas, surge a figura de Fernando Haddad, o ex-prefeito de São Paulo, como a imagem (ou falta de imagem), ideal para assumir o lugar de avatar de Lula. O ex-presidente contava com a experiência anterior de ter feito Dilma sua substituta e obviamente ele conseguiria novamente. O Midas de Garanhuns, engajou-se de dentro de sua cela nesse ardiloso plano. Utilizou-se da máquina petista de informação e contra-informação, composta por blogs, artistas, intelectuais, militantes e asseclas. Toda a intelligentsia posta à serviço de seu Deus, que havia sido ungido no dia da prisão, numa missa de assunção às cadeias, com padres e pastores ligados a causa, no qual sua frase divinamente inspirada ficou marcada na história : Eu não sou mais um ser humano, eu sou uma ideia misturada com as ideias de vocês”[9], agora seus seguidores seriam chamados de Lulas, e assim se auto-proclamariam, como o último ato de seu líder divinamente exaltado.

A religião Lulopetista foi fundada, nessa narrativa marxista de proletários versus burgueses, na leitura lulopetista, pobres versus a classe média, não era um embate entre elites e pobres. As elites enriqueceram como nunca nos governos PTistas e os pobres estavam saindo da pobreza, entretanto, a classe média conservadora que ficou estagnada no meio, vendo os ricos se afastarem e os pobres se aproximarem. Suas oportunidades nas universidade e mercado de trabalho sendo limitados. Nesse embate dialético, foram os pobres que foram subjugados, representados por seu líder. Esse foi o ápice da narrativa, uma divisão para o arco narrativo da volta do grande líder, que foi preso injustamente, mas foi carregado nos braços do povo e assim voltaria.

Foto: Francisco Proner

Esse lindo conto petista, estava há anos luz da realidade, sua narrativa foi contada e arquitetada por jornalistas e intelectuais e replicado por jornais e blogs amigos, abraçado por professores e artistas, levado as ruas pela militância do PT, PSOLista e do MTST.

Mas esqueceram de avisar os russos…

Ou seja, a população estava fora dessa equação quase perfeita. Enquanto a narrativa estava sendo construída entre Palácios e prisões. O povo sofria com a perda de poder econômico, criminalidade exorbitante, altíssimos índices de desemprego e a moral sendo achincalhada. Essa revolta cresceu com os escândalos do mensalão e do lava-jato, o qual foi considerado o maior caso de corrupção mundial[10], os bilhões de reais retirados do BNDES sendo utilizados para apadrinhar parceiros ideológicos em Cuba, Venezuela, Uruguai, Angola e Moçambique, entre outros[11], enquanto o caos era instaurado.

Com essa narrativa lulopetista ficou deflagrado a bolha que a esquerda brasileira se encontrava, uma câmara de eco, composta por fábricas de fake news, de notícias parciais, suspeitas e falsas — tudo aquilo que é desfavorável a narrativa é descartada. Esses “veículos” incitam a militância contra todos aqueles que se mostram contrários às ordens do PT, incitando violência e linchamento virtual.

Nessa câmara de eco, o que se escuta são os mesmos chavões a todos aqueles que tentam alertá-los ou ir contra a essa pseudo-história: Facistas, neo-liberais, capitalistas, nazistas, conservadores e reacionários. Palavras que perderam seus significados, sendo somente utilizadas como meio de calar todas as vozes contrárias, na melhor estratégia Gramsciniana, buscando uma hegemonia cultural, que se utiliza do vocabulário como um logos divino, que fez pelo poder da palavra todas as coisas, assim esses ideólogos esperam construir sua realidade da mesma maneira.

A esquerda olha com espanto essa “onda conservadora”, do alto da varanda gourmet do reino Leblônico ou das salas do mundo USPiniano. Onde tem a maioria dos cérebros e corações, nessa casa de espelhos, não conseguem ver nada além de sua própria imagem refletida e esqueceram de olhar para dentro, expulsando os que tentaram alertar como Marina, Gabeira e Ciro Gomes, aliás seu irmão, Cid, deu um choque de realidade para todos aqueles que estavam em um comício do PT, gritando : “Lula tá preso, babaca!”[12]. Nem olharam para fora, não observando que seu poder antes intocável, estava se esvaindo pelos 9 dedos de seu líder.

CId Gomes 18.10.2018 -Ato Pró-Haddad

A narrativa acabou, apesar das tentativas frustradas de impugnar as eleições por culpa do Whatsapp [13], esse descolamento da realidade é algo que afeta outros partidos da esquerda, como comentou sobre essas práticas do PT nas eleições, o líder do PSTU Rui Costa Pimenta:

…Eles erraram na Dilma, erraram no Lula, erraram em tudo. Eles estão agora: “não, agora nós temos a fórmula nós vamos copiar o Bolsonaro, aqui põe verde-amarelo ai no Haddad, pinta de verde amarelo, fala pra ele falar, pega o programa do Bolsonaro que (…) põe aqui que nós vamos ganhar todos os eleitores do Bolsonaro”. Bom, não sei eu não sou do departamento de marketing, né? Mas eu acho difícil que, fora os muitos fanáticos, alguém acreditar seriamente que se vai dar resultado.(sic).[14]

O que o PT está fazendo afeta toda a esquerda, o PT coloca no mesmo pacote todos os partidos que estão ao redor no mesmo espectro de anti-petismo, O PT se isolou em seu mundo mágico, sua sede por poder não fez enxergar o cenário atual, se colocando como bastião da moral e da honestidade, apesar das prisões e denuncias constantes de corrupção. E todos aqueles que não se submeteram foram massacrados, o que aconteceu com Marina em 2014,ou Ciro nessas eleições, por isso, até seus aliados correm risco, como o PSOL ou o PSTU de Pimenta.

O PT se fechou em sua realidade acreditando que a imagem de Lula, mesmo preso, era o bastante. Não foi. Ao termino dessa eleição, o PT irá acusar a direita conservadora, seus militantes que não se esforçaram, os fascistas e até as “tias do zap-zap” , enfim, todos menos o verdadeiro culpado: o próprio PT. se uma auto-avaliação não for feita, somente o ocaso e o esquecimento serão o destino. Sua marcha final não será contra o exercito russo ou contra o inverno rigoroso, mas novamente os russos que serão os culpados pela derrota.

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Thiago Holanda Dantas
vanitas

Teólogo, professor, licenciatura em filosofia, missionário e escritor de blog. instagram.com/vanitasblog . Segundo colocado da 3ª Chamada Ensaios do Radar abc2