Diário da Quarentena: Viciado em Informação

Thiago Costa
3 min readApr 8, 2020

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Conectado o tempo todo

Uma das coisas que percebi ao final da segunda semana trabalhando direto de casa (e sem sair daqui de dentro) foi que estava viciado em informação. E os sintomas eram de vício mesmo. Não ia dormir sem dar uma última olhada nas notícias, sem ver o que estava nos trending topics do Twitter, quais eram as lives do Instagram e, ao acordar no dia seguinte, o processo reiniciava.

Ao longo do dia, como um fumante, cada pequena brecha que eu tinha, já corria para ver qual a mais recente idiotice que o idiota-mor da República havia dito, o que seu gado-robô estava espalhando pelas redes — mais uma vez o Twitter e também o WhatsApp, além de entrar nos portais de Estadão, Folha e O Globo para ver diferentes versões da mesma notícia.

E, também como um viciado, a fissura, a pegada durava pouco. Era o tempo da leitura. Depois disso, já voltava a ficar ansioso, incomodado. Querendo mais. “Só mais umazinha” era a frase que ecoava no fundo da minha cabeça.

Evidente que isso mexeu com minha produtividade. Eu vinha me sentindo exaurido, muito por conta do imenso aumento de trabalho que tive desde que a quarentena começou (mas isso é assunto para um próximo texto), mas dividir meu cérebro com o crescimento da demanda pelos meus serviços com uma vontade incontrolável de acompanhar tudo que acontece no mundo era o verdadeiro motivo do meu esgotamento.

E veja, eu escrever isso aqui não significa que eu tenha em absoluto superado essa questão. “Um dia de cada vez” é o mantra dos adictos. E tem sido o meu também. Tentar manter o controle, focar no trabalho e me permitir pequenos respiros.

Eu sei que meu cérebro quer receber informações, que ele tá ligado num ritmo que não é possível desligar de uma hora para outra. Minha solução? Entregar outras sensações para ele.

Tenho conseguido manter uma rotina de horários bem organizada: acordo cedo, faço exercícios, tomo café e começo a trabalhar. Aí paro para almoçar e antes de voltar ao trabalho, leio um capítulo de algum livro. E a regra é não ser nada relacionado às minhas atividades profissionais. No momento estou lendo “As Brumas de Avalon” e o segundo volume da edição definitiva de Sandman.

É a cura pela ficção. Joseph Campbell já dizia que o herói mata o dragão nas histórias para que, metaforicamente, nós façamos isso em nossas vidas ao ler, ouvir ou assistir as narrativas.

Isso significa que parei de escapar para a home do Uol ou para o Facebook entre uma aula e outra, entre um roteiro ou outro? Evidente que não. Mas a consciência do vício me fez segurar a onda e, pelo menos por agora, não estou me perdendo tão facilmente.

Peço desculpas aqui se alguém que lida com vícios como o álcool e outras drogas se ofender com meu relato. “Como esse cara pode dizer que tá viciado em informação? Isso não existe!”. Infelizmente, o vício em internet — que eu tratei aqui como “vício em informação” — é uma realidade, já confirmada pela Organização Mundial da Saúde.

Para pessoas como eu, que passam muito tempo conectadas, as alterações químicas do cérebro são similares aos do efeito das drogas e do álcool, já mostram estudos realizados há muitos anos.

No meu caso, a quarentena ampliou isso, porque deixou de existir todo o período que eu saía, ia para a faculdade, entrava em sala de aula, fazia reuniões presenciais e meus trajetos eram realizados de moto (onde não dá pra usar o celular). Eu me desconectava, querendo ou não.

Agora, trabalhando de casa, a conexão é constante, ininterrupta. Aí o monstro cresceu e ficou assustador.

Mas estou tentando acabar com ele. Por enquanto, com a ajuda de Sonho e sua família de Perpétuos de um lado, e de Morgana e Arthur Pendragon munido de sua Excalibur de outro. E que venham os próximos capítulos de todas essas histórias. A minha e as deles.

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Thiago Costa

Professor (@nafaap), marketeiro (@evcombr) e nerd. Profundamente nerd (@armazempop). Aqui falamos sobre Marketing Digital, Política, Educação e Cultura Pop