Junho e o GOLPE: A esquerda era o cordeiro a ser sacrificado
Faz 4 anos desde que Junho de 2013 abalou o país. E nestes 4 anos os petistas não cansaram de nos culpar pela “reação conservadora” que os fez perder o poder.
O que eles não contam é que mantiveram folgada maioria com sua base nas eleições de 2014. De fato, perderam coisa de 50 deputados, mas ainda mantinham uma base de mais de 300 (picaretas).
O problema pro PT foi que Junho mostrou pro Centrão que o partido não controlava mais as ruas, assim como movimentos de direita surgiram em oposição à Junho e conquistaram seu quinhão de popularidade. Mas notem, a direita cresceu não por causa de Junho, mas por causa do esmagamento patrocinado por PT e aliados de Junho. Sem oposição, a direita cresceu no vácuo deixado.
Junho forçou um reposicionamento de diversos campos ideológicos, sem dúvida, mas não há qualquer reação causal com os acontecimentos que levaram à queda de Dilma, na verdade a reação do PT à Junho é que explica, em parte, sua queda.
Ao invés de escutar as ruas (e escutar de verdade, as propostas de Dilma pra tentar segurar o movimento não eram as que nos interessavam ou que pedíamos), o PT preferiu dar uma lição naqueles que não aceitavam seu controle. Oras, como assim amplos setores de esquerda ousavam sair às ruas sem pedir permissão a eles, sem controle da CUT e afins? Era preciso agir.
Junho foi massacrado tanto nas ruas pela PM, quanto nas redes pela militância doentia petista (com PseudoB sempre junto, mas esses, se achando mais espertos, tentaram usar a UNE pra cooptar o movimento, falhando miseravelmente) que até hoje segue repetindo a ladainha de que o GOLPE foi culpa da esquerda que ousou desafiar os stalinistas sedentos por poder.
É fácil esquecer que ainda em março de 2013 a direita já se organizava em campanhas pela redução da maioridade penal e que há algum tempo Bolsonaro crescia entre a extrema-direita. É mais fácil ainda esquecer que uma juventude que não conseguia sequer lembrar de um governo que não fosse o petista estava cansada e queria mudanças e que, além do mais, é normal que um partido que passe tanto tempo no poder seja questionado e forçado a repensar suas estratégias.
Junho nasceu da esquerda cansada de ser submetida e recebeu apoio de milhões de pessoas de todos os espectros ideológicos, mas em geral progressistas. Vamos lembrar, aliás, que em todos os protestos anteriores do MPL, que convocou as manifestações naquele mês, o PT participou. Curioso como exatamente em 2013, pela prefeitura estar nas mãos do PT, o MPL passou a ser “fascista” e inimigo. Isso porque, vejam bem, os protestos não eram contra Haddad, mas sim exigiam dele e de Alckim a redução das passagens (o mesmo em todo o país e seus respectivos prefeitos e governadores).
Quem transformou 2013 em um protesto contra o PT foram exatamente os petistas buscando uma forma de legitimar o esvaziamento (na porrada) dos protestos e “alertar” à esquerda que tanto não seria tolerada essa revolta, como para manter sob controle setores mais próximos ao partido e soltar da coleira os setores mais fanáticos do petismo, cutismo e “pseudobismo”.
Vejam a ironia do destino: Em 2013 a acusação mais forte contra Junho, em São Paulo, era que os protestos começavam, terminavam ou passavam pela prefeitura, logo, uma violência e uma brutalidade contra o pobre Haddad — o papagaio de pirata do Alckmin naquela situação -, mas ontem, na fracassada greve geral (infelizmente, diga-se), a manifestação terminaria… na prefeitura — mas com Dória pode.
O fato da prefeitura de São Paulo se localizar na área de melhor acesso da cidade, ao passo que o palácio do governo fica numa região de difícil acesso e ótima pra uma emboscada não contava.
No Rio o PT tinha uma ligação carnal com o PMDB, então qualquer protesto era um atentado contra a “esquerda”. E quando os protestos passaram a ter um caráter nacional, com uma amplitude de pautas, Dilma se sentiu atacada e reagiu como melhor sabia — com violência, inépcia e soberba.
Eu já escrevi por aqui que não existe vácuo na política e Junho de 2013 é uma prova viva. A direita reagiu a Junho como fez o PT, mas as reações foram totalmente diferentes. A direita aprendeu com Junho e resolveu ela mesma sair às ruas. Sentiram a fraqueza do PT e atacaram.
O PT preferiu massacrar as ruas ao invés de buscar entender, dialogar a aprender. Ao invés de usar o poder das ruas para pressionar o congresso, o PT preferiu iniciar uma cruzada contra quem não se submetia. O PT preferiu sua base aliada, a conciliação, preferiu tentar eliminar resistências à esquerda nas ruas para contentar o centrão e mostrar que tinha o poder. Perdeu. E foi isso que permitiu à direita tomar o controle da situação.
É difícil saber se Junho acelerou ou simplesmente revelou a fraqueza real do PT em uma coalizão que nada tinha de ideológica, mas era bancada por esquemas de corrupção de proporções gigantescas, mas é possível ter certeza de que Junho não criou essa situação.
O PT apostou na força e perdeu, dando um recado claro para o centrão: Nós não mandamos mais como antes. O PT blefou e pagou caro. Conseguiu cooptar o MTST (ou os vira-latas, como os chamava Emir Sader), mas não conseguiu cooptar toda a esquerda à tempo de impedir o impeachment. A direita já tinha tomado as ruas no vácuo deixado pela terra arrasada que o partido patrocinou.
Os petistas nos diziam naquela altura que “o governo está em disputa”, e de certa forma era verdade, o problema é que a esquerda era apenas a moeda de troca, a disputa se dava entre outros atores. Nosso silêncio era parte do preço para a aliança funcionar. Nós não éramos parte na disputa, éramos o cordeiro (a ser) sacrificado.
O legado claro e palpável de Junho foram as ocupações de escolas nos anos seguintes, mas não, Junho não tem culpa pelo impeachment (ou GOLPE, como chamam os propagandistas). Pelo contrário, Junho apenas deixou claro que a aliança de conveniência do PT com a direita saía muito cara para a população e para a própria esquerda e que era extremamente frágil, dependendo de doses cavalares de corrupção e do controle total da esquerda, do amaciamento e apagamento das pautas sociais- o que, como já expliquei, favoreceu o crescimento da turma Justiceira Social ou Social Justice Warrior.
O desespero diário da militância (paga ou não) do PT nas redes sociais, sindicatos e movimentos para criminalizar Junho e tentar impor sua narrativa vitimista só deixa ainda mais à mostra o pânico do partido com aquele que foi o maior movimento reivindicativo autônomo em décadas e que mostrou que há esquerda além do PT.