7 lições de empreendedorismo que aprendi empreendendo com turismo

Túlio Pires Bragança
8 min readDec 8, 2015

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Um dos nossos passeios

O ano de 2015 foi único por várias razões. Pedi minha namorada em casamento, viajei para caramba e abri uma empresa.

Chega dezembro e bate aquela vontade de olhar pro ano que passou, tentando ver o que foi bom, o que foi ruim e o que a gente tirou de positivo disso tudo. Compartilho aqui algumas lições que aprendi na prática ao colocar um negócio em funcionamento.

Se você não me conhece, explico. Desde 2006 moro em Buenos Aires e no mesmo ano criei um blog, o Aires Buenos, que inicialmente era um diário nos meus dias na cidade mas se transformou num site de turismo. Mas depois de vários anos recebendo milhões de pageviews a cada ano, os lucros do site eram pífios. Isso nunca me preocupou, já que sempre tratei o blog como hobby. Aos poucos fui vendo casos de blogs de viagem que ganhavam dinheiro de verdade e fiquei pensando: se eles podem, por que eu não? Criei alguns ebooks sobre a cidade que deram bastante certo e no fim de 2014 decidi fazer tours focados para brasileiros, o Aires Buenos Tour. Em menos de um ano fizemos mais de 120 tours, levando cerca de 1500 pessoas para conhecer a cidade de maneira criativa, fugindo do clichê de city tour, aquela coisa maçante e tediosa.

O desafio de abrir uma empresa de turismo é enorme, principalmente porque não existe ninguém ou nada a ser consultado. Sou relações públicas formado, trabalho como redator num canal de TV a cabo e não tenho a mínima formação acadêmica em turismo. Não encontrei nenhuma literatura a respeito de abrir negócios nessa área, não se fala muito disso em nenhum lugar, não conhecia nenhum caso, matéria ou material sobre o assunto especificamente voltado para brasileiros. Fica parecendo que empreendedorismo é só para quem está criando um app. Aí sim está cheio de posts, dicas, matérias e cursos online. No caso de viagens e tours o máximo que consegui achar foram alguns casos de sucesso de gringos, como o Museum Hack. Ou seja, eu tinha que dar a cara a tapa para ver o que acontecia. Aqui listo as lições mais valiosas que aprendi no processo. Algumas bem óbvias, outras nem tanto.

Isso aí é um tour guiado do Museum Hack.

1. Vai lá e faz

Planejar é bom, mas planejar demais faz você perder o tesão pela coisa e muitas vezes o timing. Não é à toa que existe tanto produto Beta aí lançado. É exatamente para ver o que presta, o que serve, o que tem de bom e o que tem de ruim nele. Vá, arregace as mangas e aprenda com os erros, o feedback do seu público e o dia a dia da coisa.

No caso do Aires Buenos Tour tivemos a vantagem de ter toda uma comunidade de leitores, gente que gosta do nosso conteúdo, ama Buenos Aires e que nos segue diariamente. Deixamos bem claro antes de lançar que seria um teste, cobramos um preço mais barato e ouvimos as pessoas envolvidas. Do primeiro passeio em janeiro de 2015 aos que estamos fazendo atualmente mudamos um montão de coisa. Mudamos devido a comentários de clientes, dos nossos parceiros e de pequenos detalhes que nunca iríamos saber se não tivéssemos colocado o bloco na rua e iniciado as operações.

2. Nem sempre as pessoas sabem o que querem

Seja fazendo turismo no exterior ou no dia a dia de suas vidas, nem sempre as pessoas têm certeza exatamente do que querem. Comprovamos isso claramente ao definirmos nossos produtos. Os dois primeiros tours que criamos não consultamos em nada os clientes. Vi o que na minha opinião estava faltando no turismo em Buenos Aires e colocamos em prática.

Um, que se chama Lado B de Buenos Aires, onde mostramos lados menos conhecidos da cidade mas que valem muito a pena. Algo como um tour sem os lugares clichê, que são muito legais mas todo mundo já conhece. Além disso, inclui um fotógrafo profissional que faz registros belíssimos. O outro passeio, chamado Buenas Noches, é um city tour noturno que termina com champagne num restaurate no 21º andar da cidade. Até hoje os clientes nos contam que quando comentam no hotel sobre esse passeio os funcionários acham estranho. O quê? Passeio de noite?

Ou seja, duas propostas que ninguém nunca nos solicitou, mas que criamos mesmo assim. São de longe os passeios mais buscados, exatamente porque não temos concorrência. São originais e únicos na cidade.

Também criamos um passeio que em teoria todos sempre buscam: o que passa pelos lugares mais clássicos da cidade. Vivíamos recebendo pedidos e sugestões de fazer algo do tipo. Ok, ouvimos os clientes, criamos o passeio e… as reservas não chegavam! Ainda estamos testando para saber o porquê, mas dá pra concluir que as pessoas nem sempre sabem o que querem.

3. Cerque-se de gente motivada

Cláudio!

Até o motorista que temos no Aires Buenos Tour curte fazer nossos passeios. O Cláudio participa, dá opinião, pitaco e deixa o tour muito mais rico para os clientes. É bem menos divertido e informativo quando ele não pode ir e manda um substituto.

Nossos guias, fotógrafos, assistentes e fornecedores querem e gostam de fazer parte do time. Parece óbvio, mas muitas vezes trabalhamos com gente que não gosta do que faz, não está comprometido e nem se importa com nada. Só quer o dinheiro no final do mês. Para que ter esse tipo de gente ao seu redor? É claro que é nosso papel motivá-los, mas tem muitas horas que isso não é suficiente.

4. Tenha uma identidade bem clara

Quem você é? Qual é a missão da sua empresa? Não é só grande corporação que precisa ter isso. Ao ter bem definido o seu "eu organizacional", a empresa sabe que caminho levar, que clientes vai ter e o que vai aportar no seu meio. No nosso caso, o Aires Buenos Tour é o passeio número 1 em português em Buenos Aires e nossa missão é proporcionar passeios criativos para que nenhum brasileiro faça programa de índio.

A partir daí o cliente já sabe o que sua empresa faz e o que propõe, sem correr riscos de se decepcionar. Um exemplo dos nossos passeios é que não levamos nem buscamos as pessoas no hotel, mas temos um ponto de encontro. Muitos clientes pedem que os busquem, mas explicamos claramente porque não fazemos isso: buscar no hotel deixaria o passeio mais caro e muitas vezes os turistas passam uma hora num pinga-pinga constante entre hotéis da cidade até começar o tour, tempo que poderia ser muito melhor aproveitado curtindo Buenos Aires de outra maneira. Sabemos que com isso acabamos perdendo alguns clientes, mas de outra maneira também os seleciona. Não queremos ter gente tão dependente nos passeios, mas curiosa, que pergunta e queira aprender.

5. Trate o cliente como você gostaria de ser tratado

Se eu como turista encontrasse um guia que fosse grosseiro, inflexível, cheio de verdades absolutas e não disposto a escutar passaria longe. Então por que mesmo assim encontro tanta gente assim? Será que é tão difícil assim se colocar no lugar do outro? Nunca entendo a figura do chefe carrasco, da empresa que não ouve o cliente e não é razoável. Um dia eles também foram empregados, um dia foram consumidores. É tão fácil tratar bem as outras pessoas. É só imaginar como a gente gostaria de ser tratado.

Outra conta que não fecha na relação empresa-cliente é o preço do mau atendimento. Será que as empresas não se dão conta de que é caro? Recebemos milhares de emails e reservas e em pouquíssimos casos tivemos que devolver dinheiro, sempre sem titubear. O que é mais produtivo? Lidar com clientes reclamando o tempo todo, perdendo seu tempo respondendo críticas e tendo sua imagem prejudicada ou devolver 50 reais e acabar o assunto ali?

6. Não se jogue direto na piscina. Coloque antes o dedinho do pé para medir a temperatura

Posts com fotos lindas sobre quem largou tudo e foi buscar seu sonho vendem uma imagem que tudo parece tão fácil.

Mas onde estão as histórias de fracasso? Cadê os posts sobre empreendedores que quebraram a cara, perderam dinheiro e só levaram consigo a experiência do que não fazer na próxima vez? Nunca li histórias de gente que estragou o casamento e voltou a morar com a mãe porque um negócio deu errado. Será que essa gente não existe? Ou só estão longe dos blogs de empreendedorismo?

A hora de largar tudo pode demorar a aparecer. Cada pessoa e projeto tem seu tempo. Uma coisa é certa, quando esse momento chegar você não terá mais dúvidas. Será claramente a melhor opção a ser tomada.

O Aires Buenos Tour ainda hoje é um projeto paralelo. Não é minha única fonte de renda e foi graças a isso que pude testar e me arriscar. Quando lancei a empresa, de alguma maneira me autorizei a fracassar. Não deu errado, mas se desse eu não estaria na rua da amargura.

7. Divirta-se

Duas mineiras e uma portuguesa no tour Lado B de Buenos Aires. Foto Agnes Cajaíba

Empreender não pode ser só um hobby ou apenas uma busca pelo dinheiro. Tem que ser algo que fique no meio. É encontrar uma oportunidade de negócio em algo que você gosta e conhece.

Quem empreende só pelo bem-estar não ganhará dinheiro. Quem vai atrás só da grana pode até lucrar, mas acumulará muito mais dor de cabeça.

Pelo menos eu não empreendi para ter mais problemas e encheção de saco. Foi para ter uma outra fonte de renda, mas também para conhecer gente, me divertir e mudar um pouco a vida das pessoas. Trabalhar com turismo é sensacional porque você lida com gente alegre, com momentos divertidos e leves. É uma sensação muito gostosa saber que ajudamos a criá-los no Aires Buenos Tour.

Valeu por chegar até o final do texto. Espero de verdade que o meu aprendizado ajude em algo. Em breve postarei as lições que aprendi lidando com o público brasileiro com o Aires Buenos Tour. Fique ligado.

Em janeiro lanço outro projeto, o Phototrip.me que reunirá fotógrafos brazucas ao redor do mundo. Nossa missão será "Deixe o pau de selfie em casa". Meu sócio é o Henderson Moret, fotógrafo e guia de um dos nossos passeios.

Qualquer coisa é só entrar em contato comigo. Tô ali facinho no Twitter: @tuliopb

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Túlio Pires Bragança

Fundador do Aires Buenos, Phototrip.me e de otras cositas más. Redator On Air da Fox International Channels. Mora em Buenos Aires há 11 anos.