Artes, políticas e memórias

Como a memória pode fazer parte de uma narrativa que verse sobre arte, política e cidade?

Biev Ufrgs
4 min readJan 21, 2021

A apresentação destas imagens diz respeito a uma pesquisa feita nos acervos do Jornal Zero Hora de Porto Alegre. A busca se deu por achar reportagens antigas sobre a arte de rua na cidade e encontrou-se elementos interessantes!

Fotografia de Genaro Jorner — Acervo da Zero Hora

A primeira reportagem encontrada é de 17 de julho de 1989 e teve como título “A arte nas ruas”. O grande objetivo dessa reportagem era diferenciar o que é arte do que era considerado vandalismo. Percebe-se assim que esta distinção buscada freneticamente até os dias atuais tem sua gênese nos fins dos anos 80.

Neste ir e vir do tempo, marcado pelas descontinuidades temporais, vamos ao dia 05 de Julho de 1969 quando foi publicada a notícia “Estão Pichando Carros” no Jornal Zero Hora. O Brasil ainda vivia um período de ditadura militar e a reportagem se tornou uma forma de acusação contra desordeiros urbanos que pichavam carros.

Acervo Zero Hora

Mas intervenções artísticas urbanas além de suas matérias e tintas são produzidas por pessoas. Dois dos mais proeminentes artistas de rua da década de 80 em Porto Alegre eram Frantz (esquerda) e Gariba (Direita). O primeiro trabalhava com tintas e realizava intervenções mais ligadas ao stencil. Já Garibas foi um dos primeiros personagens urbanos de Porto Alegre que fez intervenções inspiradas no graffiti norte-americano, que arracem chegara com suas revistas e filmes nas bancas da cidade.

17 de julho de 1989. Imagens produzidas por Ronaldo Bernardi para o Jornal Zero Hora.
Acervo Zero Hora 28 de Julho de 1989 — Imagens de Olderige Zardo

O mês de Julho de 1989 parece ter sido um período de olhar atento do Jornal Zero Hora frente as intervenções urbanas em Porto Alegre. Uma semana após a reportagem “A artes das ruas” o jornal gaúcho lança outra reportagem dessa vez falando de um tipo de intervenção que marcava frequentemente a estética da cidade. Se tratava do escrito “Ali Baba” que fazia referência a uma peça de teatro infantil que acontecerá no Teatro Renascença. A pixação então foi encarada como uma estratégia de marketing da peça e o diretor, Nelson Magalhães, isentou-se das acusações dizendo que não havia mandado ninguém pixar a cidade.

Acervo Zero Hora 17 de julho de 1989 — Genaro Jorner

Outro elemento interessante que aparece nos acervos do jornal é a menção a Nestor Del Pino, chileno, um dos primeiros muralistas da cidade. Del Pino fazia intervenções em grande escala, principalmente em Bairros como o Bom Fim e a Cidade Baixa.

Acervo Zero Hora, 14 de Outubro de 1979

Quando o filme “Yank” produzido para fins comerciais de uma marca de calçados da cidade Novo Hamburgo chegou as telas foi censurado. Em tempos de declínio da ditatura civil militar o filme demonstrava uma cena na qual jovens pixavam um muro com a frase “Liberdade para as agitações”. Reproduzido em rede nacional o filme foi censurado pelo departamento de comunicação e propaganda do governo federal por atentar contra a “respeitabilidade” e a “decência”.

Acervo Zero Hora, 16 do Setembro de 1985

Não raras a ocasião onde a simples busca pela palavra “picho” através de um ferramenta de pesquisa interna do acervo do jornal nos leva a reportagens relacionadas a criminalização de tais práticas. O que é interessante perceber é que muitas delas são dos finais da década de oitenta, no mesmo período que o mesmo tipo de matérias jornalísticas apareceram em todo Brasil, principalmente em São Paulo. Nota-se um interesse maior da mídia aqui relacionado a uma diferenciação entre pichação e grafite, desde então fomentada pelos poderes públicos.

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