Startups: Use o Quadro de Validação e evite desperdícios.

Vinicius Bittencourt
9 min readDec 19, 2018

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O mercado das startups no Brasil está crescendo a passos largos. Uma startup é uma empresa diferente de uma empresa tradicional porque ela utiliza, geralmente, tecnologia e modelos de negocio diferenciados, que fazem com que ela cresça numa velocidade muito acima de uma velocidade normal de mercado[4]. Isso acontece porque ela usa modelos inovadores para vender e comercializar esse produto[2].

De acordo com um levantamento feito pelo site de empregos Adzuna[1], a área mais demandada pelas startups é a Tecnologia da Informação. Ocupando a primeira posição, estão as vagas para desenvolvedor web e mobile (Android e iOS). O Brasil é um dos mais importantes mercados na área de Tecnologia da Informação.

Uma dificuldade associada ao modelo de negócios das startups é que ele envolve muitas incertezas[5]. Por exemplo, não sabemos se existem clientes para o produto ou serviço, se o modelo é realmente lucrativo ou se é possível executar o modelo. Por este motivo, as startups comumente se concentram em algum tipo de inovação e são consideradas empreendimentos de alto risco.

Quando se está criando um novo produto, o mantra do movimento Lean Startup “coloque o produto no ar e faça iterações” é uma prática essencial[6]. Ninguém sabe o quão complexas são as necessidades e expectativas dos usuários até que eles tenham o produto nas mãos.

Um ótimo artifício para lidar com esse cenário de incerteza é o Quadro de Validação, desenvolvido para validar se nossas hipóteses estão corretas e evitar o desperdício de tempo e de esforço.

O Quadro de Validação, ou Validation Board, foi desenvolvido pelo Lean Startup Machine (LSM)[3], um movimento formado por empreendedores de todo o mundo, que promove workshops e oferece ferramentas para aprimorar o processo de criação de novos produtos em startups. Trata-se de uma ferramenta simples e gratuita para testar suas ideias. Ele é baseado na metodologia Lean e sua elaboração envolveu o estudo dos processos de mais de 500 startups.

O Validation Board consiste em criar hipóteses sobre o problema e o cliente e definir experimentos a serem feitos, como no modelo na Figura 1. O objetivo é gerar aprendizado, testando iterativamente cada um dos experimentos, os quais são suposições que caso sejam invalidadas, podem quebrar a empresa ou arruinar a ideia.

Ao final de cada iteração obtém-se o resultado sobre a validação ou invalidação da hipótese e, com isso, é possível tomar a ação desejada.

Figura 1: Modelo do Quadro de Validação

Sendo assim, o resultado consiste em supor um cliente e um problema, nos quais são definidas as suposições principais em que, caso alguma delas seja invalidada, o seu negocio irá quebrar. Após criadas as principais suposições, uma delas é escolhida, especificamente a de maior risco ao seu negocio. Nisso, define-se um método de avaliação (Exploration, Pitch ou Concierge) e o seu mínimo critério de sucesso.

Por último, executa-se a etapa conhecida como “Get out of the building”, cujo significado é “ir pra rua” e realizar as tarefas necessárias para validar ou invalidar a ideia. Caso ela seja invalidada, a suposição estava errada e deve-se “pivotar”, definindo novas hipóteses de clientes ou problema que queremos solucionar. No entanto, caso ela seja validada, a próxima suposição de maior risco é escolhida e o ciclo é reiniciado.

Na parte de cima do Validation Board, em Track Pivots, mapeamos as hipóteses de cada pivot. Os projetos de uma lean startup podem sofrer transformações ao longo do tempo, conforme as ideias são validadas ou invalidas e essa parte do quadro relata um histórico das transformações.

Já nas partes de baixo, em Design experiment e Results, encontram-se os experimentos, nos quais colocamos as ideias a serem testadas e o histórico do que foi validado ou invalidado.

A seguir, mostraremos maiores detalhes sobre como usar o quadro, começando pelo conceito de “pivotar” e em seguida o modo de preenchimento de cada campo.

Pivotar

Pivotar é um termo derivado do inglês “to pivot” (mudar ou girar) e designa uma mudança no rumo do negócio. No Validation Board, o pivot é feito quando alguma hipótese é invalidada, isto é, o que foi suposto pela equipe não condiz com a realidade. Nesse caso, diversas ações podem ser tomadas; como por exemplo mudar o segmento, a estratégia, a plataforma e/ou os clientes.

As principais maneiras de pivotar, de acordo com a VentureOne[7], uma aceleradora de startups, são os seguintes:

  • Zoom-in pivot. Neste caso, o que anteriormente foi considerado uma única parte ou característica de um produto torna-se todo o produto. Isso significa desenvolver um MVP com aquela parte ou característica e realizar entregas rápidas e eficientes.
  • Zoom out-pivot. Às vezes, um único recurso é insuficiente para suportar um conjunto de clientes. Neste tipo de pivotamento, o que foi considerado a totalidade do produto torna-se uma única característica de um produto muito maior.
  • Pivotar Segmento de Clientes. Seu produto pode atrair clientes reais, mas não os da visão original. Em outras palavras, ele resolve um problema real, mas precisa ser posicionado em um segmento de clientes para qual seu produto está mais aderente.
  • Pivotar o Que o Cliente Precisa. O feedback do cliente inicial pode indicar que sua solução não é o que ele precisa ou que o próprio não está disposto a usar ou pagar por ela. Isso significa mudar o posicionamento estratégico do seu produto ou um produto completamente novo para encontrar um problema que vale a pena resolver.
  • Pivotar Arquitetura de Negócios. Existem duas arquiteturas de negócios principais: Alta margem, Volume baixo (modelo de sistemas complexos), ou Baixa margem, Alto volume (modelo de operações volume). Não é possível fazer as duas coisas ao mesmo tempo.
  • Pivotar Modelo de Receita. Refere-se à monetização ou modelo de receita. Mudanças na forma de gerar receita podem ser um dos fatores de sucesso de uma startup. Nem sempre há problema com o produto desenvolvido e a solução proposta, as vezes o problema pode ser a forma que o usuário está sendo cobrado pelo uso do produto/serviço oferecido pela startup.
  • Pivotar Tecnologia. Às vezes, uma startup descobre uma maneira de conseguir a mesma solução, usando uma tecnologia completamente diferente. Isso é relevante se a nova tecnologia pode oferecer um melhor preço e/ou desempenho para melhorar o grau de competitividade da startup no mercado em que ela atua.

Hipótese de Cliente

A Hipótese de Cliente, ou Customer Hyphotesis, é a parte do quadro no qual coloca-se, a cada pivot, o suposto cliente. Por exemplo, ao desenvolver um produto que tem como objetivo resolver um problema para desenvolvedores mobile, esses são colocados em Hipótese de Cliente. Caso a ideia inicial seja invalidada, o produto deverá ser pivotado e, dependendo do caso, ter uma Hipótese de Cliente diferente.

Hipótese de Problema

A Hipótese de Problema, ou Problem Hyphotesis, é uma suposição de problema possuído pelo suposto cliente, cujo o produto poderá resolver. Por exemplo, acredita-se que o tempo que um aplicativo leva para ser atualizado é um problema que afeta os desenvolvedores mobile e objetiva-se desenvolver uma solução para acelerar esse processo. Em virtude disso, coloca-se essa demora na atualização como Hipótese de Problema. Em caso de ser pivotado essa Hipótese de Problema pode mudar, assim como a Hipótese de Cliente.

Vale ressaltar que a Hipótese de Problema deve ser específica do Cliente. Por exemplo, uma declaração como

“As pessoas não estão fazendo reciclagem”

não seria uma definição válida para esse campo, pois não é um problema que uma pessoa possui e sim um comportamento geral da sociedade. Outra declaração como

“Pessoas esquecem o dia da coleta de lixo”

seria um problema válido, pois é um problema que pode afetar um indivíduo e podemos criar algo para trabalhar sobre esse problema. Ambos são demonstrações de declarações similares, porém com problemas distintos.

Hipótese de Solução

A Hipótese de Solução, ou Solution Hypothesis, é o que acredita-se solucionar o problema proposto. Aconselha-se não definir uma Hipótese de Solução antes de validar a Hipótese de Problema, pois não se deve perder tempo e esforço para encontrar uma solução que possa ser invalida após feitos os experimentos.

Figura 2: Track Pivots, parte de cima do quadro

Principais Suposições

Os itens colocados em Suposições Principais, ou Core Assumptions, são as suposições que deve-se validar através dos experimentos e caso sejam inválidas podem obrigar a pivotar.

Suposição de Maior Risco

Escolhemos para testar a cada iteração a suposição que possui o maior risco para o nosso negócio dentre as Suposições Principais que restam ser validadas. Chamamos essa de Suposição de Maior Risco, ou Riskiest Assumption.

Em outras palavras, é aquele pensamento que se for confirmado através de experimentos que não corresponde ao que supomos ser verdade, tem maiores chances de quebrar nosso negócio e termos que pivotar a ideia.

Esse campo fica propositalmente destacado no quadro, com um fundo amarelo, para chamar bastante atenção, já que a validação de seu conteúdo é o passo mais importante dessa iteração.

Método de Validação

O Método de Validação, ou Validation Method, é a forma de validar a Suposição de Maior Risco.

O movimento Lean Startup Machine define três métodos para validar as suposições:

  • Exploração

O principal objetivo da Exploração, ou Exploration é coletar uma grande quantidade de dados sobre um determinado setor ou cliente. Essa é a fase que aprende-se sobre o negocio, os clientes e a solução da ideia.

Para alcançar um dos objetivos deve-se fazer uma pesquisa exploratória no mercado para verificar a sua validade. Pode ser através de enquetes ou entrevistas, obtendo a opinião dos supostos clientes sobre o assunto para tentar descobrir se concordam com a suposição a validar. Caso consigamos obter uma quantidade positiva de opiniões maior ou igual ao mínimo estabelecido, a ideia é validada. Caso contrário, é invalidada.

  • Pitch

Seu principal objetivo é validar o cliente. Nessa fase já se tem uma ideia de como solucionar o problema e queremos descobrir como os clientes podem ou querem pagar por isso.

O pitch consiste em expor a ideia proposta pra solucionar o suposto problema e obter feedback dos clientes, pode ser através de um vídeo (geralmente entre 1 e 5 minutos) ou uma apresentação.

  • Concierge

Seu principal objetivo é confirmar o segmento de clientes e aprender exatamente como a sua solução pode ajudá-los. Entrega-se um produto com os mínimos requisitos para conseguir obter a experiência desejada e coletar dados sobre o comportamento do cliente.

Nessa fase já se tem uma boa ideia do segmento do cliente, mas não se tem tanta certeza como ajuda-los.

Critério Mínimo de Sucesso

O Critério Mínimo de Sucesso, ou Minimum Success Criterion, é o valor mínimo que devemos obter no experimento para considerarmos válido. Pode ser, por exemplo, uma porcentagem de usuários que concordaram com a ideia ou uma quantidade de downloads. Predeterminá-lo evita que haja uma auto-sabotagem.

Figura 3. Parte de Experimentos do Quadro

Results — Get out of the building

Após definir os três itens anteriores, devemos “sair do prédio” e fazer os experimentos necessários para validar as ideias. A cada iteração, esses itens serão avaliados e dependendo do resultado serão movidos para os espaços destinados a ideias validadas ou invalidadas.

As informações de qual o critério de validação e o critério mínimo de sucesso deixam de ser tão importantes depois que a suposição já está testada e por isso, em cada um desses espaços para colocar a ideia relacionada no histórico do quadro, são colocados os três post-its, um em cima do outro, mantendo a descrição da ideia no topo. Desta forma, os três campos do passo anterior passam a ocupar um espaço só, dando destaque apenas à informação mais importante.

Figura 4: Histórico das Validações

Conclusão

Desenvolver um projeto baseado numa premissa falsa pode levar a meses de trabalho jogado fora. Sendo assim, uma ferramenta de uso tão simples como o Quadro de Validação é uma ótima opção para testar suas ideias inovadoras e, se necessário, acertar o seu rumo o quanto antes.

Baixe agora mesmo, gratuitamente, os templates do Quadro de Validação em http://www.validationboard.com e veja como ele pode ser extremamente útil na construção do seu projeto. Sugiro que também assista aos vídeos do site supracitado, que exemplificam alguns casos de maneira muito didática.

Este estudo sobre o Quadro de Validação fez parte de um projeto final de graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), entitulado Aceleração da Validação de Hipóteses em aplicativos para iOS, com a co-autoria de Pedro Fellipe Cortez e orientação do Prof. Rodrigo de Toledo, PhD.

Veja uma explicação detalhada e exemplificada do uso do Quadro na apresentação em https://prezi.com/embed/pzwwadfhoqwd/

Referências:

  1. RIES, Creating the Lean Startup. 2011. Disponível em: <http://www.inc.com/magazine/201110/eric-ries-usability-testing-product-development.html>.
  2. PACHECO, A. C. Startups: modelo de negócio em alta no Brasil expande mercado para profissionais de TI. 2014. Disponível em: <http://www.techoje.com.br/site/techoje/categoria/detalhe-artigo/1789>.
  3. GITAHY, O que é uma startup? 2010. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/pme/noticias/o-que-e-uma-startup/>.
  4. EMPREGOS em startups brasileiras aumentam 23%. Disponível em: <http://corporate.canaltech.com.br/noticia/startups/Empregos-em-startups-brasileiras-aumentam-23/>.
  5. LEAN Startup Machine: The Validation Board. 2014. Disponível em: <https://www.leanstartupmachine.com/validationboard/>.
  6. RIES, E. Startup Lessons Learned — What is startup. 2010. Disponível em: <http://www.startuplessonslearned.com/2010/06/what-is-startup.html>.
  7. VENTURE ONE. Pivotar. 2014. Disponível em <http://www.ventureone.com.br/pivotar/>

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