Virando a Pauta
7 min readJul 3, 2015

O que a CNN pode ensinar para quem tem uma tv e quer melhorar na internet. Ou como melhorar sua TV , com o que a internet ensina…

1) “A CNN é uma empresa Digital First”

Esse é um lema implementado por Jeff Zucker, presidente da companhia há dois anos. Dá pra perceber que isso já é uma realidade:

- Toda reunião começa com o pessoal da internet. Os editores de homepage mostram as métricas auferidas pelo Chartbeat. Esses números acabam balisando os espelhos dos jornais na TV.

- A notícia entra primeiro na internet. Pra tornar física essa realidade, a principal redação da CNN foi dividida ao meio e parte da equipe do digital foi trazida pra lá. As informações que chegam à redação são compartilhadas.

2) Social Media!

As mesas de chefia de reportagem e apuração tem duas pessoas por período para checar informação e descobrir entrevistados através das redes sociais . Toda imagem ou informação obtida por rede social é checada e confirmada. Após uma verificação, ela é aprovada para o uso. A foto ao lado mostra quem checou e quem aprovou o uso da imagem de Davi Wright, americano que tinha se alistado no Estado Islâmico.

3) Não faça na rede social algo que possa te levar pra primeira página !

Sobre o uso pessoal das redes, a CNN criou um manual para que todos possam se guiar em relação a seu comportamento. Em linhas gerais, se pede que os jornalistas não se posicionem em relação a temas que são cobertos pela emissora.É estimulado que o jornalista tenha uma conta profissional e outra pessoal fechada. Se ele tiver uma só, a recomendação é que ele use 70% para conteúdo profissional e 30% para pessoal.

4) O poder da “Tríade”

Um baita erro em 1998 fez com que a CNN criasse um mecanismo pesado para evitar novos problemas. Naquele ano, a TV publicou uma reportagem que cravava que os Estados Unidos tinham usado gás sarin para matar desertores americanos no Laos em 1970, durante a Guerra do Vietnã. A fonte — um general já meio senil, todo confuso, que o produtor entortou até ele dizer o que a tv queria ouvir. A reportagem foi absolutamente desmentida e a TV quase quebrou. A segunda temporada da série Newsroom da HBO foi inspirada nesse episódio. Depois dali criaram a Tríade.

Praticamente todos os textos dos repórteres, inclusive de internet, são lidos por um grupo de editores chamados “The Row”. O nome é porque todos ficavam dispostos na mesma fileira na redação em posição de destaque. Ali também são criadas orientações para assuntos que aparecem no dia. Por exemplo, nas repercussões do massacre na igreja de Charleston, Obama usou a palavra “nigger” para falar sobre o racismo ainda existente. A norma veio minutos depois — não cortariam o discurso do presidente, mas nos textos de tarjas e no site usariam da seguinte forma — the N — — — word” “

Se a reportagem for muito crítica/ sensível, passam ainda pelos outros dois vértices da “Tríade”: Legal — os advogados que analisam as implicações jurídicas e Standard and Practices — setor responsável pelas normas e práticas que orientam a produção de todo o conteúdo da CNN . Todas as normas e atualizações diárias, inclusive o CNN Policy Guide (manual de 90 páginas que prevê quase todas as situações e recomendações para apuração e reportagem e que eu tive que assinar um documento em que me comprometia a não copiar!), estão em um site interno disponível a todos.

A pergunta básica da Tríade é “A reportagem é justa, precisa, balanceada e responsável?”

5) Vivo + Três ou quatro assuntos

A presença da informação sobre tudo a qualquer e todo momento disponível em todos os lugares e para todos na internet fez com que Jeff Zucker mudasse o conceito da programação da Cnn doméstica — a exibida nos Estados Unidos, que é bem diferente da CNN internacional, que é a que a gente consegue ver aqui. O foco é o ao vivo — aumentaram a quantidade de horas ao vivo na grade — e direto do local onde os fatos estão acontecendo. Outra estratégia é dedicar o canal a três ou quatro assuntos. Assuntos fortes que estarão na roda de conversas das pessoas que são escolhidos pelo próprio Jeff Zucker que participa sempre da reunião editorial das 09h00 e que concentra todo o grupo. Não há mais aquele jornal tradicional com vinte ou trinta assuntos que estarão nas capas dos jornais do dia seguinte.

Apesar de surrar os assuntos, isso fez com que o canal voltasse ao segundo lugar de audiência entre os canais de notícias, se aproximando da Fox News. Estimam que em média a audiência fique 15 minutos no canal vendo notícias.

6) Além de notícia?

Zucker fez outra aposta de programação para a TV — programas de grandes reportagens na sexta, sábado e domingo à noite, como o sucesso do programa de viagens culturais e gastronômicas de “Anthony Bourdain”- topo de audiência da tv. Esse conceito é expresso na seguinte frase “Noticia não é apenas algo que acontece, mas também algo que você não conhece”. Isso leva a uma aposta no digital no “long form”. Em grandes coberturas, como nos terremotos do Haiti e do Nepal, um repórter do digital é enviado para cuidar primeiro da cobertura factual e num momento seguinte apostar em grandes histórias. Há uma crença baseada em estudos de Stanford que o leitor assimila melhor informações presentes dentro de uma narrativa.

7) O vídeo do digital vai modificar a tv

Já é possível notar de algumas formas. Como as telas de celular são pequenas e muitas vezes os vídeos são vistos sem som, estão escrevendo frases de informação com letras grandes nas imagens. Isso permite a compreensão do básico sem o apoio do áudio. Há uma maior valorização do som natural. No digital, os vídeos de notícia estão mais curtos — não precisam do repórter e às vezes só tem a imagem principal.

8) Social Media Discovery team

Tem pessoas dedicadas a buscar o que está acontecendo e o que está trendando nas mídias sociais. Além do DAtaminer, usam algumas ferramentas abertas como o Chartbeat Rising (https://chartbeat.com/labs/rising/) e o News Whip (http://www.newswhip.com/news-app/)

9) Foco no mobile

Mais de 60% dos page views do site da cnn vem de celulares e tablets. Diante disso, todo desktop tem um emoludor de celular o tempo inteiro na tela para saber como o conteúdo está sendo publicado.

Essa consciência da prioridade para o celular tem que ser levada para toda a empresa. Recomendam a urgência de criar uma função nova nas empresas — o “mobile qualquer coisa” — para ter alguém focado nisso desde ontem!

Apontam que o conteúdo para celular tem que buscar clareza, ordem direta, uma sentença. Focar em conteúdos úteis (que façam a vida das pessoas mais fáceis), que possibilitem utilizar geolocalização, dêem a possibilidade de customização e que busquem formatos nativos, não apenas transpostos.

10) Contadores de histórias

Criaram o projeto Elevate para melhorar o Storytelling . Através da análise das métricas da audiência de vídeos na internet, estão orientando o jeito de contar as histórias. Consideram que um vídeo foi bem se pelo menos 55% das pessoas que o começaram a assistir chegaram até o final. Entre os achados nessa pesquisa, descobertas que levam ao universal:

– bons personagens;

- um senso de conexão emocional ou drama na história (mirar no coração);

- um arco claro da narrativa — uma abertura com gancho, uma tese, a entrega do prometido e um bom fechamento (às vezes com um pequeno twist) Dá pra comparar com um restaurante — Gancho de abertura / drink de boas vindas; a explicação da tese / a leitura do menu; a entrega / o prato principal e o fechamento/ sobremesa

- a história é sempre um pedaço de uma maior — necessidade de foco

- claras e curtas explicações

- as imagens estão coladas na história, não são artificiais

- a história traz uma experiência, que leva o leitor junto . O repórter está engajado e interessado na história, sua narração tem energia e ele estabelece uma conversa. Nada de stand ups artificiais parados na frente de prédios.

11) São vários “o digital” / Testando o Snapchat

Cada rede social, demanda uma operação diferente. E a CNN quer estar em todos os lugares. Desde janeiro estão na aba Discover do Snapchat. Tem uma equipe de três pessoas — um jornalista e dois designers — que se reúnem as 09h00 para discutir e planejar os cinco temas que serão publicados às 17h00. Sabem que a audiência é principalmente masculina e que tem entre 13 e 24 anos. As histórias tem no máximo trezentas palavras e sempre tentam quebrar o texto em fragmentos menores. Estimam em um milhão o número de pessoas que vêem os snaps da CNN e já sabem que assuntos ligados a crime e a universidade (um pouco sobre profissões) tem boa audiência em seu canal. A capa de cada assunto tem que ganhar a atenção.

12) HLN : News and Views

De olho nos millenials, o grupo criou um canal paralelo com notícias e comportamento chamado HLN. A maior parte do conteúdo do canal é norteado no que está trendando seja no twitter, seja no facebook, seja no google — eles chegaram a criar um algoritmo próprio que junta informações dessas três redes sociais, o HLN Social Index .

Há um foco em aproveitar tudo o que é produzido para internet — um exemplo , os repórteres de breaking news são os da própria CNN. Estavam com uma repórter ao vivo pra falar da fuga dos presos de New York. Para ilustrar, buscaram uma foto do Instagram dela com o buraco por onde os presos fugiram. Todo mundo é creditado com sua conta de Twitter.

Virando a Pauta

projeto de Rodrigo Hornhardt / comunicação, jornalismo, tv, cultura etc