Emergência e calamidade: uma questão de timing
Há muito que se falava nos media do regresso à normalidade e finalmente o dia chegou. Mas António Costa tem frisado que este é um “novo normal”. A minha primeira frase deixa portanto de fazer sentido, visto que não se pode regressar a um local onde nunca se esteve.
É sobre estas questões semânticas de que vos venho falar. Nada de muito relevante, afinal são apenas palavras não é verdade? Ainda assim o suficiente para me deixar num estado, não de “emergência, nem tão-pouco de “calamidade”, mas de dúvida.
Tenho dúvidas acerca do timing escolhido para usar as duas palavras do momento: afinal já passei por algumas emergências, mas felizmente enfrentei poucas calamidades. Aliás sempre tive medo delas. É que para mim uma calamidade é uma emergência descontrolada, uma série de várias emergências que põem em causa a nossa capacidade de resposta, como acabou por se verificar em Itália ou Espanha. Felizmente isso ainda não aconteceu por cá, ainda que seja inegável que a calamidade está oficialmente entre nós.
É normal que o leitor esteja um pouco confuso. Vejamos o que nos diz o dicionário online: para o Priberam uma calamidade é um “grande mal comum a muitos”, uma “série de desgraças que vêm sobre alguém” e um “infortúnio público”. Ora nisto já estamos nós há bastante tempo, o que talvez signifique que a declaração vem um pouco tarde.
Mas talvez o governo queira apenas demonstrar o seu sentido de humor (sempre importante em alturas críticas): vamos voltar a sair de casa e portanto deixar de poder trabalhar em pijama ou ter reuniões por Zoom de boxers. Haverá pior calamidade? Ainda assim parece que o teletrabalho deve ser mantido até junho. Está a ver, as coisas nunca são tão más como parecem.
Portanto já sabe: se cumprir as distâncias, higienizar as mãos e “mascarar-se” em espaços fechados estará mais perto de evitar um regresso do estado de emergência. Isso sim seria uma calamidade.