O cotidiano

caroline machado
a coluna
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2 min readMar 7, 2022

Tem sempre algo de divertido na praia.

Numa das últimas idas, tive a momentânea oportunidade de ficar sentada, sozinha, apenas observando as coisas acontecendo.

Enquanto a luz batia sobre o guarda-sol que me protegia — e eu tentava me espremer para caber inteira na pequena sombra — , reparei em um par de corpos à beira da praia. Muitos cliques, muitas poses e alguns vídeos espontâneos da moça correndo para fora da água e balançando os cabelos como se estivesse em um comercial da L’Oréal Paris. Despenderam, os dois, uns 20min nos registros.

No outro lado, uma menininha, segurando a mão de uma mulher, tentava entrar na água. Não parecia ser a sua primeira vez, apenas mais um caso de amnésia infantil. Se aproximou da água, mas correu antes de ser tocada. Na segunda tentativa, mais corajosa, se deixou sentir o mar e percebeu que estava morno. Pouco mais tarde, voltou com uma pranchinha, sobre a qual tentava ficar em pé, caindo de vez em quando. Quando meus olhos pousaram sobre ela uma última vez, estava sentada, quase em casa, sozinha. Corajosa.

Imagem via Pixabay

Concomitantemente, idosos, aproveitando que já passava das 16h e o sol não castigava tanto, caminhavam de um lado a outro da praia, sem suas camisas ou apenas com um top, expondo os dorsos queimados por outras caminhadas. De mãos dadas ou sozinhos, conversando e em silêncio, a passos largos e curtos, ritmos acelerados e lentos, fazendo-se notar por mim.

Sem óculos escuros, porém à uma distância segura, euvirava minha cabeça para um lado e os olhos para o outro, disfarçando o meu estudo naquela tarde de sábado e imaginando quais elementos poderia utilizar nas minhas futuras divagações criativas. Não cogitei, contudo, a possibilidade de escrever uma coluna sobre.

É que quando se acorda em plena quinta-feira e a primeira notícia que lhe cruza os olhos é sobre a guerra, não parece haver espaço para a pequeneza do cotidiano. Inevitável, porém, é que ele se esgueire por entre as rachaduras da humanidade, como gramíneas entre paralelepípedos. Os casais ainda vão à praia; as crianças aprendem que as ondas não vão lhes machucar; os idosos se banham pela luz amarelada e quente, mantendo os exercícios em dia; os jovens escritores vão à praia, para estudar a vida e, a partir delas, criar outras — e, eventualmente, escrever colunas despropositadas.

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caroline machado
a coluna

escritora e estudante. autora de “Como matar Olga?” (2019). co-criadora da @acoluna.