Real?

caroline machado
a coluna
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3 min readNov 7, 2022

Eu nunca estive muito por dentro das atualizações no mundo das redes sociais. Quando o Facebook se popularizou no Brasil, permaneci adepta do Orkut até não poder mais e, à contragosto, migrei nos 45 minutos do segundo tempo. O mesmo ocorreu com o Instagram (também porque o meu celular da época não suportava o peso da aplicação).

Na última semana, soube da existência de uma nova rede social, chamada BeReal (SejaReal, em tradução livre). A premissa é bastante simples, uma rede na qual as pessoas mostrem momentos reais da vida cotidiana. O objetivo é posto em prática da seguinte forma: diariamente, em momento aleatório, o aplicativo envia uma notificação e, a partir do recebimento, o usuário tem 2min para tirar uma foto e realizar a postagem.

A novidade foi bem recebida pela Geração Z e gerou comentários na linha de que o aplicativo permite que as pessoas mostrem sua verdadeira aparência e vida cotidiana sem horas e horas de consideração sobre um ângulo que favoreça mais, filtros que alteram as características faciais, etc.

É possível que a proposta se concretize, porém, analisando empiricamente o desenvolvimento das redes e o comportamento das pessoas sobre elas nos últimos anos, uma alternativa ruim me pareceu mais próxima da realidade: sabendo da necessidade de retirar uma fotografia por dia, há quem possa tentar elevar os padrões da vida cotidiana aos das redes sociais, especialmente nas questões relacionadas à aparência física.

Para exemplificar, não é difícil imaginar que uma influencer acorde todos os dias mais cedo e se mantenha “produzida” durante todo o dia para sustentar a imagem com a qual somente se apresente esporadicamente na vida cotidiana. Se as publicações esporádicas expondo uma vida perfeita são suficientes para ativar a ansiedade alheia, imagine os padrões inatingíveis que seriam criados a partir de publicações diárias.

Conversando com meu noivo sobre o tema, ele apontou uma outra problemática da rede social: a ansiedade criada pela expectativa de alimentação diária da plataforma. E quando os amigos publicarem diariamente e você não conseguir? E se a notificação chegar no meio de uma reunião? E se não houve internet naquele momento?

Eu não me considero pessimista, longe disso. De vez em quando, inclusive, me perco nos meus delírios de que a vida é mais fácil do que realmente e. Não é novidade, porém, que o ser humano tem uma qualidade especial para deturpar algumas criações que deveriam favorecer um desenvolvimento mais saudável da espécie.

A minha posição final é no sentido de que tudo dê certo, funcione perfeitamente e revolucione a forma como nos comportamos nas e sobre as redes sociais. Por precaução, contudo, vou me manter afastada por enquanto, mas admito que considerei criar um perfil no BeReal para o Chico, nosso mais novo integrante da família, o último yorkshire tranquilo da ninhada.

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caroline machado
a coluna

escritora e estudante. autora de “Como matar Olga?” (2019). co-criadora da @acoluna.