Thalita

Eloisa Capraro
a coluna
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3 min readMay 24, 2024

Na última coluna mencionei meu atrito com Thalita, personagem de uns episódios de um dos meus dias. Por que volto em Thalita? Porque lembrei do motivo de minha frustação com a senhora.

Atenção, palavras fortes a seguir.

Thalita me mandou ler as “orientações”. Na verdade, a fala foi assim:

Estava tudo explicado nas orientações que eu te mandei.

Mas o que é isso, Thalita? Manual não foi feito para ler não. Manual foi feito para ser um negócio com uma encadernação bonita e para a gente fazer piada. Que mané ler orientações.

Não faço ideia de quanta gasolina cabe no Lolomóvel, e sabe por quê? Porque não li o Manual.

Agora, depois que entendido tudo isso, corta para o carrapato me perguntando quantos minutos precisa para assar o pão de queijo. Sabem a minha resposta?

Não sei, tem que ler as instruções do rótulo.

Reparem na petulância desta desaforada, que mentalmente xinga a Thalita em um dia e manda alguém ler o “manual” da comida no outro. É bem aquela que a língua bate no bumbum.

Isso quer dizer que a partir de agora vou sair lendo rótulos? Mas é o quê? Claro que não. Não li e nem lerei. Nem bula de remédio. De quantas em quantas horas mesmo? Ah, espera, vamos ver no uni duni tê, que também uso para importantes outras decisões neste caminho da existência.

Tem coisas que nem com a chegada de uma pessoa super importante na tua vida — psicólogo o nome — se consertam. Talvez seja culpa dessa mistureba aí que a gente tem no sangue. Para ser brasileiro basta ter um monte de outras origens, pronto, veredito: brasileiro.

Não é nascer aqui que conta não. É essa audácia em viver a vida como ela é, ainda que nem sempre deixando-a nos levar. Quanto mais os dias passam, entendo que o ditado certo não é “o mundo foi feito para os ladinos”, o correto deveria ser “o mundo foi feito pelos petulantes”.

Sem contar que xingar alguém de petulante é estranhamente agradável. Não soa ofensivo demais e nem deixa de ser um xingão. É como um xingão educado. Mais legal ainda é “olha a petulância da cavala”.

Por que dei essa volta toda? Ah, sim, porque pensei que todo brasileiro é um pouco petulante, porque descobre tudo na petulância mesmo, sem ler o manual ou as orientações.

Inclusive foi assim em relação à Thalita, vez que ela me disse em uma frase o que me poupou de ler as intruções. Tenho orgulho de dizer isso? Claro que não. Mas também não tenho vergonha, pois se tivesse, não diria.

A vida é isso aí mesmo. Muito trabalho, pouco sono, um pouco de remédio e um cadinho de petulância, senão endoidece de vez. Mesmo assim, desculpa aí, Thalita, a minha petulância, é que sou brasileira mesmo, não leio o manual.

Beijo para quem é de beijo e abraço para quem é de abraço. Beijo para você também, Thalita.

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Eloisa Capraro
a coluna

Há algum tempo tentando não ser uma sem-noção.