Forrock in Rio — O dia que o festival pifou

Frank Junior
A Ponte
Published in
4 min readNov 1, 2017

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*Texto originalmente escrito em 26/09/2017

Essa é a programação do primeiro Rock in Rio em 1985. Repare que na programação tem nomes como Alceu e Elba até medalhões do rock mundial como AC/DC e Iron Maiden.

Lembrando que Alceu fez parte do Udigrudi recifense na década de 70, cantando com Lula Côrtes, e o pessoal do Ave Sangria no show “Vou Danado pra Catende” até cantar com Jackson do Pandeiro a embolada/rock “Papagaio do Futuro”.

Nesse ano do rock in Rio, Alceu lança o disco “Estação da Luz”, mais puxado pro Forró do que pro Rock.

Elba, que sempre cantou forró, e já nessa época com uma carreira bem consolidada foi convidada a participar do primeiro rock in Rio, sendo inclusive a única artista brasileira a participar de todas as edições do festival.

Não é de hoje que o forró divide espaço com o rock. Em 1957, Jair Alves que também era conhecido por “O Barão do Baião” gravou a música “Baião Rock”

“América nos mandou um ritmo singular
Dança louca e atraente que chegou para abafar”

Em 1974, o sanfoneiro Zenilton gravou a música “Severino McCartney”

“Agora ninguém mais me iludes
Sou da juventude
Eu quero é cantar o roquenrol.”

Em 1981, Zenilton grava o disco “O cachimbo da mulher”, e o disco vai parar nas mãos do ainda jovem Rodolfo Abrantes. Um dia de brincadeira, Rodolfo faz versões rock n roll das músicas de Zenilton que tinha aprendido em casa e em 1994 lança o CD “Raimundos”, gravando “Rio das Pedras” composição de Zenilton em versão rock.

Mas teve um cidadão Caruaruense, que estava no RJ hospedado na casa de Luiz Gonzaga, e animado com a agitação da cidade decidiu ir ver o Rock in Rio sozinho. Onildo Almeida voltou do festival pra casa de Gonzaga já com um verso pronto:

“Eu conheço esse toque
Não é baião, não é forró e nem é xote
Vou chamar cumpadre Roque
Pra ver se ele identifica esse toque
É uma mistura de forró com rock.
Mas vi também, do meu nordeste
Três cabras da peste cantando pra valer:
Moraes Moreira, Elba e Alceu,
O forró comeu, o rock se misturou
Forró com rock, e o rock forrófiou.”

Onildo grava a música “Forrock in Rio”, dois anos depois, em 1987, abrindo o LP “Forrock”.

Além das músicas falando sobre o rock, tem o exemplo de Azulão que em 1992 gravou “Tô invocado”, puro rock n roll com direito a teclado iê-iê-iê e tudo, no disco “Dona Tereza arrependida”.

Para entender melhor o casamento entre forró e rock e perceber o valor simbólico da participação de uma banda de pífano no Rock in Rio, a edição de 2017 contou com Geraldo Azevedo, Elba e Alceu em mais uma edição do festival e dessa vez com participação do rock n roll da Banda de pífanos Zé do Estado.

A participação contou com apenas três músicas, mas foi o suficiente pra ecoar nos PAs do palco Sunset: “Zé do Estado de Caruaruuuuu” ao som da “Briga do Cachorro com a Onça” , composição de Sebastião Biano.

O único integrante da formação original da banda de pifanos de Caruaru, hoje com 98 anos de idade, primeira banda de pifanos a gravar um LP (o disco “Zabumba Caruaru” de 1972), e que já teve música gravada por Gilberto Gil e Caetano Veloso.

Axl Rose do Guns n Roses no final do show usou um chapéu de couro nordestino, dias antes Almério fez participação no show de Johnny Hooker e fica sozinho no palco cantando “Respeita Januário” composição de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. E no show do Grande Encontro, o guitarrista que acompanhava a banda é ninguém menos que Paulo Rafael, o único integrante original da banda de Alceu desde a década de 70, onde já tocou com Ave Sangria na mesma época, hoje é um grande nome da guitarra e é Caruaruense.

João do Pife de Caruaru certa vez disse:

“Eu faço pife, toco pife, vendo pife, por isso estou assim pifado!”

Logo, pode-se dizer que o Rock in Rio 2017 pifou:

“Banda de pife, mamulengo e cantador
Reisado, boi de bandeira, e de oito baixo o tocador
A xilogravura, o cordel e o bacamarte
Essa sim é nossa arte, e cultura seu doutor.”
(Nossa Arte Acordou — Anderson do Pife)

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