O futebol e a intolerância

Douglas Amorelli
Revista Simbiose
Published in
3 min readNov 27, 2016
Rua de fog0 - Mineirão - Final da Copa do Brasil 2016

Acima do Atlético, só a minha mãe - e olhe lá!

Realizei um sonho de criança. Fiz uma excursão para assistir um jogo do Atlético. Mais que um jogo, uma final. De todas as experiências que tive até hoje, ainda não descobri nada que alimente mais a minha alma que um pré-jogo ao redor do Mineirão. Do lado de fora: festa, cerveja e tropeirão. Dentro do estádio: uma torcida apaixonada empurrando o Galo.

Entretanto, no meio da fuzarca que estava sendo feita no ônibus, comecei a refletir sobre como o futebol ainda é antro de intolerância. Tal qual um fiel que questiona o bispo, comecei a reparar as atitudes da "minha" própria torcida.

Entenda: este texto não é - DE FORMA ALGUMA - para ganhar recommends, likes, shares - tampouco para passar uma imagem de isento e desconstruído. Acho que todos os homens, sem exceção, precisam se policiar diariamente em relação às atitudes de intolerância. Nem sempre por maldade, agimos desta forma por se tratar de uma cultura enraizada na sociedade brasileira.

Cultura essa que não serve de muleta para justificar nada, mas que talvez não seja completamente extinta nesta geração (infelizmente). Acredito que precisamos nos autoeducar - porque a intolerância vem de berço - e repassar de uma forma diferente para nossos filhos.

Voltamos: um dos principais gritos do Atlético para ofender o Cruzeiro é:

"Pau no cu do Cruzeiro. Bicharada a cantar. Dá o cu aonde for, só para ver meu pau entrar. No seu cuzão, sem sentir dor. Cruzeiro a bicharada do Brasil".

Fiquei constrangido só de transcrevê-lo para o Medium, imagina repetir isso em voz alta.

Como o jogo era contra o Grêmio, outra letra homofóbica era: "Arerê, gaúcho dá o cu e fala tchê". O que tem de futebol nisso? Será que nenhum atleticano nunca 'deu o cu'? E se deu, qual é o problema?

Cara, mas em estádio vale tudo!

Não vale.

Sou defensor de que as pessoas se posicionem. Dentro do ônibus, não consegui. A minha solução no momento foi simplesmente não cantar. Por mais que eu odeie o Cruzeiro (e é muito). Isso eu não canto. Porque na tentativa de desmerecer um time de futebol, estou, na verdade, atacando um colega de trabalho, um amigo da faculdade e toda uma minoria que batalhou e continua batalhando diariamente contra a intolerância - o que é completamente inteligível.

Fora isso, diversas outras pequenas cenas corroboram para sustentar que o futebol é sim um ambiente intolerante - se não o campeão deles.

E eu, que me achava especial por saber lidar com a intolerância - tendo em vista que não faço parte de nenhuma minoria - percebi que, dentro do meu fanatismo, tinha o pensamento de que tudo era justificável por se tratar de futebol. Não é.

Qual vai ser a nossa atitude daqui pra frente?

É de revirar o estômago reparar que o preconceito está impregnado debaixo do pôster de campeão da Libertadores, dentro das treze camisetas, ou sob o cachecol que diz "Atlético: loucura que não tem cura".

A loucura, não. Mas a intolerância tem cura.

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