A arte é política

Deua Medeiros
a terceira margem
Published in
2 min readMay 18, 2016
Foto: Pedro Andrade

A arte é política. Mesmo a arte que nada tem a ver com a política. Mesmo os desenhos de cachorro e gatinho são políticos. Qualquer maneira de expressão pessoal é um gesto político. É eu saber que tenho liberdade de desenhar gatinhos brincando e poder tirar meu sustento disso. É saber que EU como artista posso mostrar aquilo que mora dentro de mim sem censuras. Se é um bichinho ou uma foto do Donald Trump nu que assim o sejam, porque são reflexos verdadeiros de um sentimento. O questionamento pode ser dos sentimentos mas nunca da arte. A arte nada mais é do que um veículo carregado de conteúdo passando pela fronteira do país ‘eu’ para o país ‘mundo’. O que interessa é o que vem dentro, não o veículo em si. A transposição dessa barreira deve ser livre a todo custo, pois é a partir dela que podemos começar a discutir o conteúdo dos veículos-pessoa e da sociedade.

Eu vou mais longe e digo que todos deveriam ser obrigados a passar essa fronteira. Seria a única maneira de abrir de verdade as portas do que somos como sociedade, para que possamos discutir sem máscaras aquilo que está guardado dentro de nós. Porque eu tenho mais medo do que se esconde do que do que se mostra. Mesmo que a aparição seja uma coisa difícil de engolir, pelo menos ela está lá, aberta, exposta. Agora sabemos que aquilo existe e poderemos, como um grupo, entender de onde aquilo veio e porque está aqui. Se vem doente e contagioso, sabemos que somos nós os incubadores do vírus e trabalhamos para extingui-lo. Mas o que fica no escuro permanece vivo, e cresce, e se alimenta, e nos contagia de olhos fechados. Aquilo que rasteja nas trevas internas e nunca é capaz de ver a luz, jamais será combatido. Por isso a arte é importante. A escrita, a fala, o desenho, a pintura. São todas formas indiretas de exorcismo social.

Vivemos um tempo de monstros à solta. Os que moravam em cantos sombrios do íntimo humano, agora saem para brincar ao sol. Muitos ao mesmo tempo. Tantos que às vezes achamos que o mundo é na verdade deles e não nosso. Ainda assim defendo o direito de aparecerem. Nada mais são do que sintomas de uma doença para qual já temos a cura. E o mundo jamais será deles — LEMBRE! — pois nós também temos o nosso exército pessoal, e ele já começou a cruzar a fronteira.

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