Relações incestuosas
Ivanildo Jesus
No dia 08 de setembro o candidato ao governo do Estado de São Paulo, Tarcísio Freitas (Republicanos), visitou a sede do Instituto Baccarelli. Para quem não conhece o Instituto atua junto à comunidade de Heliópolis trazendo aos jovens uma educação musical de excelência.
Trabalhando pela transformação social de públicos vulneráveis a instituição tem por visão “um futuro com mais perspectiva e menos desigualdades”.
Na foto acima temos o então diretor executivo do Instituto, Edilson Ventureli, declarando seu voto para governador, no candidato bolsonarista.
Na publicação, o diretor começa falando sobre a “polarização”. Esse termo perigosíssimo sustenta uma suposta correlação entre o petismo, com todos os seus defeitos, e o bolsonarismo. Para os adeptos da polarização, Lula e Bolsonaro são faces da mesma moeda. A democracia segue bem, contudo, alguns loucos, os mais fanáticos, resolveram começar a brigar por política. Enquanto os supostos “radicais” digladiam-se, os “sensatos’’ posam de cordatos. O problema desse disparate é que a política petista não é FASCISTA.
A política bolsonarista é fascista e se você não acredita em mim, há gente de todo espectro político dizendo isso. Simone Tebet está no palanque de Lula, Geraldo Alckmin é vice de Lula, Amoedo, fundador do partido Novo, declarou voto em Lula e isso tudo por quê? Porque eles têm medo do que pode vir acontecer com a democracia em um suposto segundo mandato de Bolsonaro.
Entretanto, o diretor do Instituto Baccarelli, regente da Orquestra Sinfônica de Heliópolis, aquele que trabalha pela diminuição da vulnerabilidade, acha de bom tom e se sente confortável em declarar voto para um dos asseclas de Bolsonaro.
Além do suposto teatro de bom senso e desse maniqueísmo barato em prol da moral e bons costumes de Tarcísio, Ventureli continua, dizendo que sentiu que Tarcísio está comprometido em governar para o povo de São Paulo, com olhar e dedicação aos mais vulneráveis. Piada de mau gosto.
A vileza sutil desse comentário é ímpar. Edilson sabe que para Bolsonaro a minoria deve se curvar à maioria, quando ele diz que Tarcísio governará para todos, sabe que mente. Tarcísio, um alienígena na política paulistana, desconhece o estado que quer governar, uma hora fala em vender a Sabesp, o que aumentaria a conta de água dos mais vulneráveis que o diretor quer assistir, outra hora volta atrás, percebendo que isso não pegou bem. Tarcísio é antagônico a toda e qualquer causa social que o Instituto defende.
É como se a missão social do Instituto estivesse à venda no balcão da caridade, quem quiser pagar de bom moço, é só fazer a sua contribuição, de preferência com os olhos marejados. Edilson não escolhe o candidato pelas suas propostas para educação ou pelo seu histórico político. Não, Edilson escolheu o candidato pela sua “emoção verdadeira”. Essa suposta ingenuidade, essa defesa irrestrita à “justiça social” tendendo abraçar quem a quer destruir, parece mero acaso. Contudo, faz parte de um projeto político.
Há uma relação incestuosa entre aqueles que defendem causas sociais e aqueles que as atacam. Eles colocam-se no mesmo campo, posam juntos para fotos, se emocionam com a arte, destacam as benesses do contato frutífero com a cultura e pronto, estão aparentemente juntos. Em outro momento, desmantelam orquestras, veem grupos artísticos como gastos, criminalizam as potências artísticas da periferia, fecham o ministério da Cultura e culpam os vulneráveis pelos martírios da pobreza.
Deita no chão
A violência política da última semana aumentou vertiginosamente. O ex-deputado Roberto Jefferson, que mantém laços estreitos e severos com o bolsonarismo, recebeu a Polícia Federal a balas no último domingo, 23 de outubro. O embate se deu por conta da decisão da ministra Cármen Lúcia em voto favorável à punição da Jovem Pan, por divulgar mentiras durante o período eleitoral. Após o fato, Jefferson que já estava em prisão domiciliar proibido de postar nas redes, posta um vídeo xingando a magistrada de “Bruxa de Blair” e a compara a uma “prostituta”.
Em casa, Jefferson tinha um arsenal militar com 7,6 mil munições, segundo o jornal Correio Braziliense. Depois de ferir dois policiais, Jefferson se rendeu, na presença do ex-candidato à presidência da república, Padre Kelmon. Refrescando a memória, Kelmon, o padre, é o candidato que durante os debates eleitorais trocava afagos e colinhas com Bolsonaro.
Após o flagrante, Jefferson aparece em vídeo, exposto pela CNN, em conversa amigável ao lado do policial Vinicius Fecundo, falando de sua intenção de não ferir os policiais que vieram efetuar sua prisão e que até chegou a tê-los na mira. Um exemplo de bondade, o pecado de Jefferson foi não ter passado no Instituto Baccarelli para fazer uma ação social, quem sabe assim teriam até diminuído sua pena.
Já ontem, 29 de outubro, véspera do segundo turno, a deputada federal Carla Zambelli aparece em vídeo armada, no meio da rua, correndo atrás de um homem negro. Tudo começa com uma discussão política, a deputada alega que tendo sido empurrada precisou defender-se. Abaixo deixo o vídeo do tropeço, chamado por ela de empurro.
Carla Zambelli saca arma durante discussão nos Jardins
No caso de Jefferson, a conclusão mais óbvia é que um homem branco armado, com poder, faz o que quer. Ele pode receber policiais a bala, enquanto nas periferias, guarda-chuva confundido com fuzil é motivo para levar tiro. Falam dessa suposta polarização, mas só há um lado armado até os dentes.
Para não deixar Jefferson e Zambelli com score muito alto no ranking das maldades Bolsonaristas, é importante trazer à baila o caso Paraisópolis. No dia 17 deste mês Tarcísio, candidato de Bolsonaro apoiado pelo diretor do Instituto Baccarelli, Edilson Venturelli, esteve na inauguração de um projeto social em Paraisópolis. A visita que não estava nos planos do projeto não foi bem recebida pela comunidade e acabou gerando atritos com os locais. A história é longa, encurtando, diz-se que no intuito de construir fato político que pudesse vir a beneficiá-lo, policiais que faziam a segurança de Tarcísio, atiram em dois jovens desarmados, matando um deles.
No local havia a presença da imprensa gravando parte da ação. Um dos integrantes da campanha do candidato bolsonarista, um agente da Abin, mandou um cinegrafista da Jovem Pan apagar o vídeo que poderia trazer mais luz sobre o caso.
Apesar da enorme “sensibilidade social” de Tarcísio, o fato dele representar o projeto Bolsonarista em São Paulo, deveria causar ojeriza em quem de fato quer fazer justiça social. Como isso não incomoda, tenham a coragem de assumir como são, fascistas. Parem de explorar a justiça social, comportando-se como missionários da música, apartidários. Vocês não estão em cima do muro, o lado de vocês é o do opressor. Isso é visível. Essa suposta serenidade e apartidarismo não enganam, só envergonham. Há muito que vocês desceram do muro.
Após encurralar um homem negro com arma na mão Zambelli grita “deita no chã”. É isso que eles querem de nós. Exigem cotidianamente através dessa violência sem fim que deitemos no chão; que aguardemos quietos o próximo caso isolado; que concitamos à barbárie; que nos curvemos à opressão.
PROJETO SOCIAL E POLÍTICO
Usurpam as causas sociais, raptam as problemáticas da vulnerabilidade sem de fato enfrentá-las. Colocam-se como arautos da bondade e agentes do bem. Educação sem projeto político emancipador ao invés de trabalhar no combate à desigualdade, vira apenas um subterfúgio momentâneo para a mesma.
A excrescência de um diretor de uma organização sociocultural, da magnitude do Instituto Baccarelli, apoiar um candidato com as características de Tarcísio, mostra o tamanho da enrascada que nos metemos.
Diante do fascismo só há um jeito, radicalize-se.