The Light In Your Eyes: A Primavera é para sempre!

Entre a juventude e a velhice, resta-nos as memórias dos tempos glórios.

Adriana Silva
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9 min readMar 6, 2020

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Um drama que transborda de pequenas emoções, assim é The light in your eyes. Confesso que não estava inclinada a vê-lo, mas fui convencida pelas críticas positivas. Retrata, usando o humor, as dificuldades quotidianas dos habitantes de um bairro pobre. Num primeiro momento, somos levados a rir com as cenas cómicas, até que o desconforto se instala quando nos apercebemos que o que estamos a ver é a realidade.

The light in your eyes (2019)
Emissora:
JTBC
Transmissão: 11 de feveiro a 19 de março (12 episódios)
Género: Romance, Drama, Comédia
Elenco principal: Han Ji Min, Kim Hye Ja, Nam Joo Hyuk, Son Ho Jun, Ahn Nae Sang, Lee Jung Eun

À primeira vista, este é um drama de fantasia que aborda o cliché das viagens do tempo. Também assim eu pensava — e pensei durante dez episódios — até que a maior reviravolta da história das reviravoltas se deu e me tirou o tapete debaixo dos pés. Não quero dar spoileres, mas posso garantir que mesmo os sabichões com mania de videntes, vão ser apanhados de surpresa.

Kim Hye Ja encontra em criança um relógio especial que lhe permite viajar no tempo. Mas usá-lo tem as suas consequências: cada vez que ela volta atrás no tempo para benefício próprio, envelhece a um ritmo impressionante. Assim, ela é obrigada a guardá-lo. Mas volta a ir em auxílio do objeto quando o seu pai tem um acidente de carro. Para o salvar, ela usa tantas vezes o relógio que acaba por se transformar numa velha de 70 anos.

Além de se tornar num estorvo para a família, Hye Ja tem de abrir mão do seu sonho de ser jornalista, e desistir de Lee Joon Ha, um jovem triste e solitário que vive no mesmo bairro, por quem ela tem uma paixão.

As costas do sol

O principal adereço de uma série são as personagens. E nesta história há uma variedade de personagens construídas de forma realística — todas elas têm as suas imperfeições e, por isso, é fácil identificar-nos com elas. Os problemas familiares, a ganância, a vergonha, o orgulho e até a idiotice, é tudo mostrado sem filtros. Mas o mais realístico de tudo são as dificuldades que elas enfrentam.

Aos 25 anos, Hye Ja luta para concretizar o seu sonho de ser jornalista (quer ser apresentadora do noticiário) e ajudar a família. Determinada, alegre e um pouco desmiolada, ela debate se deve abrir mão da carreira em que tanto ela como os pais investiram, mas na qual é muito difícil ter sucesso.

Vem de uma família que passa por dificuldades. A mãe tem um salão de cabeleireiro em casa e trabalha muito, ao ponto de ter as mãos cheias de cales. O pai é taxista, mas ganha pouco. O irmão mais velho, Kim Young Soo, está desempregado e é definição de um falhado.

A vida é difícil, mas há mais quem tenha razões para se queixar. Lee Joon Ha é amigo de um ex-colega de universidade de Hye Ja. Ele também vive no mesmo bairro. Apesar de ser inteligente e bonito, vem de uma família pobre e mata-se a trabalhar para se sustentar. A história de vida dele não é bonita. A mãe abandonou-o e o pai não quer saber dele. Foi criado pela avó com muitas dificuldades. O seu sonho é tornar-se num repórter e ele tem todo o potencial para isso, mas a vida não lhe facilita as coisas.

Quando Hye Ja e Joon Ha se conhecem, os dois chocam por serem muito diferentes. É em encontros casuais num bar, onde bebem soju e comem udon, enquanto desabafam sobre os seus medos e sonhos, que acabam por se tornar próximos. Joon Ha sente finalmente que alguém o entende. No seu jeito animado e espontâneo, Hye Ja consola-o e dá-lhe esperanças de um futuro melhor.

Apesar de a vida não sorrir para os nossos protagonistas, recordando-nos que a realidade não é um mar de rosas, também há momentos muito divertidos, principalmente quando aparecem outras personagens. A série retrata de forma cómica a pobreza da família de Hye Ja através do irmão dela. Há uma cena em que ele come ração de cão por causa da sua gula e porque a família deles não pode nem sequer se dar ao luxo de comer o que quiser. Essa cena faz-nos rir, mas não nos deixa esquecer da situação triste que está a ser representada.

Há muitos momentos da série em que somos confrontados com as dificuldades de se ser pobre, como quando os pais de Hye Ja se esforçam para pensar onde mais podem poupar e chegam à conclusão que a única solução é cortar nas despesas essenciais. Isso não é viver, é sobreviver. Mas eles tão dispostos a sacrificarem-se para que não falte nada aos filhos.

A família de Hye Ja é muito unida, daí que sejamos brindados com muitos momentos entre eles.

Ser jovem também é difícil

Embora não seja esse o foco do drama, também é falado aqui na dificuldade de prosseguir os sonhos. Não especificamente das dificuldades para os alcançar, mas nas dificuldades para saber quando é hora de desistir.

Hye Ja e os pais investiram tempo e dinheiro no sonho dela. Para eles, não é só uma questão de felicidade, é principalmente uma questão de sucesso. Quando obter um cargo na televisão, Hye Ja poderá comprar um novo carro ao pai e melhorar a situação da família.

Mas será que é mesmo isso que ela quer? Quando Joo Ha a questiona sobre o porquê de querer ser jornalista, Hye Ja percebe que não sabe o que mais pode fazer da vida. Esse foi o seu sonho durante muito tempo e é difícil largá-lo, ainda mais porque pode ser tarde para começar do zero. E o que lhe resta? Ser cabeleireira como a mãe? Madrugar todos os dias para atender velhas chatas que que se queixam dos preços, mas se for preciso ainda tomam o pequeno-almoço lá? Não é isso que a mãe dela quer, e certamente não foi com essa vida que Hye Ja sonhou.

Depois de se tornar numa velha de 70 anos, Hye Ja é obrigada a desistir dos seus sonhos.

Joon Ha também se vê obrigado a desistir do seu sonho em prol do dinheiro. Com um pai que se for preciso ainda o rouba e a avó debilitada, ele torna-se num jovem revoltado, de olhar morto, que vive apenas porque tem de viver.

Young Soo, o irmão da nossa protagonista, é aquilo a que se pode chamar um verdadeiro idiota. É impossível levá-lo a sério, mas se pensarmos bem a vida dele também é um pouco triste. Ele tenta ganhar a vida a fazer mukbang (é um show no qual alguém transmite um vídeo pela internet ao vivo a comer grandes quantidades de alimentos ou a fazer outros desafios enquanto outras pessoas assistem), sujeitando-se através dessas transmissões a vários tipos de humilhações para ganhar alguns trocos.

Talvez por ele não ter bem a noção da realidade, pareça que ele não sofre, mas eu acho que no fundo ele tem consciência e se ressente. E Hye Ja, apesar de muitas vezes lhe ‘passar a mão pela cabeça’ e até alinhar nos seus esquemas malucos, chega a chamá-lo a atenção para a situação da família.

Esta foi uma das minhas personagens favoritas, não por me identificar com ele, mas porque representa uma grande parte dos jovens — a qual é descriminada pelos mais velhos — que têm dificuldades em se integrar na sociedade e que, ao contrário do que se pensa, se esforçam tal como os outros.

Young Soo é uma personagem que vai ficar na minha memória por algum tempo.

Chegou o Inverno, mas ainda cheira a Verão

O drama espantou muitos por explorar um assunto que é pouco falado: o que acontece quando envelhecemos?

Depois de se tornar velha, Hye Ja vê o seu corpo mudar todos os dias. A cada pôr-do-sol, a cada nascer do sol, fica mais fraca, mais cansada, os ossos tremem, as refeições são antecedidas por uma manada de medicamentos, a visão já não é tão boa e o seu horário de dormir é tal e qual o de uma criança, só que por dentro continua com a mesma energia e garra de uma jovem de 20 e tais anos.

A descriminação de que é alvo também é real. Inclusive as suas amigas, que a adoram e tentam ser compreensivas, tratam-na de forma preconceituosa sem se aperceberem, porque isso já está enraizado nos padrões de falar e pensar das pessoas.

Na história são abordadas uma série de ideias preconcebidas sobre velhos (uso esta palavra como poderia usar outra):

#1 Eles andam devagar e são lentos em tudo apenas porque sim.

#2 Velhos não ligam à aparência porque estão ‘com os pés virados para a cova’

#3 Numa situação de perigo, os velhos podem ser deixados para trás porque já viveram tempo suficiente.

#4 Velhos não têm quaisquer tipos de preocupações, porque… bem eles são velhos.

Hye Ja acredita que o envelhecimento prematuro se deveu à Lei da Troca da Equivalência: ela trocou a sua juventude pela vida do pai. Na perspetiva do expectador, ela troca muito mais que isso — troca a felicidade da família, a saúde e o amor. E, sendo assim, ela fica a perder. Ou talvez não…

O que esta história nos ensina é a viver o presente sem lamentar o passado e a guardarmos com cuidados o nosso tesouro mais precioso — as memórias. Hye Ja faz uma troca injusta, mas isso não a impede de continuar a desfrutar dos bons momentos e de ir visitar vez ou outra as lembranças que outrora que lhe trouxeram felicidade.

“Eles dizem que a vida não é nada mais que um sonho, mas ainda assim eu sou grata pela minha vida. O ar frio e vivo, a doce brisa assim que as flores começam a florescer, e o cheiro do pôr do sol que enche o ar. Cada dia é deslumbrantemente lindo.”

Notas finais

Tentei falar sobre o que era este drama, sem dar spoilers, o que é uma tarefa mais difícil do que parece, porque é quando chegamos aos últimos episódios que percebemos do que The Light in Your Eyes se trata e qual a lição a tirar.

Para ser sincera, houve uma ou duas vezes em que pensei que a história se estava a alongar demais e que não ia dar em nada. Mas no fim valeu tudo a pena. Ri, estive à beira das lágrimas várias vezes e senti raiva em muitas alturas. Ganhei uma nova perspetiva sobre a vida e a morte, e questões como a velhice, a pobreza e a família. Foi muito bom assistir uma série que retrata este tipo de questões e donde podemos tirar ensinamentos tão importantes.

Deixo o trailer em baixo, para terem mais informações sobre o drama.

Se gostaram, deixem feedback :)

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