Crítica — Os Incríveis 2

Lucas Boaventura
Acabou em Pizza
Published in
4 min readJul 5, 2018

Quando estreou, em 2004, “Os Incríveis” fez um sucesso estrondoso — arrecadou mais de 600 milhões de dólares para 92 milhões investidos pela Pixar. Aclamada pela crítica, tornou-se uma das animações de maior relevância na história do cinema, ganhando diversos prêmios, incluindo o Oscar de Melhor Animação em 2005, e marcando uma geração de crianças que passaram a querer ter uma família de super-heróis. Por muito tempo especulou-se por que Brad Bird, criador da história, não fez uma continuação, afinal, é comum que filmes de enorme bilheteria virem franquias (temos como exemplo Toy Story, Shrek, Carros e, recentemente, Meu malvado favorito). O que Brad Bird queria era uma boa história¹.

Assim, 14 anos após a estreia do primeiro filme, chega às salas de cinema sua continuação. Novamente sob comando de Brad Bird, cabeça por trás do também hit Ratatouille, a animação já começa a toda potência: as primeiras cenas são sequência direta do final do primeiro filme. Sem grandes apresentações dos personagens, somos inseridos na dinâmica da família Pêra (ou Parr, no original) já atuando como heróis. Porém, após deixarem o vilão escapar, causando danos ao patrimônio da cidade, a imagem da Família Incrível — e, consequentemente, dos demais super-heróis- é afetada e eles precisam se afastar de suas atividades. Surge então a DEVTECH, uma empresa de tecnologia interessada em “limpar” a imagem pública dos super-heróis, com a condição de que a Mulher-Elástica seja o destaque da iniciativa. Cabe ao Sr. Incrível cuidar das crianças, enquanto lida com a frustração de não estar lutando ao lado da esposa.

© 2018 Disney/Pixar. Todos os direitos reservados.

O grande acerto de Os Incríveis 2 é ser muitas coisas ao mesmo tempo — e todas elas funcionarem. A animação é um filme de super-herói, mas também um filme de ação, com um vilão que tem uma motivação plausível, com dinâmica familiar muito bem trabalhada e, o melhor, destaque para as personagens mulheres. O segundo filme ser direcionado a essas personagens, sobretudo a Mulher-Elástica, reflete justamente o momento em que vivemos e a geração de crianças atual. A mãe salvar o dia é mais do que um mero detalhe e o roteiro explora esse ponto de forma interessante — ainda mais com a recente tendência do entretenimento mainstream se apropriar de movimentos sociais para atrair público e transformá-los em produtos. Aqui, o público é amplo: adultos que irão levar crianças ao cinema, as crianças e os adolescentes e adultos que foram marcados pelo lançamento do primeiro filme. Me refiro à possibilidade desse filme, ao mesmo tempo que atinge novos públicos, conversar com gerações passadas e trazer maior relevância para personagens que antes não tinham tanto enfoque — detalhe que podemos observar no próprio cartaz do primeiro filme, em que vemos a Mulher-Elástica atrás do Sr. Incrível, em destaque na imagem e no filme.

© 2018 Disney/Pixar. Todos os direitos reservados.

Ao inverter os papéis (que, nesse caso, está mais para subverter), o filme dá margem para que se reflita a respeito de várias situações, como porquê as atividades de cuidar da família são atribuídas à mãe. Ela não pode lutar contra o mal sem o marido? Ao ser “deixado de lado”, Sr. Incrível é obrigado a se responsabilizar pelo cuidado dos filhos e da casa, e podemos observar como essa situação mexe com seu ego. Ele sente inveja da esposa porque queria estar lá — assim como no primeiro filme, quando ele trabalhava e a esposa cuidava da casa. Com o bebê da família, Zezé, descobrindo seus poderes, Violeta, a filha adolescente, passando pelas crises da idade e Flecha com dificuldades no aprendizado da matemática, Sr. Incrível aprende a exercer seu papel de tutor, que vai além de ser o patriarca que protege a família.

Protagonista das melhores cenas de ação do filme, a Mulher-Elástica tem forte influência sob a personagem Voyd, com quem divide um momento de trabalho em equipe muito legal. É possível essa personagem se identificar com a Mulher-Elástica não só pelo fato de ambas terem poderes, mas por serem mulheres super-heroínas. A animação também acerta ao apostar em uma antagonista feminina inteligente e engenhosa, além de dar espaço para Violeta mostrar a potência de suas habilidades. O enredo gira em torno e depende dessas mulheres.

Em cartaz nos cinemas.

Destaco ainda a importância do personagem dublado por Samuel L. Jackson, o Gelado. É ele quem apresenta os heróis à DEVTECH e participa ativamente do desfecho, sendo peça-chave para sua resolução. Em termos de representatividade, é energético se enxergar em um personagem de relevância para a trama. Principalmente quando ele não está ali só para cumprir tabela.

Com aprovação de 94% no site de críticas Rotten Tomatoes, Os Incríveis 2 tem tudo para marcar geração, novamente. Já acumula mais de 200 milhões de dólares em bilheteria, tendo estreado há somente duas semanas nos Estados Unidos. Apesar do roteiro reutilizar um pouco da fórmula do primeiro filme, Brad Bird consegue atualizá-lo para conquistar novas gerações, sem esquecer de proporcionar as fortes emoções que construíram a memória afetiva de muitos jovens adultos que eram crianças quando Os Incríveis estreou. Filme pipoca para agradar geral!

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