Capa da revista The Economist aponta Bolsonaro como “A mais nova ameaça da América Latina”

Bolsonaro, um inimigo do Povo

Ernesto
Ácrata
15 min readOct 30, 2018

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AO POVO BRASILEIRO.

Os ventos da má sorte sopram contra nós. Foi eleito um inimigo do povo para a Presidência da República. Jair Bolsonaro coloca a si mesmo na posição de inimigo da classe trabalhadora e, principalmente, da dignidade dessa classe — votou contra a PEC das Domésticas, a favor da Reforma Trabalhista e da Reforma da Previdência. Bolsonaro é um assíduo defensor da odiosa Ditadura Militar, tendo o canalha torturador Brilhante Ustra como uma figura de admiração. Bolsonaro é um inimigo das mulheres, inferiorizando-as tanto em opiniões pessoais como em sua atuação no Congresso Nacional — votou contra o atendimento obrigatório do Sistema Único de Saúde (SUS) a vítimas de estupro (crime que tem mulheres como as principais vítimas) — . Bolsonaro é inimigo da população LGBT, pois ignora e contribui com a estrutura social que humilha e atormenta a dignidade desse grupo — já afirmou que crianças LGBT devem ser espancadas para que mudem de comportamento.

INIMIGO DOS TRABALHADORES:

Jair Bolsonaro assumiu, em sua carreira parlamentar, uma posição repugnante: empregado dos ricos. Falando de forma objetiva, foi essa a imagem que o deputado construiu para si mesmo. Sua atuação no Congresso Nacional é vergonhosa e, mais do que isso, desprezível. Por algum motivo — por ignorância ou mesmo por falha de caráter — o deputado diz que os “trabalhadores” são apenas aquelas pessoas que se esforçam em suas funções (sejam estas quais forem). Isso nada mais é do que uma tentativa de enfraquecer a união da classe trabalhadora. Um patrão, por mais estresse que passe em sua função, não é um trabalhador. Um pedreiro, por exemplo, mesmo que seja preguiçoso, é um trabalhador. Trabalhador é apenas o que vive de salário, isso é, o assalariado, e que usa sua força de trabalho para gerar um valor (em outras palavras, usa seu esforço físico e intelectual para fazer um produto ou executar um serviço). O patrão não vive de salário, vive de lucro. Portanto, quando Bolsonaro fala que defende o “trabalhador”, não se enganem. Ele não defende a classe trabalhadora e sua imunda atuação no Congresso Nacional nos prova isso:

  • Jair Bolsonaro votou contra a PEC das Domésticas — projeto que garante, às empregadas domésticas, os mesmos direitos que as outras classes profissionais do trabalho já possuíam;
  • votou a favor da Reforma Trabalhista — atrocidade imposta pelo igualmente desprezível governo Temer;
  • se absteve da votação da Lei de Terceirização, o que é igualmente absurdo, pois mostrou que o deputado era, no mínimo, indiferente a essa trágica proposta. Seu filho, Eduardo Bolsonaro, também deputado federal, votou a favor;
  • votou a favor da PEC 241 apesar de ter falado contra ela. A PEC 241, ou “PEC do Fim do Mundo”, congela investimentos em saúde, educação, moradia, entre outras, por 20 anos. Em outras palavras, Jair Bolsonaro votou para que Estado brasileiro passasse 20 anos sem aumentar os investimentos nessas áreas. Não é preciso lembrar o quanto um trabalhador pobre sofre com a saúde pública ou como o filho desse mesmo trabalhador sofre com o ensino público, ambas as áreas já deficientes. Essa proposta é uma forma de deixar essas áreas ruins como estão para que o povo apoie privatizações referentes a elas, pois os empresários que seriam beneficiados são aliados dos grupos políticos que a defenderam. O que os políticos e os empresários parecem esquecer de dizer ao povo é que só os ricos podem pagar por serviços privados;

entre outros fatos que expõem a canalhice de Bolsonaro.

INIMIGO DAS MULHERES:

  • Bolsonaro disse, em 2003 e em 2014, que não estupraria a deputada Maria do Rosário (PT-RS) porque ela “não merece”. À primeira vista, para um desavisado,ode parecer uma afirmação válida. “Ele disse que ela não merece ser estuprada. Qual o problema?”, dizem os apoiadores do político. Mas o que, exatamente, ele quis dizer com tal informação? Em entrevista ao jornal Zero Hora, lhe foi perguntado o motivo de a deputada Maria do Rosário “não merecer” ser estuprada. Bolsonaro respondeu da seguinte forma:

“Ela não merece porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece.”

Esse homem está literalmente dizendo, que o empecilho para estuprar Maria do Rosário é acha-la “feia”. Não, Bolsonaro. Maria do Rosário, bem como qualquer outra mulher, não merece ser estuprada porque o estupro é um ato vil de tortura que busca reduzir a vítima a um mero objeto de prazer. Em outras palavras, o estupro é um ato de humilhação e um atentado à dignidade da vítima;

  • Bolsonaro disse, em entrevista à apresentadora Luciana Gimenez, RedeTV!, em 2016, que não empregaria uma mulher com um salário equivalente ao de um homem que exercesse a mesma função porque a mulher pode engravidar. O sujeito repetiu essa afirmação na (já citada) entrevista ao jornal Zero Hora. Ele está expondo, com todas as letras, o seu ódio pela mulher ao afirmar que um fator biológico deve justificar a desigualdade salarial;
  • Bolsonaro se mostra abertamente contrário ao ensino de questões de gênero nas escolas. O deputado afirma que esse tipo de assunto viria a “desvirtuar” crianças ou, de alguma forma, servir como “doutrinação” para que os jovens “virassem” homossexuais, bissexuais ou transgêneros. Bolsonaro gosta, inclusive, de citar o projeto de lei Escola Sem Homofobia para basear essa ideia (esse projeto de lei será melhor explicado daqui a pouco). O que ele não diz é que a violência do homem contra a mulher nasce de toda uma estrutura social de gênero: o homem é educado pela sociedade para ser um indivíduo forte, viril, controlador. A mulher, por outro lado, é educada pela sociedade para ser submissa, frágil, dependente do homem. É essa estrutura que permite ao homem a ideia de que ele pode, sempre, se colocar acima de uma mulher. É essa ideia que permite a violência doméstica contra a mulher, o assassinato de uma mulher por seu marido e, mesmo, o estupro. O estupro é, como já citado, um ato de tortura no qual o agressor busca reduzir a vítima a um mero objeto de prazer. Assim, quando Bolsonaro propõe que não se fale de gênero em escolas ele está, simplesmente, propondo que essa estrutura violenta não seja discutida. Ele propõe que as meninas continuem chegando à vida adulta sem que entendam a opressão de gênero e, portanto, sem que possam lutar contra ela. Bolsonaro afirma que uma mulher armada tem maior chance de se defender de um estuprador. Ele, porém, ignora que o armamento civil — e me refiro, especificamente, ao porte de arma — apenas vai garantir que o estuprador possa, também, ter direito a uma arma.

“Ah, mas o estuprador não passaria nos testes psicológicos necessários pois ele é doente”

Ao contrário do que se diz, o estuprador não é exatamente uma pessoa doente. Quando se afirma que é, está se dizendo que o prazer sexual no ato de forçar dor à mulher nasce, meramente, de problemas psiquiátricos ou neurológicos. Ignora-se completamente o fator social, a forma como o homem é educado pela sociedade. Não estou dizendo que o estuprador é uma “vítima da sociedade”, como alguns gostam de ironizar. Estou dizendo que o prazer do agressor no ato do estupro nasce da socialização dada ao homem e não, necessariamente, em problemas mentais. O estuprador nem sempre seria “barrado” em testes psicológicos para a compra de uma arma.

Assim, com o armamento civil, o estuprador poderia, da mesma forma que a mulher, comprar uma arma. Não está certo supor que o estuprador, ao se preparar para atacar uma mulher, uma vez que estivesse armado e considerasse que a mulher também estivesse armada, apenas seria mais sorrateiro e violento durante a abordagem a ela? A mulher não teria maiores chances de se defender pois o agressor já estaria preparado para uma defesa armada dela.

Não digo que a educação é a única forma de combater a violência contra a mulher. Digo que é uma ferramenta importante e que Bolsonaro, ao amedrontar a população com o ensino de relações de gênero em escolas, está tentando impedir que a juventude tenha acesso a esse conhecimento.

INIMIGO DOS NEGROS:

Antes de iniciar a lista, reitero que o racismo de Bolsonaro — bem como seu machismo — possui um recorte de classe: é ódio voltado principalmente aos negros e mulheres pobres. Gostaria de lembrar, também, que quando o chamamos de “inimigo dos negros” não estamos dizendo que cada indivíduo negro vai, pessoalmente, se sentir ofendido ou, de alguma forma, incomodado por esse discurso (embora devesse, pois tal discurso é absurdo). Dizemos, apenas, que esse discurso prejudica os negros enquanto grupo social, isso é, de forma coletiva — embora sejam os negros pobres os mais atingidos.

  • Em 2011, durante entrevista ao programa CQC, após ser perguntado pela cantora Preta Gil o que faria caso um filho dele se apaixonasse por uma mulher negra, Bolsonaro disse:

“Preta, eu não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco. Meus filhos foram muito bem educados e não viveram em ambiente como lamentavelmente é o teu”

É repugnante que um indivíduo como esse tenha alcançado o 1º lugar na corrida presidencial. Ele, ao responder dessa forma à Preta Gil, fez uso de um estereótipo já conhecido no Brasil: o da mulher negra como promíscua. A ideia da mulher negra como um mero objeto de prazer — que, sim, foi a ideia que Bolsonaro passou com essa fala — remonta à época da escravidão dos negros na América. Como bem explicou a historiadora Suzane Jardim, em seu texto “Reconhecendo estereótipos na mídia norte-americana”:

“[…] tinha toda uma imagem da boa mulher e basicamente ela era europeia e cristã — fim. Até que um dia europeus entraram em contato com mulheres africanas e atribuíram aquela semi nudez usada nos trópicos à promiscuidade. […] obviamente as mulheres negras só podiam ter uma luxuria incontrolável e ainda por cima eram pagãs, logo, não deviam ter moral nenhuma — igual a Jezebel. […] Basicamente o grande impacto desse estereótipo foi o de que ele foi responsável por justificar o estupro e abuso sexual cometido a mulheres negras, afinal, seria ‘impossível estuprar mulheres tão promíscuas’.”

Em outras palavras, os europeus, no início do processo de escravidão dos negros africanos (processo em que estes foram arrancados à força de seus lares e separados de suas famílias) atribuíram toda uma ideia de “vulgaridade sexual” e promiscuidade às mulheres negras. Pelo fato de que os povos africanos, na época, eram todos não-cristãos, os europeus consideravam que eles eram moralmente inferiores. Assim, eles viam uma mulher negra, à qual julgavam vulgar e imoral, e logo se achavam no direito de usá-la como mero objeto sexual. Tem início, assim, os estupros de senhores de escravos contra mulheres negras escravizadas, por exemplo.

Ao atribuir a imagem geral da mulher negra à promiscuidade, Bolsonaro volta à época da escravidão e tenta passar a mesma ideia que “justificou” inúmeros estupros e torturas, bem como toda a consequência social que essa estrutura racista — e machista — traz às mulheres negras até hoje;

  • em entrevista ao programa Roda Viva, em 30 de julho deste ano, Bolsonaro disse:

“Se for ver a história realmente, os portugueses nem pisavam na África. Foram os próprios negros que entregavam os escravos (…) faziam o tráfico, mas não caçavam os negros. Eram entregues pelos próprios negros”

Primeiro, explicarei a intenção dessa fala: Bolsonaro tenta, com isso, trazer à tona uma pseudoteoria que busca igualar a escravidão praticada pelos povos africanos à escravidão de africanos praticada pelos europeus. Na época, na África, bem como em todo o resto do mundo — inclusive na Europa — , era praticada a escravidão. Tinha, porém, outra estrutura material: uma pessoa poderia ser escravizada por dívidas ou em batalha que seu grupo fosse derrotado. Não se baseava em ideias de superioridade racial ou biológica, como a escravidão praticada pelos europeus. Os europeus criaram todo um pensamento que tentava mostrar a inferioridade dos povos africanos (usavam tanto argumentos pseudocientíficos, como uma suposta desvantagem intelectual dos negros, quanto argumentos religiosos, como a ideia de que negros eram inferiores por serem “pagãos” e, portanto, não terem alma). Diziam que, por essa suposta inferioridade, os povos africanos poderiam ser escravizados. Assim, Bolsonaro mostra que não entende o estudo da História (por não saber interpretar o período em questão), da Sociologia (por não saber diferenciar estruturas de opressão com suas respectivas manifestações materiais) e muito menos de empatia com o próximo (o que é irônico para quem diz seguir a Jesus Cristo);

  • Bolsonaro tem um odioso discurso contra os quilombolas e gosta de manifestá-lo sempre que pode. Disse, em abril de 2017, durante discurso no Clube Hebraica:

“Eu fui num quilombola (sic) em Eldorado paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem pra procriador ele serve mais. Mais de 1 bilhão de reais por ano é gastado (sic) com eles.”

Disse, também, durante o mesmo evento:

“Pode ter certeza que se eu chegar lá [presidência da República] não vai ter dinheiro pra ONG. Se depender de mim, todo cidadão vai ter uma arma de fogo dentro de casa. Não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou pra quilombola.”

Certo, já entendemos que Bolsonaro não gosta de quilombolas. Vamos entender melhor o que está por trás dessa ideia que orgulha tanto ao sujeito. Bolsonaro tem uma forte ligação com o agronegócio (aquele setor controlado por canalhas latifundiários que matam indígenas, ambientalistas e trabalhadores rurais) e, sempre que possível, ambas as partes gostam de reafirmar essa ligação. Como disse a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (o braço legislativo do latifúndio):

“Há duas semanas, os produtores rurais vêm conversando com seus deputados para declarar apoio ao Bolsonaro. Hoje, a maior parte dos nossos parlamentares [que formam a Frente Parlamentar da Agropecuária] está com Bolsonaro.”

O ódio de Bolsonaro aos quilombolas vem, aliás, da mesma fonte que origina seu ódio aos indígenas. A Comissão Pró-Índio de São Paulo afirma, em levantamento, que há cerca de 3.000 quilombos no Brasil e, pelo menos, 1674 processos de titulação de terras, isso é, processos para garantir, oficialmente, a posse dos territórios quilombolas às respectivas comunidades que as habitam. Até hoje, no entanto, apenas 169 territórios foram titulados.

Bolsonaro, como árduo defensor do latifúndio e dos latifundiários, trava uma batalha de classe contra os quilombolas e os indígenas porque tem interesse em acabar com a demarcação de terras a tais grupos para que essas terras fiquem livres para o agronegócio e as grandes mineradoras. Não é coincidência que a bancada ruralista tenha dado apoio em massa a Bolsonaro durante essas eleições? Não é coincidência o fato de uma das principais forças parlamentares de sua rede de apoiadores poder ser diretamente beneficiada com o fim da demarcação de terras para quilombolas e indígenas?

“Ah, mas essas terras indígenas e quilombolas têm muitas riquezas minerais que poderiam melhorar a economia brasileira”

Defina “melhorar a economia”. Eu não tenho dúvidas de que o agronegócio cresceria muito com o fim da demarcação a comunidades quilombolas e territórios indígenas. Agora quando se fala de melhores condições socioeconômicas para o povo brasileiro, a questão é diferente. A ideia de que nós devemos “fazer o bolo crescer para depois reparti-lo” é simplesmente risível. Essa cômica farsa liberal ignora que o principal objetivo a mover o modelo capitalista é a eterna busca por lucro. Ao patrão, pouco importam as condições às quais está submetida a classe trabalhadora, prova disso é a própria existência da desigualdade social. Não basta dizer que os ganhos financeiros do empresariado serão repartidos espontaneamente, precisa haver uma redistribuição desses ganhos à sociedade (em especial à classe pobre, que é a mais necessitada). Quando, seja em trecho de seu programa de governo ou em qualquer outra fala, Bolsonaro propõe uma redistribuição de riquezas para enfraquecer a desigualdade social? Ao propor acabar com a demarcação de territórios indígenas e quilombolas para que o empresariado possa explorar as riquezas minerais de tais terras, Bolsonaro está, apenas, propondo usar o Estado para reafirmar seu próprio papel de fantoche dos ricos. A aceitação desse papel o coloca na posição de inimigo do povo.

INIMIGO DOS LGBT:

Por último, mas não menos importante, o carro chefe de Jair Bolsonaro.

  • Bolsonaro gosta de amedrontar a população com “denúncias” de um suposto projeto de lei que chama de “Kit Gay”. O projeto ao qual ele se refere é o Escola Sem Homofobia. Elaborado pelo Ministério da Educação, em 2011, o projeto nada mais é do que um material didático que seria veiculado às escolas para debater relações de gênero e sexualidade. À época, Bolsonaro afirmou que o “kit gay” incentivava o “homossexualismo” e a “promiscuidade” e que tornava as crianças “presas fáceis para pedófilos”.

O que Bolsonaro não fala, porém, é que o projeto Escola sem Homofobia é um material didático composto por um guia de orientação destinado aos professores e três vídeos que ilustram a forma como o machismo e o ódio a homossexuais, bissexuais e transgêneros afetam crianças. O livro “Aparelho Sexual e Cia”, de acordo com Bolsonaro em entrevista à Rede Globo, 28 de agosto de 2018, seria parte do material proposto pelo projeto Escola Sem Homofobia e exibiria trechos de sexo explícito a crianças. O livro, porém, não estava incluso no projeto. Não está no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) (ou seja, as escolas não passam para alunos) nem no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE) (ou seja, não está nas bibliotecas das escolas). O Ministério da Educação, em 2013 e, novamente, em 2015, explicou que o livro em questão não faz parte do projeto Escola Sem Homofobia. Bolsonaro ainda não conseguiu provar que esse livro foi distribuído em escolas e, mesmo assim, pessoas ouvem essas palavras e acreditam nelas.

Ele não fala que, como já foi dito no tópico sobre mulheres, a estrutura de gênero tem todo um caráter de dominação às mulheres e que nasce, dessa estrutura, o ódio a quaisquer indivíduos que saiam dessa regra. Homem tem que gostar de mulher, comer carne e beber cerveja, além de ter modos grosseiros. Mulher tem que gostar de homem, usar roupas rosas e lavar louça. O ódio aos homens homossexuais e bissexuais, por exemplo, nasce da ideia de que é degradante para um homem ter um comportamento “igual ao de uma mulher” (seja esse um comportamento “afeminado” ou o próprio comportamento passivo no sexo). Tanto é que até o século 19 era consenso mundial a ideia de que a atração sexual de uma pessoa por outra do mesmo gênero era meramente comportamental, isso é, considerava-se que ela apenas escolhia se sentir dessa forma e não que era uma atração natural da pessoa.

Então quando Bolsonaro diz:

“O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro, ele muda o comportamento dele. Olha, eu vejo muita gente por aí dizendo: ainda bem que eu levei umas palmadas, meu pai me ensinou a ser homem.”

Na verdade, ele está literalmente repetindo uma ideia que começou a ser repensada no início do século passado. Ao afirmar isso, Bolsonaro encoraja pais a espancarem seus filhos homossexuais, bissexuais ou transgêneros. Inclusive, essa “mudança de comportamento” à qual o deputado se refere não existe. O indivíduo gay pode, no máximo, reprimir a si mesmo e fingir ser alguém que ele não é. O homem gay pode se reprimir e casar com uma mulher, viver um casamento infeliz e sempre esconder seu verdadeiro eu do mundo. Isso pode leva-lo a complicações psicológicas e, muitas vezes, ao suicídio. Nas palavras do psiquiatra galês Dean Burnett:

“[…]quem sabe [a homossexualidade] seja um ‘estilo de vida’, como muitos insistem? Isso sugere que aqueles que estão prestes a escolher sua orientação sexual analisam as consequências da homossexualidade e consideram esta a melhor opção. Eles veem a opressão, as taxas de suicídio, a discriminação e as agressões, a desigualdade, o risco maior de problemas de saúde mental, ou o abandono da família; eles pesam isso tudo e pensam “quero um desse!’. Parece improvável, para ser educado.”

É muito comum pessoas se esquivarem da fama de homofóbicos dizendo “eu não acho que a homossexualidade seja uma doença, acho que é um comportamento aprendido”. A pessoa diz que o desejo afetivo e sexual por alguém do mesmo sexo pode ser influenciado pelo ambiente em que se vive. Esta é, aliás, uma ideia usada para impedir casais homoafetivos do direito à adoção. “As crianças verão isso e também serão homossexuais”, dizem alguns. Ignoram que só podem chamar de comportamental aquilo que de fato está ligado ao comportamento. Se dissessem que o comportamento afeminado em homens é algo aprendido, faria mais sentido. Estaria igualmente errado, mas seria um “engano compreensível”, já que se estaria falando de um traço comportamental. Atração afetiva/sexual, no entanto, é algo que está além do comportamento. Um homem pode “aprender” a ter um comportamento afeminado — embora muitos setores da sociedade sejam extremamente homofóbicos e a homossexualidade não seja encorajada como a heterossexualidade — mas não pode aprender (ou se forçar) a sentir a atração física por outro homem. Mesmo que forçasse em si mesmo um desejo assim, não seria real e o homem não conseguiria mantê-lo.

Conclusão:

Encerro este texto dizendo que Jair Bolsonaro é um perfeito exemplo de canalha. Um homem que tem ideias do século 19 mas age como uma criança, além de ter baseado toda sua carreira política em atuar contra o povo. Atua contra os pobres, contra as mulheres, contra os negros, os indígenas e os LGBT. Não tem outros interesses além de defender os ricos que o controlam. Eu, no entanto, não julgo os pobres, as mulheres, os negros, os indígenas e os LGBT que o apoiam. Eu sei que o Brasil não é um país fácil de se viver e que nós esperamos ansiosamente por um país melhor. Nós já sofremos demais, principalmente os grupos citados. Mas, por favor, não se deixem enganar. Bolsonaro se apresenta como o salvador da pátria, mas é mentira. Uma única pessoa não pode salvar o país, principalmente se essa pessoa for basear seu governo nos interesses dos carrascos que, historicamente, exploram o povo brasileiro. Este merece mais do que isso. A mulher quer andar na rua sem medo de estupro. O negro e o indígena querem andar na rua sem medo da violência racista. Os homossexuais, bissexuais e transgêneros querem andar na rua sem medo da violência homo/transfóbica. O pobre quer dormir sabendo que, no dia seguinte, terá comida no prato. O povo merece um país melhor e o terá.

Até a vitória, sempre!

Brasil, 28 de outubro de 2018.

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