“Não deve haver separação entre o objetivo revolucionário e o processo revolucionário.” — Murray Bookchin
Um dos conceitos centrais no anarquismo é a ação direta. Mas o que é a ação direta?
É comum o termo “ação direta” ser entendido como sinônimo de “ação violenta”. Mas, embora hajam anarquistas favoráveis a ações violentas, isso não representa todo o significado do termo.
A ação direta é uma forma de Práxis. Práxis significa praticar a teoria. Não apenas teorizar sobre os males do capitalismo e sobre a organização anarquista, mas tentar iniciar pequenas células da sociedade que desejamos ainda na sociedade atual, com o objetivo de plantar as bases daquilo que irá a derrubar.
Como o autor anarquista David Graeber a define, ação direta significa agir e resolver seus problemas sem recorrer à autorização ou à ajuda do governo ou do setor privado. “Direto” significa sem mediadores. Um ato de ação direta é todo aquele em que um grupo de pessoas, uma vizinhança ou uma comunidade se organiza de forma horizontal e autônoma para tratar diretamente daquilo que os envolve.
A ação direta é preferível a outras formas de ação política, como o voto ou a filiação a partidos, porque reflete diretamente a vontade daqueles que decidem participar nela. Os candidatos e líderes de partidos não têm os mesmos interesses que o povo, nem mesmo seus eleitores, pois o maior objetivo de um partido político é chegar ao poder, e buscar se manter nele. Assim, é comum lideranças partidárias fazerem alianças com aqueles que estão no poder ou podem ajudá-los a chegar nele, como partidos de “esquerda” que fazem alianças com grandes empresas e partidos que, em teoria, possuem viés ideológico oposto ao seu. Assim, aqueles que estão na base da organização têm suas visões e reivindicações ignoradas em nome do que será melhor para as lideranças dos partidos. A própria forma hierárquica e burocrática com que essas organizações são estruturadas impedem ou dificultam com que aqueles que estão na base possam se pronunciar, reduzindo-os ao papel de observadores passivos e de “eleitores”.
O anarquismo, com sua ênfase na autonomia e na Práxis, coloca uma ênfase na ação direta como ação política fundamental.
Se a ação direta é resolver seus próprios problemas sem mediação das forças do estado e do setor privado, então ele é essencialmente uma ação popular e coletiva.
Em Londres, acontecia uma crise de moradia, e muitas pessoas passaram a dormir nas ruas. Então um grupo de anarquistas da cidade ocupou uma mansão vazia e a transformou em um abrigo.
Mas a ação direta não é praticada somente por anarquistas. Aqui mesmo no Brasil, cansados de esperar que a prefeitura cumprisse sua promessa e construísse uma ponte ligando dois bairros em Barra Mansa, no Rio de Janeiro, os próprios moradores se mobilizaram e construíram uma ponte, com um orçamento muito menor que aquele estimado pela prefeitura.
Mas, para os anarquistas, além da própria ação em si, a ação direta é um ato de transformação política, pois ele é uma manifestação do conceito de autonomia coletiva. A ação direta dá poder para aqueles que tomam parte nela. Através da ação direta, da organização horizontal e da ação política sem a necessidade de partidos e outras instituições, se criam as bases da transformação social.
A apatia política e a adesão ao discurso de políticos populistas cresce conforme a desilusão com o status quo aumenta, mas não são vistas alternativas a esse sistema ou esperanças de mudança social. O que a ação direta mostra, para aqueles que nela participam, é que através da ação coletiva e popular se pode mudar a realidade política e social da atualidade.
Toda ação política direta que seja tomada no espírito da autonomia e da horizontalidade é também uma ação de propaganda anarquista, e ela é a forma mais efetiva de propaganda, porque ela mexe diretamente com as vidas e as condições das pessoas. Não é preciso ter lido Bakunin ou Proudhon para entender como agir diretamente sobre suas condições é melhor que depender de burocratas ou capitalistas do topo da pirâmide social, assim como não é preciso ter lido Marx para entender os efeitos positivos da ação cooperativa ou da agricultura sustentável.
A ação direta é, fundamentalmente, uma subversão da ordem natural do capitalismo, e uma busca de já iniciar as bases de uma sociedade mais justa. Trabalhadores ocupando fábricas em protesto por salários ou condições de trabalho melhores, iniciar uma cooperativa em alternativa às empresas tradicionais, o deface de imagens corporativas que quebram a hipnose subliminar do nível abusivo de propagandas. Todos são formas de ação direta, e que também podem servir de propaganda. Distribua literatura socialista em uma biblioteca compartilhada.
Mas o que a ação direta, em seu nível base, a organização autônoma e horizontal de pessoas comuns para a ação social, é que, mesmo com nosso atual sistema sócio-econômico estando falido, existem alternativas mais justas e melhores a ele.
