Adoção necessária: a chance de um lar para crianças maiores

Yasmin de Freitas
Adotar
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5 min readFeb 5, 2018
Foto via StockSnap.io

Segundo dados do Cadastro Nacional da Adoção (CNA), a maior quantidade de crianças e adolescentes disponíveis para adoção está concentrada na faixa etária de 6 a 17 anos. Esse perfil, no entanto, não corresponde ao mais desejado. A prova disso é que mais de 50% dos 39.957 pretendentes cadastrados têm preferência por crianças de até três anos.

A adoção de crianças com mais de três anos e adolescentes era conhecida como adoção tardia, mas atualmente tem se utilizado cada vez menos essa denominação, substituindo-a por outra: adoção necessária. Ela recebe este nome, pois compreende, além de crianças maiores e adolescentes, a adoção de grupos de irmãos e crianças/adolescentes com problemas de saúde. Em geral, são crianças que estão há muitos anos vivendo nas instituições de acolhimento, sendo privadas do seu direito de convivência familiar e comunitária e se tornando, em muitos casos, invisíveis para a sociedade.

Embora nos últimos anos tenha crescido o número de adoções necessárias, ainda há uma discrepância entre o perfil desejado e o presente nos abrigos. Parte da dificuldade desse grupo ser adotado está no fato de que crianças mais velhas — principalmente adolescentes — são vistos como um desafio. Aqueles que desejam adotar esse perfil recebem uma criança que, em razão de sua idade, já possui uma maior autonomia e traz consigo uma história que, normalmente, é marcada pelo abandono ou pelo contato com situações violentas, de abuso e violação de seus direitos enquanto criança.

Célia Vieira, psicóloga e presidente do Projeto Acalanto Sergipe, lembra, também, que os pais terminam passando por alguns “testes”, pois os filhos precisam estar seguros de que não sofrerão mais um abandono. “Trata-se de uma questão psicológica, um mecanismo de defesa, em que as crianças e os adolescentes não se permitem vincular afetivamente logo no início. Além disso, episódios de birra e mau comportamento são comuns, como uma busca de confirmação que terão um amor incondicional por parte dos pais”, explica.

Estímulo à adoção necessária

Devido a essas estatísticas e a todos os receios que envolvem a adoção de crianças maiores, em todo o Brasil, tem se visto uma mobilização com o intuito de não só tornar essas crianças mais visíveis, como também de sensibilizar os pretendentes a respeito da ampliação de seus perfis. As Varas e Coordenadorias da Infância e da Juventude, bem como os grupos de apoio, têm se unido e promovido campanhas, elaborado projetos e buscado o diálogo com os pretendentes.

Entre estas ações, podemos destacar a promovida pela 16ª Vara da Infância e da Juventude de Aracaju (SE), chamada “Adoção: deixa crescer o amor”. A ação tem como objetivo estimular, conscientizar e preparar as pessoas para a adoção, principalmente, a necessária. Somado a ela, também há outra campanha desenvolvida pela Vara, com o objetivo de efetivar os direitos da infância e juventude não só no nosso Estado, mas também no país. A campanha com título “Criança e adolescente prioridade absoluta, vista essa camisa!”, começou em Sergipe, mas conseguiu alcançar o Supremo Tribunal Federal (STF). Vários juízes, presidentes de associações e parlamentares vestiram a camisa.

A Coordenadoria da Infância e da Juventude de Sergipe também tem realizado ações, como o Projeto Encontros. Com a primeira edição realizada em maio de 2017, o projeto tem como objetivo reunir, em uma tarde de lazer, as crianças e os adolescentes que atualmente se encontram nos abrigos (estando disponíveis para adoção ou não) e os pretendentes. Este encontro, além de garantir o convívio em comunidade destas crianças, também contribui para a ampliação do perfil de muitos candidatos.

Além disso, a mídia também tem ajudado nessa sensibilização dos pretendentes. Os casos de artistas que adotaram crianças mais velhas e grupos de irmãos, segundo a juíza titular da Vara da Infância de Aracaju, além de servirem como exemplos bem sucedidos, têm contribuído para que mais pessoas se abram para esse tipo de adoção. O mesmo efeito tem sido alcançado pelas campanhas de times de futebol como Sport Club do Recife e Cruzeiro — a “Adote um Pequeno Torcedor” do time recifense e o projeto “Adote um Campeão”, do time mineiro — que buscam não só fazer uma reflexão sobre a adoção necessária, como despertar o interesse daqueles que querem ser pais para a possibilidade de adotar uma criança com mais de sete anos.

Ações bem sucedidas

Felizmente, estas ações têm tido bons resultados. A juíza da 16ª Vara da Infância e da Juventude de Aracaju (SE), Rosa Geane Nascimento, aponta para uma mudança em relação a isso. Juíza titular da Vara desde 2009, a magistrada tem visto uma mudança de paradigma quando o assunto é adoção necessária. Satisfeita com o resultado, conta que já realizou adoções de crianças mais velhas, com faixa etária acima de 10 anos, de ambos os sexos e algumas delas com uma característica importante: além da idade mais avançada, o adolescente possuía problemas de saúde.

Mas é importante destacar que devido as particularidades desta adoção, os processos costumam ter um acompanhamento maior. A magistrada relata que em muitos casos, optam por estender o estágio de convivência, ou seja, o período de adaptação, acompanhado por uma equipe da Vara, que antecede a adoção definitiva. Assim, o prazo — que normalmente é de 30 dias — acaba sendo prorrogado para 60 e, havendo necessidade, até por mais tempo.

Célia Vieira, presidente do único grupo de apoio à adoção do estado, também destaca uma ampliação no perfil dos pretendentes. O aumento de adoções de crianças maiores e de grupos de irmãos foi considerado tão significativo, que viram a necessidade de criar um grupo de pós-adoção, formado por pais que estão em período de convivência ou já com a guarda de crianças maiores ou adolescentes. “Esse grupo se relaciona via Whatsapp e mensalmente, por meio de um encontro presencial. Refletimos sobre questões relacionadas à adoção, são compartilhadas dúvidas, dificuldades e experiências que os pais vivenciam no cotidiano. Percebemos que esse grupo tem sido de extrema importância nesse processo de adaptação com os novos membros da família”, conta.

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