Após 40 anos, um encontro com quem lhe deu a vida
Karina Muhlert Drummond, 41, desde os seus três anos de idade sabia que era adotada. Sua mãe adotiva sempre lhe dizia que ela era filha do coração e não da barriga, porque esta foi a maneira mais adequada e indicada por psicólogos para contar a filha sobre sua história. Mas apesar de lidar muito bem com o fato de ser filha adotiva, ela sempre sentiu um vazio, como se a sua história estivesse incompleta, faltando uma informação para que pudesse compreendê-la melhor e sabia que isso só passaria quando tivesse algumas respostas, principalmente a respeito de sua adoção. “Partiu de mim a necessidade em conhecer, pois sentia um vazio e buscava respostas sobre como tinha sido gerada e porque tinha sido doada”, conta.
Seus pais adotivos, embora preferissem manter a adoção em segredo, não esconderam da filha a sua história. O que foi contado para Karina é de que sua mãe adotiva estava passando pela rua e ouviu uma senhora comentar que não tinha condições de criar a criança e por isso iria entregá-la. Ao ouvir essa história, sua mãe disse que uma de sua irmãs — que veio a se tornar madrinha de Karina — , tinha interesse em adotar. E desde então começou a dar assistência àquela moça que entregaria a sua filha em adoção, acompanhando-a no pré-natal.
A procura
Assim como Karina, vários filhos adotivos têm buscado encontrar seus pais biológicos e muitos deles têm recorrido a páginas em sites de redes sociais ou grupos fechados. E este foi o caminho seguido pela líder comunitária quando, após perder sua mãe adotiva, decidiu dar a início a essa busca. O meio escolhido foram as mídias sociais, mas essa escolha não foi por acaso. Ativista social, ao perceber que suas publicações nas mídias sociais tinham sempre um bom alcance, começou a se questionar se estas também não seriam eficazes na sua busca por sua mãe biológica. E por isso decidiu que iniciaria sua procura através do Twitter e do Facebook.
No início de sua busca, ela tinha algumas informações: sabia que tinha nascido na cidade de Recife (PE), a data e horário de seu nascimento, a maternidade em que nasceu e um provável nome da sua mãe, Maria de Fátima. Reuniu essas informações em uma montagem — que também tinha uma foto sua e seu número de telefone — e divulgou em suas redes sociais e em alguns grupos, inclusive de Recife, juntamente com a seguinte frase: “Procuro quem não me abortou! #DigaNaoAoAborto”. E o resultado veio algum tempo depois.
O encontro
Quando finalmente localizou dona Maria de Fátima, sua família a apoiou na decisão de encontrá-la. O encontro aconteceu em 2017, em Recife, e nesse dia estavam presentes alguns de seus familiares, como a sua madrinha e um primo. Esse primeiro contato foi marcado por muita emoção, misturada com uma sensação de um peso retirado das costas. Por diversas vezes sua genitora lhe pediu perdão, mas, na verdade, tudo o que Karina mais desejava era demonstrar gratidão a aquela mulher que, como ela dizia nas postagens, não a abortou e ainda a teve o cuidado de lhe entregar para uma família que a criou com muito amor.
Junto de sua mãe, Karina sanou todas as dúvidas que tinha sobre o ato da entrega e até mesmo sobre de onde ela veio. Também teve a oportunidade de saber um pouco mais sobre a sua mãe e os motivos que fizeram com que ela entregasse sua filha. Maria de Fátima é filha de pais desconhecidos, foi entregue a um orfanato e vivia de favor na casa de algumas pessoas, trabalhando como empregada doméstica. Por se encontrar nesta situação e pelo pai ter se recusado a assumir a responsabilidade, ela temeu que as duas tivessem que viver na rua, então não lhe restou outra saída além de entregar sua criança a uma família que pudesse lhe dar um futuro melhor.
Aquele encontro também foi uma oportunidade de se conhecerem melhor. Dona Maria de Fátima soube que tem três netos e Karina conheceu suas duas irmãs, com as quais, além da sua mãe, mantém contato ultimamente. “Estou tendo contato, porém com cautela e sempre com muito pé no chão para não magoar ninguém e não sair magoada”.
A mãe e a filha não fizeram um teste de DNA. O fato de sua madrinha, para quem Maria de Fátima entregou a criança logo após o seu nascimento, ter reconhecido rapidamente aquela mulher tornou o teste desnecessário, Karina estava mesmo diante daquela que lhe deu a vida.
Amor pelos pais adotivos
A mãe adotiva de Karina Drummond, enquanto ainda era vivia, temia o reencontro entre sua filha e a mãe biológica. Mas este não é medo apenas dela e sim de vários pais adotivos. Muitos acabam por esconder a adoção porque temem ser abandonados quando seus filhos conhecem sua família biológica ou que gostem mais da outra mãe.
No entanto, a líder comunitária é a prova de que isso se trata apenas de fantasias dos pais adotivos. Após ter tido o contato com sua mãe, Karina não só incentiva os filhos adotivos a conhecerem sua origem, mas também tranquiliza estes pais ao dizer que o sentimento que tem por seus pais adotivos, principalmente sua mãe, só aumentou após ter conhecido sua genitora. “Hoje eu amo muito mais a minha mãe adotiva do que eu amava antes”, confessa.