Após 40 anos, um encontro com quem lhe deu a vida

Yasmin de Freitas
Adotar
Published in
4 min readFeb 17, 2018

Karina Muhlert Drummond, 41, desde os seus três anos de idade sabia que era adotada. Sua mãe adotiva sempre lhe dizia que ela era filha do coração e não da barriga, porque esta foi a maneira mais adequada e indicada por psicólogos para contar a filha sobre sua história. Mas apesar de lidar muito bem com o fato de ser filha adotiva, ela sempre sentiu um vazio, como se a sua história estivesse incompleta, faltando uma informação para que pudesse compreendê-la melhor e sabia que isso só passaria quando tivesse algumas respostas, principalmente a respeito de sua adoção. “Partiu de mim a necessidade em conhecer, pois sentia um vazio e buscava respostas sobre como tinha sido gerada e porque tinha sido doada”, conta.

Seus pais adotivos, embora preferissem manter a adoção em segredo, não esconderam da filha a sua história. O que foi contado para Karina é de que sua mãe adotiva estava passando pela rua e ouviu uma senhora comentar que não tinha condições de criar a criança e por isso iria entregá-la. Ao ouvir essa história, sua mãe disse que uma de sua irmãs — que veio a se tornar madrinha de Karina — , tinha interesse em adotar. E desde então começou a dar assistência àquela moça que entregaria a sua filha em adoção, acompanhando-a no pré-natal.

A procura

Assim como Karina, vários filhos adotivos têm buscado encontrar seus pais biológicos e muitos deles têm recorrido a páginas em sites de redes sociais ou grupos fechados. E este foi o caminho seguido pela líder comunitária quando, após perder sua mãe adotiva, decidiu dar a início a essa busca. O meio escolhido foram as mídias sociais, mas essa escolha não foi por acaso. Ativista social, ao perceber que suas publicações nas mídias sociais tinham sempre um bom alcance, começou a se questionar se estas também não seriam eficazes na sua busca por sua mãe biológica. E por isso decidiu que iniciaria sua procura através do Twitter e do Facebook.

No início de sua busca, ela tinha algumas informações: sabia que tinha nascido na cidade de Recife (PE), a data e horário de seu nascimento, a maternidade em que nasceu e um provável nome da sua mãe, Maria de Fátima. Reuniu essas informações em uma montagem — que também tinha uma foto sua e seu número de telefone — e divulgou em suas redes sociais e em alguns grupos, inclusive de Recife, juntamente com a seguinte frase: “Procuro quem não me abortou! #DigaNaoAoAborto”. E o resultado veio algum tempo depois.

O encontro das famílias biológica e adotiva. Karina (de blazer verde) com sua mãe biológica, o esposo de dona Maria de Fátima, suas duas irmãs por parte de mãe e sua tia/madrinha que a pegou na maternidade e entregou para mãe adotiva. Créditos: Acervo Pessoal

O encontro

Quando finalmente localizou dona Maria de Fátima, sua família a apoiou na decisão de encontrá-la. O encontro aconteceu em 2017, em Recife, e nesse dia estavam presentes alguns de seus familiares, como a sua madrinha e um primo. Esse primeiro contato foi marcado por muita emoção, misturada com uma sensação de um peso retirado das costas. Por diversas vezes sua genitora lhe pediu perdão, mas, na verdade, tudo o que Karina mais desejava era demonstrar gratidão a aquela mulher que, como ela dizia nas postagens, não a abortou e ainda a teve o cuidado de lhe entregar para uma família que a criou com muito amor.

Junto de sua mãe, Karina sanou todas as dúvidas que tinha sobre o ato da entrega e até mesmo sobre de onde ela veio. Também teve a oportunidade de saber um pouco mais sobre a sua mãe e os motivos que fizeram com que ela entregasse sua filha. Maria de Fátima é filha de pais desconhecidos, foi entregue a um orfanato e vivia de favor na casa de algumas pessoas, trabalhando como empregada doméstica. Por se encontrar nesta situação e pelo pai ter se recusado a assumir a responsabilidade, ela temeu que as duas tivessem que viver na rua, então não lhe restou outra saída além de entregar sua criança a uma família que pudesse lhe dar um futuro melhor.

Aquele encontro também foi uma oportunidade de se conhecerem melhor. Dona Maria de Fátima soube que tem três netos e Karina conheceu suas duas irmãs, com as quais, além da sua mãe, mantém contato ultimamente. “Estou tendo contato, porém com cautela e sempre com muito pé no chão para não magoar ninguém e não sair magoada”.

A mãe e a filha não fizeram um teste de DNA. O fato de sua madrinha, para quem Maria de Fátima entregou a criança logo após o seu nascimento, ter reconhecido rapidamente aquela mulher tornou o teste desnecessário, Karina estava mesmo diante daquela que lhe deu a vida.

Amor pelos pais adotivos

A mãe adotiva de Karina Drummond, enquanto ainda era vivia, temia o reencontro entre sua filha e a mãe biológica. Mas este não é medo apenas dela e sim de vários pais adotivos. Muitos acabam por esconder a adoção porque temem ser abandonados quando seus filhos conhecem sua família biológica ou que gostem mais da outra mãe.

No entanto, a líder comunitária é a prova de que isso se trata apenas de fantasias dos pais adotivos. Após ter tido o contato com sua mãe, Karina não só incentiva os filhos adotivos a conhecerem sua origem, mas também tranquiliza estes pais ao dizer que o sentimento que tem por seus pais adotivos, principalmente sua mãe, só aumentou após ter conhecido sua genitora. “Hoje eu amo muito mais a minha mãe adotiva do que eu amava antes”, confessa.

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