Futuros pais: a espera daqueles que aguardam a chegada de uma criança

Yasmin de Freitas
Adotar
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6 min readFeb 22, 2018
Foto via StockSnap.io

Constituir uma família é um anseio de boa parte dos casais brasileiros. Para muitos, a gravidez é um momento especial e de muita transformação na vida daqueles que agora receberão um ser que vai depender de todo o seu carinho e cuidado. Mas, infelizmente, para alguns casais esse sonho não pode ser realizado.

O J.S.* e a A.C.* são exemplo disso. O casal sempre teve o desejo de ter filhos, mas mesmo após o casamento, em 2005, resolveram aguardar um pouco antes de tentar engravidar. Por viajar muito a trabalho e por ela ainda estar concluindo o seu curso de graduação, resolveram esperar por um momento em que sua rotina lhes permitisse dar mais atenção ao novo membro da família.

Com a faculdade concluída e algumas mudanças em seu estilo de vida, eles começaram a tentar. Porém suas tentativas não foram bem sucedidas, o que fez com o que começassem a investigar as causas. Foi neste momento que receberam a triste notícia de que de forma natural não seria possível ter um filho. O casal, que sempre desejou vivenciar a fase da gestação, passou pela fase de luto advinda da frustração de se descobrir a impossibilidade de gerar um filho. Mas, também nesse momento, se depararam com muitos questionamentos a respeito do que fariam após saber que uma gravidez não seria possível.

Inicialmente, a adoção nunca foi uma opção para o casal, porém diante da situação em que se encontraram, passou a ser. Mais propensos a adotar, a atitude do casal foi muito semelhante a de boa parte dos pretendentes: buscaram informações a respeito do processo de adoção, das questões legais, entre outras dúvidas. Em meio a essas pesquisas, uma conhecida do casal lhes falou sobre um grupo de apoio à adoção, o Acalanto. O contato com o grupo foi essencial em todo esse processo de luto e em sua decisão em dar início ao processo. Nas reuniões do grupo, receberam orientações, sanaram algumas de suas dúvidas, conheceram a realidade da adoção — a grande procurar dos pretendentes por bebês, enquanto há mais crianças maiores nas instituições de acolhimento — e ainda tiveram contato com histórias de adoção.

“Já vimos vários depoimentos, experiências de casais. Estar nisso [o grupo de apoio à adoção] ajudou muito, tanto a superar o luto de biologicamente não conseguir e a ver que amor é amor, independente se vem nosso, se vem de fora. A gente pode dar o amor que a gente tem como pai e mãe para uma criança que tá precisando né?”, relata A.C.

O perfil

No decorrer do processo de habilitação para adoção, o casal se deparou com uma situação incômoda: a de preencher a ficha a respeito do perfil que se deseja adotar — sexo, idade, raça, cor, se desejar adotar irmãos, se aceita crianças com problemas de saúde. Eles, que já estavam com certa dificuldade para escolher o sexo da criança, se depararam com um questionário mais extenso e com informações que determinariam o rumo da sua adoção. “Isso é muito chato. Preencher uma ficha, como se estivesse escolhendo um menino no supermercado. Cinco folhas, frente e verso, para você colocar lá o que você quer”, desabafa A.C. Mas ao mesmo tempo o casal compreende que apesar de ser algo incômodo para eles, é necessário para o outro lado, o dos profissionais que lidam com essas crianças, até mesmo para que se possa proteger estas crianças e pretendentes de possíveis problemas no pós-adoção, inclusive as frustrações.

Ao contrário da maior parte dos pretendentes, no perfil do casal não consta um bebê. A decisão não foi aleatória e sim baseada em muita análise. Após se informarem mais sobre a adoção tardia (também chamada de adoção necessária) e levarem em consideração suas idades — ele com 39 anos e ela, 42 — e a rotina que possuem atualmente, chegaram à conclusão de que a chegada de um bebê talvez fosse mais complicada e por isso optaram por adotar crianças de cinco até oito anos. Mas com uma preferência quanto ao sexo: eles querem uma menina.

“Bebezinho sempre tem alguém que quer e as crianças mais velhas, que seriam da faixa tardia, são crianças que não tem tantas pessoas para acolher. O pessoal opta por bebezinho, ainda por aquela questão de achar que bebezinho é mais fácil você moldar, educar e que o maior já vem com uma carga histórica que vai atrapalhar, que é revoltado. Então a gente conseguiu formar a ideia da adoção tardia porque se encaixa mais no nosso estilo de vida e também visando que família é família, independente de idade. Então não temos essa barreira da questão de ser bebezinho, que é o que a maioria quer”, conta J.S.

No quesito raça e cor, eles não colocaram obstáculos. O casal, na verdade, é indiferente quanto a esse requisito. Não se prendem a cor da pele, nem de onde a pessoa vem e muito menos se a criança terá um tom de pele semelhante ao deles. Para eles, o que importante é a pessoa.

As dificuldades e ansiedades

Todos aqueles que se candidatam a um processo de adoção passam por dificuldades, ansiedades e até mesmo questionamentos. No que diz respeito aos aspectos psicológicos, é muito parecido com uma gestão biológica. “A gente tá num processo de gestação também, só não é físico, mas de uma certa forma está. A diferença é que demora mais por burocracia né?!”, cita A.C.

E o casal entende como a burocracia faz com que esse processo seja lento. Hoje, vivenciam duas ansiedades: a da espera pela criança, mas principalmente a da espera pelo término do seu processo de habilitação, para que entrem na fila de adoção. Por residirem na cidade de São Cristóvão (SE), o processo de adoção está sendo realizado em um fórum da cidade, que, como o casal mesmo relata, tem uma equipe reduzida. Isto compromete de forma direta o andamento desses processos. A prova disso é que o casal deu entrada em seu processo de habilitação em setembro de 2016, mas em janeiro de 2018 ainda não tinha se encerrado. Até o momento, o casal só participou do curso de preparação, em março de 2017, e da entrevista técnica, que foi realizada em novembro do mesmo ano. Mas ainda faltam etapas para que seu processo seja analisado e, caso seu pedido seja acolhido, entrem na fila de adoção.

Além da demora em se realizar todas as etapas necessárias para a conclusão do processo, o casal comenta que precisa estar sempre indo atrás de informações para ver se dão andamento. Eles relatam que ao tomarem a iniciativa de tentar se informar sobre o andamento do processo, parece que passam a dar visibilidade ao seu caso. Mas mesmo assim isso não tem feito com que as coisas aconteçam mais rapidamente para eles.

Para intensificar a ansiedade, se deparam com alguns questionamentos e receios. Por terem consciência de que adoção depende muito de uma afinidade entre a criança e o casal, temem encontrar uma criança, mas não estabelecer essa conexão — seja porque a criança não se identifica com eles ou porque acontece o oposto. Outro medo também é de encontrarem uma criança, mas ela estar em um grupo de irmãos, algo que é comum na faixa etária por eles escolhida. Em seu perfil, optaram por adotar apenas uma criança e como a lei determina que não se separe os irmãos, essa adoção seria impossível no momento.

Reservados, eles dizem que para evitar que a ansiedade cresça, contaram apenas para algumas pessoas e evitam ficar se expondo. Até então, somente a família e alguns amigos mais próximos sabem que eles estão passando por um processo de adoção. Mas ao mesmo tempo eles sabem que quando a adoção se concretizar as pessoas vão estranhar e terão questionamentos, por este motivo buscam sempre estar se preparando para lidar com esse tipo de situação.

* Para preservar a identidade do casal e a pedido deles, apenas as iniciais de seus nomes e sobrenomes foram utilizadas neste perfil.

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