Inovaçāo à brasileira: Como o AppJusto tem transformado a gig economy no Brasil

Aerolito
Aerolito
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11 min readApr 11, 2022

A gig economy (também conhecida como ‘economia de plataforma’, ‘economia sob demanda’ ou ‘economia autônoma’) tem suscitado opiniões diversas e controversas, bem como debates de máxima importância para a compreensāo da sociedade. Isso se intensifica quando observamos o papel que este tipo de economia assume hoje, principalmente no Brasil. Aqui, vemos um cenário de alta taxa de desempregos e queda na renda média de pessoas trabalhadoras, alguns dos fatores que fazem com que muitas pessoas passem a fazer parte de uma crescente na adesāo aos trabalhos autônomos e informais.

Assim, as pessoas recorrem às plataformas e aplicativos que permitem que prestem serviços sob demanda, seja para complementar a renda ou como alternativa à desocupaçāo. Um levantamento realizado pelo Ipea mostrava que 1,4 milhāo de pessoas entregadoras e motoristas estavam na Gig Economy em outubro de 2021. No entanto, tem sido comum ler relatos de pessoas e restaurantes que prestam serviços para essas plataformas, mas nāo conseguem obter um retorno rentável ou que considerem justo quando se analisa o escopo geral das condições de trabalho, tempo total de serviços prestados e remunerações recebidas.

Acontece que nāo deveria ser sempre assim. E algumas pessoas já tem nāo somente percebido isso, mas também trabalhado para contornar essa situaçāo, ao menos em alguma medida.

É daí que surge o objeto do amanhā que apresentamos hoje: o AppJusto. Fundado em 2020, o aplicativo surge com o objetivo de estabelecer relações mais justas e transparentes no delivery. Ao cobrar dos restaurantes e de pessoas entregadoras taxas significativamente menores do que os seus concorrentes, a plataforma promove condições mais prósperas para todos ao mesmo tempo, da pessoa consumidora às pessoas prestadoras de serviços. Sob o slogan ‘Só é bom quando é bom para todos’, o AppJusto se entende enquanto um aplicativo de entregas que ajuda a promover a justiça social, reduzir as desigualdades e fornecer mais autonomia para todas as pessoas envolvidas.

Para nós, o AppJusto é um objeto do amanhā porque é uma iniciativa que testemunha um futuro possível e desejável, e, neste caso, um futuro onde a economia de plataforma será de fato utilizada em prol de que toda a sociedade usufrua de seus benefícios. Quando conversamos com o Rogério Nogueira, um dos cofundadores do aplicativo, a ideia do compartilhamento ficou bem nítida como motivadora do projeto.

Confira abaixo nossa entrevista e entenda melhor porquê consideramos válido voltar nossa atençāo ao AppJusto.

Aerolito: Quando o AppJusto foi criado e o que despertou sua iniciativa?

Rogério [AppJusto]: No comecinho de 2020 a gente conversava muito sobre descentralização, sobre a questão dos monopólios, sobre a questão da economia de plataforma, né? E a gente começou a estudar e conversar sobre isso e classificou a economia de plataforma de duas maneiras: a economia de plataforma em que existe autonomia e a economia de plataforma em que não existe autonomia. Na que existe autonomia, como Airbnb, Mercado Livre, GetNinjas e muitos outros, as regras são transparentes e o próprio prestador de serviço define as condições do seu trabalho: valor, quando pode ir, e existe um acordo de fechar negócio. Já o Uber, já os deliverys, eles não dão autonomia ao trabalhador, tem que trabalhar sem saber as regras, não sabe quanto vai ganhar por corrida, não tem clareza, não pode definir o próprio valor, tem a política do score que penaliza ele se não pega corrida, se não ficar disponível. Então pra nós isso não é um profissional autônomo, né? Junto com esses estudos, esses bate-papos, veio o Breque dos Apps, começou a pandemia e veio um episódio muito importante que é o “Delivery” do Gregorio Duvivier.

Então o conjunto dessas coisas despertou na gente o pensamento do que a gente pode mudar. A gente começou (a pensar) “como é que a gente combate os monopólios?” É, não é com dinheiro, não é com jogo do cupom, né, que todo mundo pensa: “ah eu tenho que fazer na plataforma com cupom…” nāo, a gente combate monopólios com construção coletiva, com união. E a gente começou a estudar sobre cooperativismo de plataforma, como poderia criar algo que fosse de todos porque se fosse bom e fosse de todos era uma alternativa ao status quo, né? No final a gente não conseguiu abrir como cooperativa, mas aprendemos muito, a gente tem no nosso DNA o princípio cooperativista e a gente começou a desenvolver, então falamos com associações, falamos com os entregadores, falamos com liderança, com restaurantes, pra entender o quão profundo era o problema e as chances de mudar isso, e ver até que ponto todos estavam dispostos a se mobilizar e se comprometer por uma mudança. Então a gente começou a trabalhar esse problema, criamos uma plataforma já com uma visão de que tinha que ser uma plataforma robusta. Então, a gente já lançou uma versão zero bastante robusta com esse olhar, um olhar de combater o monopólio, trazer equilíbrio pro mercado de plataforma, um olhar onde um intermediário não ganha mais do que quem está produzindo e mesmo assim provar que isso dá pra fechar a conta. Então dá pra ter sucesso, a gente almeja ter lucro. Mas lucros ‘assim’, na escala, com bom senso, não explorando as pontas, tá?

Aerolito: Qual o objetivo do projeto? Que serviços são oferecidos?

‘O objetivo do projeto é trazer equilíbrio, é ser uma alternativa ao monopólio, é de reduzir a desigualdade social no Brasil, distribuir renda. Fazer com que quem está prestando serviço tenha melhores remunerações e não seja refém das pontas.’

Rogério [AppJusto]: Então, o objetivo do projeto está um pouco ligado ao que despertou a iniciativa, né? O objetivo do projeto é esse, trazer equilíbrio, é ser uma alternativa ao monopólio, é de reduzir a desigualdade social no Brasil, distribuir renda, entendeu? Fazer com que quem está prestando serviço tenha melhores remunerações e não seja refém das pontas. Então o objetivo é esse, a gente resolve isso a partir de uma plataforma, a gente tem uma plataforma de ponta a ponta, então é market place, tem parte de pagamento, tem toda a parte de logística, então é uma plataforma completa inicialmente de delivery pra resolver esse problema. E lá a gente tem dois serviços, serviço de delivery e serviço de encomendas, que é como se fosse a Loggi chamar um entregador pra fazer uma encomenda, uma entrega pra você, um trabalho de motoboy ou bike, alguma coisa nesse sentido.

Aerolito: Como o AppJusto se organiza internamente em busca de atingir os objetivos?

Rogério [AppJusto]: Primeiro a gente teve que realmente idealizar, que levantar capital, então a gente levantou novecentos e dez mil reais no comecinho do projeto lá em setembro de 2020 pra construção e pra rodar a fase beta, que durou oito meses. A gente tá na final dessa fase beta. A gente começou com nosso próprio time, mas também criou uma rede de voluntários que hoje tem mais de trinta pessoas, pessoas que se identificam com o propósito, querem mudança, que querem um projeto de impacto social, veem a importância da nossa pauta e ajudam pontualmente ou compartilhando informações, links e eventualmente a gente chama pra situações pontuais. Então tem gente que fala de comunicação, tem gente que é bom pra eventualmente dar uma māo em tecnologia, tem gente que dá uma luz em gestão de redes sociais, tem gente que ajuda na parte de fundraising, né? De captação de recursos, tudo mais. Então esses voluntários que ajudam bastante a escrever um release, dar opinião, vibrar junto, divulgar…

A gente é uma empresa que embora pequena, é bem processual, tem muito direcionado a dados, bastante mesmo. Então a gente tem uma certa governança, a gente tem os nossos indicadores na palma da mão, a gente consegue ter conversas bastante fundamentadas nesse sentido. A gente também tem uma visão descentralizada de decisão, embora tenha o sócio, a gente dá o norte, opina e tudo mais. Ah, mesmo com um time pequeno a gente procura dar bastante autonomia e tivemos sorte aí no time que a gente montou, que são pessoas que propõem, que executam, que fazem mudança, melhoram processos, melhoram do atendimento ao resultado final.

Aerolito: Qual o diferencial do AppJusto? O que o torna único?

‘O grande diferencial do projeto é que a gente conseguiu criar um modelo de negócio que é bom para todos e ainda praticar. E a resposta disso é o pensar coletivamente.’

Rogério [AppJusto]: O grande diferencial do projeto mesmo é que a gente conseguiu criar um modelo de negócio que é bom para todos e ainda praticar. Esse é o diferencial do projeto. E a resposta disso é o pensar coletivamente. Então a gente vem reduzindo as nossas taxas, como os concorrentes cobram taxas absurdas. No caso dos restaurantes chegam a 27%, no caso dos entregadores além de tirar uma fatia do trabalho deles ainda tem uma série de coisas… roteirização, não repassar tudo pra eles, ‘isso e aquilo’. De diferenciais a gente tem esse modelo que é melhor para todos, inclusive pro consumidor, que chega a pagar até trinta por cento mais barato pelo prato, já que os restaurantes que usam as plataformas pagam taxas abusivas, ainda subsidiam frete, ainda tem que dar cupom pra ter uma relevância maior, então eles (os consumidores) conseguem pagar até trinta por cento mais barato aqui. Então o consumidor também é favorecido.

E o que torna único eu acho que é essa coletividade. Ser algo que tem esse efeito rede, onde as pessoas veem vantagens e entendem que está sendo bom pra todos, e se cadastram. A gente está medindo isso em números, tá? Então a gente tem restaurantes entrando, restaurantes divulgando e investindo no AppJusto, os entregadores também divulgando, tentando trazer restaurantes e consumidores… A gente tem aqui os os próprios consumidores fazendo depoimento, marcando a gente nas redes sociais, tão mostrando esse potencial orgânico que é o sonho de toda startup. A gente fez 3500 pedidos agora com zero investimento em marketing, só potencializando a força da comunidade. Então o diferencial é ser correto, é pensar coletivamente, é ser honesto, ser algo que é bom pra todos mesmo, entendeu? Isso tá dando muito certo, e a gente também tem muito cuidado pra caber em 5%, a gente teve todo um cuidado de criar uma estrutura enxuta, criar projetos muito bem priorizados.

Aerolito: Selecionamos o AppJusto por acreditar no seu potencial transformador. Na sua opinião, que futuro o projeto está ajudando a construir? Qual legado a iniciativa deixa no mundo?

‘Conseguir consertar a gig economy é a nossa missão.’

Rogério [AppJusto]: Muito obrigado por selecionar nosso projeto e acreditar no nosso potencial transformador. A gente tem aqui a nossa teoria da mudança, a metodologia de impacto social que a gente usa, e no primeiro pilar, que é o que a gente se propôs a resolver agora, a gente já tem muita coisa realizada, como um treinador que está ganhando praticamente o dobro do que ele ganha em outras plataformas por corridas de delivery. A gente tem aqui restaurantes fazendo quinhentos pedidos e recebendo oito mil reais a mais. Então é uma diferença boa entre taxas, né? (…) Na economia de plataforma, a gente quer realmente fazer com que todas as partes estejam melhores, financeiramente mais tranquilas, mentalmente mais saudáveis, é isso.

No futuro, assim, pensando mais amplamente, a gente diz aqui que cada pedido ajuda a construir uma sociedade melhor. Então a gente quer passar aspectos de coletividade, sobre pensar coletivo, sobre pensar no próximo. Tanto que outra frase nossa muito forte assina muitas peças como: Juntos, dá. É mostrar pro restaurante que se ele quer a transformação no monopólio depende dele também. E quando a gente fala de ter uma sociedade melhor, por exemplo, se acontecer algum problema com o pedido, como já aconteceu, a gente liga, faz o atendimento, dá uma satisfação, explica o que tá acontecendo, mas explica. A gente não mima o cliente com cupons. A gente explica, “Ó: aconteceu isso com o entregador.” Hoje teve um entregador que mandou mensagem pro consumidor dizendo que acabou a gasolina e que ia demorar vinte minutos a mais. Então às vezes acontece, é a gente trabalhar aí a paciência, um olhar pro outro, um respeito em vez de surtar, cancelar, ficar bravo… Óbvio que se a pessoa está com fome, a gente quer entender, quer compensar e trabalhar pra isso não acontecer de novo, mas compreensão, olhar pro próximo, é muito legal, nem que seja inicialmente nesse ecossistema que é o ecossistema de delivery ou o ecossistema na guia econômica um pouco mais ampla.

‘A gente quer de legado deixar isso: Melhor distribuição de renda, menos restaurantes fechando, maior empregabilidade, ajudando em outros níveis da nossa teoria do impacto social.’

A gente quer ajudar os entregadores que estão entregadores, que é 75% deles, a se capacitar em outras profissões do futuro. Porque a GIG Economy está sendo uma profissão do futuro muito exploratória e transformando todo mundo aí em em máquinas, né? (…) A gente quer transformar isso na profissão do futuro mais charmosa, mais interessante que é melhor remunerada. Programadores, gerentes de projetos, estrategistas… Como a gente tem contato com essas pessoas e eles estão on no nosso app, por que que a gente não pode ajudar eles a irem para outras economias? A gente conseguir consertar a gig economy é a nossa missão. Então a gente tem uma economia onde as pessoas têm todo o benefício da tecnologia, tem todo o benefício das plataformas, e trabalhar por plataforma tem muita vantagem, as pessoas não precisam ser CLT no sentido de precisarem ir pra empresa e precisarem trabalhar oito horas por dia, então você traz homens, mulheres, pais, mães, as crianças que podem cuidar, pessoas que precisam estar em casa pra cuidar de outra pessoa. A gente ajuda a desinchar as metrópoles. Pessoas podem trabalhar de outros lugares. Então melhora o acesso, o transporte público, porque não tem tanta gente. Então é o trabalho autônomo quando digno, quando equilibrado, quando bem remunerado. E a gente quer participar de políticas públicas que ajudem a construir realmente algo melhor. O pessoal diz que o adequado não é nem a MEI, não é nem a CLT, que deve ter alguma coisa no meio, então vamos participar, vamos trazer dados.

‘A gente é open source e a gente é open data.’

O Open Source tem o nosso código fonte, ele é livre, a gente entende que ele é um bem coletivo, ele é um bem pra sociedade. E ao mesmo tempo também a maior prova que a gente dá pra consumidores, restaurantes, entregadores, que a gente não é um entrante no mercado que vem com taxa baixa, com mil promessas. Porque se a gente deixar de ser isso, uma associação, um grupo de pessoas, um grupo de treinadores pode pegar o nosso código fonte e criar um novo aplicativo concorrente do próprio AppJusto, certo? Com as regras e taxas que a gente criou hoje e dessa maneira conquistar mercado, porque isso está parecendo ser um sucesso. Então é outra coisa que a gente tem, a gente quer ser open data, a gente já inclusive está com algumas coisas prontas aqui do nosso lado, de disponibilizar isso no nosso site para ajudar acadêmicos, políticos, líderes, jornalistas a terem informações reais, transparentes, de qualidade, quantas pessoas estāo trabalhando na gig economy e quantas horas por dia? Qual é a remuneração média? Para que se criem políticas públicas melhores pra essa economia de plataforma. De novo volta pra consertar a gig economy, que é um legado importante, ter uma gig economy boa, saudável onde todo mundo tem o melhor dela.

Acreditamos no potencial transformador do objeto do amanhā selecionado, pensando no impacto que uma iniciativa como essa pode ter dentro do contexto de uma economia de plataforma fragilizada diante da crise econômica nacional e das demandas trabalhistas emergentes. Até quando a economia de plataforma que se configura hoje irá ser sustentável? Que reconfigurações sāo possíveis? Apesar de o AppJusto ser um aplicativo de delivery, que outros nichos sua proposta pode impactar? Consumidores que desejam ser socialmente responsáveis nāo estāo também em outros mercados?

Mais do que responder esses questionamentos, propomos perguntas. Perguntas que guiam futuros possíveis, trazendo clareza sobre eles.

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