O que é possível esperar da música preta brasileira?

Leila Evelyn
afrontadora
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3 min readMay 22, 2019

Com as recentes novidades meu coração chega a ficar quentinho, percebo que o futuro é promissor para nós e que as mudanças nos colocam no caminho do bem. Planejamento estratégico e muita fé nos processos, acredito que isso vem guiando boa parte de tudo de bom que tá rolando. Parece que os Alquimistas de Ben finalmente estão chegando.

Com o caso de racismo sofrido pelo Fioti, no Lollapalooza, eu não conseguia pensar em outra coisa a não ser no quanto temos capacidade de fazer festivais tão grandes quanto este ou mais. O Coala Festival (2018) esfregou isso na nossa cara: uma produção branca para artistas pretos, que, a propósito, apesentaram shows impecáveis. Jamais vou esquecer da emoção em ver Gilberto Gil sambando miudinho; Mano Brown com seu jeitão sensual; Milton Nascimento emocionado com a plateia cantando “Maria, Maria”; Baco Exu do Blues abrindo roda punk; Elza Soares, belíssima, ao toque de Iansã puxado pelo Ilú; Xênia França botando pra foder com um som pesadíssimo e Luedji Luna com capacidade de fazer chover no deserto.

Xênia França, Larissa Luz e Luedji Luna — Carnaval 2019. Foto: @carolinelima.co

Faz pouco tempo que Luedji disponibilizou nas plataformas um novo álbum, “Mundo”, com versões remixadas de “Um corpo no mundo”. As referências são inúmeras, gostei especialmente de “Acalanto”, bem Erykah Badu. Em sua maioria, os trabalhos tendem à eletrônica (se é que esse é o termo mais correto) que, apesar de ser uma criação nossa, é um espaço embranquecido e dificilmente surge uma proposta corajosa tal qual a do Dj Nyack. Um passarinho me contou que esse era um espaço que a cantora não sentia ser pra ela, não se sentia confortável. É bonito que a Luedji se permita experimentar, conhecer novas versões de si mesma e do próprio trampo.

A Larissa Luz é um outro bom exemplo do que estou querendo dizer quando falo de novos caminhos. Seu som é inovador, totalmente fora da caixinha em que tentam colocar a grandiosidade da música preta. Ultimamente tudo parece ser a mesma coisa, a indústria é cruel e muita gente acaba mudando para se enquadrar e ganhar dinheiro, mas pra essas minas não, elas botam a buceta na mesa. Inclusive, escutem “Trovão”!

Na última quarta-feira (15), a Batekoo, plataforma de cultura e entretenimento com enfoque na juventude negra e LGBT+, anunciou ter alcançado um novo patamar, se tornando um selo musical: a Batekoo Records, que continuará em paralelo com as produções de eventos, festivais e atividades.

Faz pouco mais de um mês que bebi pra caralho e peguei um dos poucos pretos da firma para falar sobre a potencialidade desse rolê, que nasceu em Salvador e voando pelo mundo. Pessoalmente, tenho algumas questões, que em nada diminuem a legitimidade de festas como essa. Visão de negócio e estratégia fez de um rolê um ponto de transgressão.

JAMILA OLABAMIJI, protagonista do livro de Fábio Kabral, “A Cientista Guerreira do Facão Furioso”, é uma prodigiosa filha de Ogum.

Basta observar os sinais, tudo está acontecendo agora. Ouçam Nia, leiam Fábio Kabral, procurem saber sobre bell hooks, ouçam Nego Gallo, assistam Spike Lee, procurem saber sobre “pés na terra e cabeça na lua’”, cantem com Marabu: “Senhoras e senhores, foco nos negócios”. O amanhã não existe, a população preta segue morrendo, o futuro é hoje e espero que isso te inspire e traga fé.

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Leila Evelyn
afrontadora

Me disseram que essa era a mídia social do textão, por esse e outros motivos, aqui estou. — 26 anos, Relações Públicas, produtora e várias fita.