18 de Maio de 2017 — A mente deprimida

Rodrigo Bressane
Life After Suicide
Published in
3 min readMay 18, 2017

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Este artigo é parte da série “Como é tentar se matar e falhar”. Comece por ali, caso ainda não tenha lido.

Estou vivendo minha semana mais terrível. A primeira desde que saí da clínica psiquiátrica onde estive internado por cerca de um mês depois que, no dia 7 de Abril de 2017, tentei me matar e falhei.

Minha expectativa era outra. Meu humor vinha melhorando na clínica e lá, com o isolamento, acabei fazendo uma série de planos para o mundo aqui fora. Para a realidade. Quando finalmente cheguei, o mundo me mostrou sua cara horrenda.

Meu estado atual é o pior possível para qualquer atividade, exceto escrever. Algo há de terapêutico, neste exercício, que me faz levemente anestesiado pelo curto período em que transformo tormentas em palavras. Que seja útil este instante, portanto, para documentar o que se passa na cabeça de um suicida em depressão profunda.

A primeira constatação é a de que os afazeres mundanos tornam-se desprezíveis. Todos eles. Sem exceção. De lavar a louça a pousar na lua. E aí, com os pés no chão, não consigo recobrar a vontade de trabalhar, de fazer o que sempre gostei. Não tenho sequer a memória de ter gostado de alguma coisa um dia. De lembranças, só moléstias e suas mágoas. Sair da cama é uma tortura. As pernas não se movem. O corpo não responde.

Vontade é algo que não existe para alguém em meu estado. A angústia impera e traz séquitos importantes, como a memória de cada detalhe ínfimo da sinfonia de sofrimento. Gente, ações, reações, decepções, oportunidades perdidas, palavras faladas, silêncios. Uma enormidade de fatos e atos apunhalando o peito num movimento sem fim.

A gravidade dos erros, próprios e dos outros, absurdamente amplificada dentro da mente, neste instante uma cápsula de compressão da dor. “Tudo coisa passageira”, alguém pode dizer. No estágio em que me encontro, toda certeza de sua eternidade.

A própria vida torna-se absurdamente desprezível e desnecessária. Lampejos de razão surgem para conflitos breves com este estado deplorável de existência. Tentam convencer-me de que isso é uma etapa com prazo de validade. E é nessa guerra que mora a fina linha entre o desejo intenso de encerrar o jogo da sobrevivência e um discreto sussurro de discernimento que, de tão inaudível, mal dá para compreender.

Até comer, uma das mais básicas e valorizadas atividades da nossa biologia, tornou-se, para a mente, tão desnecessário quanto qualquer outra coisa. Tenho feito uma refeição por dia, se é que dá pra chamar assim a ingestão de alguns gramas de proteína. Emagreci bastante, provavelmente a única boa notícia, embora resultado de uma clara disfunção emocional.

Ontem foi meu pior dia. Desabei em prantos durante uma sessão de fotos, em São Paulo, na minha primeira tentativa de retorno ao trabalho com o Pandalux. Tive que abandonar a produção no meio e acabei voltando pra casa e, posteriormente, para a cama de onde pretendia nunca mais sair. Felizmente meu sócio Agê Barros é o profissional mais competente e humano que eu conheço e segurou as pontas.

Hoje as coisas melhoraram um pouco. Consegui trabalhar durante metade do dia na Lime. Não fiz muito, mas fiz alguma coisa. E sinto menos o baque dos dias passados. Espero que seja uma mudança constante. A tal da “fase” passando para dar lugar ao novo eu que tanto esperava encontrar aqui fora.

Logo mais tenho minha primeira consulta com a nova psicóloga. Toda sorte do mundo… para ela.

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