Abandono de animais: um problema ignorado

O problema de animais que vivem na rua, onde não recebem a atenção e o cuidado de que precisam

Não é segredo pra ninguém que existem vários animais abandonados nas ruas do nosso país. Muitas vezes, eles não tem raça, nem perspectiva de melhora, vivem e morrem em situação precária. São cães e gatos que não tiveram tanta sorte como outros. Mas, como fazer para diminuir o número de bichinhos na rua? É necessária a conscientização da população em adotar animais da rua, mas também ações do poder público, como a criação de leis que possam punir quem abandona e que garantam a castração desses animais para evitar o aumento da sua população.

Conforme dados do Instituto Pet Brasil, “O Brasil é o terceiro país do mundo com a maior população de animais, atrás apenas da China e dos Estados Unidos. Mais de 2 milhões vivem em abrigos, tutelas de famílias carentes ou em situação de rua”.

Embora não haja estatísticas oficiais, uma estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que mais de 30 milhões de cães e gatos estejam em situação de abandono no Brasil.

Se não fosse a ajuda de pessoas que resgatam esses animais abandonados, a situação seria bem pior. Uma dessas pessoas é Isabelle Ardanaz, de 21 anos, estudante de Medicina Veterinária e professora de pintura, ela diz que sempre procura ajudar os animais de rua e já adotou vários deles. “Ano passado (2020) comecei a resgatar mais firmemente, trouxe uma ninhada recém nascida pra casa junto com a mãe, cuidei de todos, vacinei e doei a maioria. Ficaram comigo dois filhotes, além da mãe”.

Isabelle também conta como foi resgatar o Lego, cachorro que está com ela até hoje: “Um dos resgates mais difíceis foi o do Lego, resgatei ele enforcado em um fio de luz, cuidei e tratei. Quando estava melhor desse ferimento, ele ficou doente, teve cinomose e pensei que fosse morrer. Tratamos por um bom tempo e ele se curou e ficou super bem, daí acabei adotando”.

Ela também fala de como é a situação de animais abandonados em Cascavel: “Temos muitos animais abandonados na cidade, as ONGs e protetoras estão lotadas, lidamos muito com casos de adoção e devolução, por mudança ou até mesmo por falta de paciência”, relata.

O Abandono durante a pandemia

Na pandemia de Covid-19 o número de abandono de animais aumentou consideravelmente, um dos motivos é que os animais transmitem o coronavírus, outro motivo foi que no começo da pandemia, segundo uma reportagem sobre o assunto da CNN Brasil, as pessoas buscavam companheiros para a quarentena, mas depois de alguns meses viram que não poderiam sustentar os bichinhos portanto optaram por abandoná-los ou deixá-los em abrigos, aumentando assim as despesas dos donos de abrigos, algo que piorou durante a pandemia.

Isabelle Ardanaz também fala sobre a questão do aumento no número de animais abandonados na pandemia “na verdade no início teve uma grande quantidade de adoção, mas muitas foram devolvidas, muitos abandonos, muitos donos que faleceram e as famílias abandonaram os bichinhos”.

Aqui no Brasil, os cachorros sem raça definida, ou SRD, são bem comuns nas ruas, os famosos vira-latas caramelo

Sobre os impactos do abandono em um animal, Isabelle afirma que: “o animal sente sim a falta. Muitas vezes, mesmo quando o antigo dono não dava muita atenção e cuidado, era o que eles tinham de porto seguro. Os animais abandonados geralmente são desconfiados e medrosos, alguns até ariscos”.

Outro grande problema é o mercado de animais de raça, não há nada de errado em se ter um animal de raça, desde que o mesmo tenha vindo de um lugar seguro, regulamentado e bem cuidado no geral, mas será que a preferência por animais de raça ajuda no aumento de animais abandonados? Isabelle disse que ajuda sim “sim, infelizmente, muitos as vezes querem um cão de raça, mas já tem um vira lata, então preferem muitas vezes doar ou abandonar o seu para poder ter um de raça”, portanto é sempre bom lembrar que para aquelas pessoas que querem ter um bichinho mas não quer gastar na hora de adquiri-lo é fundamental a adoção, assim você dá um lar para um animal necessitado e ganha um companheiro pra vida toda. Mas não é só adotar e pronto, os animais de rua necessitam de cuidados especiais “É sempre importante ter um acompanhamento veterinário, principalmente se você mesmo o pegou da rua e levou pra casa” diz Isabella “e o amor com certeza vai ajudar, e atenção e paciência nos primeiros tempos”.

Aqui, em Cascavel, existem vários abrigos de animais com o intuito de cuidar e dar amor a esses animais que tanto sofrem/sofreram nas ruas. Um desses abrigos é o Latidos do Bem, um lar para vários animais que foram resgatados das ruas da cidade.

A ONG existe há um ano e meio e tem como objetivo dar um novo lar para animais desamparados das ruas ou de lares onde os donos são abusivos e acabam não cuidando do animal. Conversei com uma dirigente da ONG, que conta a história da fundação do abrigo: “A latidos surgiu mais ou menos há um ano e meio, como uma protetora de outras ONGs de Cascavel, já que na cidade muitas sofrem de superlotação, sobrecarregadas, doentes, com muitas dificuldades de manter os animais”.

A organização destaca que há animais de rua na cidade, o que motivou a Latidos e fazer resgates e abrigar os bichinhos. “Aqui em Cascavel existem mais de 60 mil animais nas ruas Então, após várias pesquisas nas regiões da cidade a respeito de animais abandonados, a gente acabou virando uma protetora também, e então as pessoas iam atrás de ajuda com animais doentes, animais acidentados e acabamos começando a também fazer os resgates. Hoje em dia, a latidos tem o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos animais, sejam animais de rua, sejam animais com tutores que precisam de ajuda também. Só não ajudamos quem maltrata animais, pois uma pessoa que não respeita nem um animal não merece ser ajudada”.

O propósito da ONG hoje é melhorar a qualidade de vida da causa animal e consequentemente acabam ajudando as pessoas, eles até tem um projeto vinculado com o departamento penitenciário onde os produtos usados pela ONG são fabricados pelos presos “Nós temos um projeto com o departamento penitenciário onde os detentos fabricam roupinhas, caminhas, casinhas, protetores de sofá, protetores de carro, tudo que se tem de acessório e são postos à venda, eles ganham remissão de pena e consequentemente o aprendizado, outro projeto que está acontecendo é um onde casinhas são fabricadas e são ou postas à venda ou doadas, as que são vendidas têm o dinheiro ganho todo doado para a clínica veterinária que é parceira na causa. Outro objetivo da ONG é a castração, principalmente de fêmeas, pois uma fêmea pode chegar a ter vários filhotes e muitas vezes ocorrem problemas de saúde se não forem tratados prontamente”.

Na página do Instagram deles é possível ver várias informações sobre a ONG

Quando o inverno chega, o problema piora

A situação dos animais abandonados já é ruim no geral, mas quando chega o inverno, ela piora: sem um lar, os bichinhos também sofrem com o frio intenso, por isso, assim como as pessoas precisam de um agasalho nesse tempo, os animais também precisam.

A Veterinária Camila Bonamigo conta um pouco dos problemas que podem ocorrer nos bichinhos caso fiquem expostos ao frio por muito tempo. “O frio pode trazer várias doenças para os animais. Nos cachorros temos a traqueobronquite, que a gente chama de Gripe Canina. Seus sintomas são parecidos com os da gripe que nós, humanos, temos: tosse, espirros, falta de apetite e catarro. Já nos gatos, a doença com mais ocorrências é a rinotraqueíte, que é mais comum em filhotes. Nela pode ocorrer secreção nasal, dificuldade de respirar, febre e desidratação”.

Por isso é importante que as pessoas se conscientizem: no inverno, é importante sim doar agasalhos para as pessoas necessitadas, mas também não podemos nos esquecer que os animais sofrem como nós, é preciso ajudá-los.

Tudo bem, mas e as leis contra o abandono?

Em 2020, foi aprovada uma nova legislação que aumenta a pena de quem abandona, a lei federal nº 14.064/20 sancionada em setembro de 2020 aumentou a pena de detenção que era de até um ano para até cinco anos para quem cometer esse crime.

Existe até um mês de campanha contra os maus-tratos e o abandono, o chamado “Dezembro Verde” alerta sempre a população sobre as graves consequências do abandono de animais e também incentiva pessoas a adotarem animais de rua, seja cães ou gatos, o que importa é adota, a campanha é promovida pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária de São Paulo.

Um exemplo de campanha bem sucedida contra o abandono de animais foi a da Holanda, onde foi reduzido drasticamente o número de animais nas ruas graças a um programa de políticas públicas que garantiu um plano de castração e vacinação dos animais em situação de abandono. Atualmente, segundo o governo holandês, não há mais cachorros em situação de rua no país das bicicletas, tulipas e moinhos de vento.

O programa foi chamado de CNVR — sigla para Collect, Neuter, Vaccinate, Return, ou em português Coletar, Castrar, Vacinar e Devolver, tanto animais em situação de rua quanto os que já moram com uma família passam/passaram pelo programa. Outro motivo para o número de animais abandonados serem mais adotados foi que o governo Holandês criou impostos para quem possuir animais de raça vendidos em lojas, ou seja, a população optou por ter um amiguinho da rua, ainda dentro da legislação holandesa, animais abandonados não devem ser deixados na rua, mas em locais específicos. Se alguém for pego abandonando um animal em local inapropriado pode receber uma multa de até 16.000 dólares, e a pena pode incluir mais de um ano de prisão.

Não compre, adote

Você pode fazer sua parte para ajudar na questão do abandono animal: adote! Mas, antes de trazer um animal para casa, planeje muito bem, o lar deve ser definitivo, para toda a vida do bichinho. Por isso, tenha certeza que terá condições financeiras para se manter e manter o animal. Certifique-se de que terá tempo para o bichinho: brincar, levar para passear, cuidar, enfim são coisas que consomem tempo e exigem muito comprometimento. Também é preciso pensar em vacinas, veterinário, remédios, e na castração — atitude que contribui para reduzir o número de animais nas ruas. E saiba, ao adotar, você ganha um amigo para a vida toda!

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