Coronavírus: Covid-19 não é a única ameaça

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Antropologia e Ciência Política ajudam a entender o mundo pós-coronavírus

WANDERSON SANTANA SCHUMACHER

Embora o tempo sempre tenha sido o mesmo para todos, é crescente a queixa de que ele falta. Há quem explique que a evolução das tecnologias de comunicação acelerou a percepção do tempo, que, mais escasso, tornou-se mais valioso Só que, de súbito, esse tempo que costumava passar depressa agora passa devagar. O que antes era escasso agora é abundante. Isso é o que o isolamento social, necessário para conter a pandemia de coronavírus, causou a muita gente.

Andréia Vicente — Foto: Wanderson Schumacher

“Essa situação acontece por diversos fatores, o primeiro é que vivemos numa sociedade capitalista. Por consequência, a gente transforma tudo o que existe em coisas que são valoráveis, e que monetariamente podem ser compradas. Desse modo, a gente procura produzir em todos os espaços de nossa vida valores, coisas que possamos adquirir, que possamos comprar”, explica a antropóloga e professora na Unioeste campus Toledo, doutora Andréia Vicente da Silva.

Andréia descreve o cenário atual como de “subversão completa”. A lógica do cotidiano de antes da pandemia era de pessoas voltadas para fora de si, que consideram o próprio corpo como coisa, alheio. Agora, o que acontece é que um vírus obriga as pessoas a se voltarem para dentro e encararem a si mesmos. O problema é que, para a antropóloga, as pessoas não têm condições de fazer essa contemplação interior, pois estão moldadas na lógica da velocidade, do impulso e do consumo. E isso gera um grande incômodo.

No entanto, existe algo que precisa ser ponderado. Seria injusto acusar essas pessoas de equivocadas, de modo a esperar que agissem de maneira diferente. Produzir renda para consumir é necessário. Assim, para muitas pessoas, ficar sem produzir significa não poder se alimentar, morar, vestir, e tudo que é necessário para se viver.

Nesse sentido, Andréia destaca que o isolamento social tem impactos diferentes entre as classes sociais. “Nem todo mundo vai ter um salário no fim do mês. Então a desigualdade social afeta essa restrição de circulação de maneiras desiguais. Para um funcionário que tem o seu salário garantido no fim do mês, a quarentena é possível. Para as classes populares, autônomos, enfim, que não têm essa renda, a quarentena é impossível sem o auxílio direto do governo”.

O papel do governo

O esforço do Governo Federal brasileiro ao enfrentar a pandemia é questionável em alguns sentidos. Contudo, recentemente, foram anunciadas medidas de acolhimento das classes trabalhadoras mais afetadas pelo fechamento do comércio. São auxílios financeiros para trabalhadores informais, autônomos ou sem renda fixa, enquanto que os assalariados receberão seguro-desemprego, podendo retornar aos seus trabalhos após o controle da pandemia.

Osmir Dombrowski — Foto: Arquivo pessoal

Em relação ao restante do mundo, o cientista político e professor na Unioeste campus Toledo, doutor Osmir Dombrowski, explica que, de forma geral, os governos mundiais estão enfrentando a pandemia de maneira semelhante. Entretanto, a seu ver, alguns governos parecem não acreditar no potencial ofensivo do coronavírus, sendo negligentes para tomar as medidas necessárias.

“O prefeito de Milão já manifestou publicamente seu arrependimento, da mesma forma, o Primeiro Ministro inglês já fez seu mea culpa. Donald Trump também se arrependeu, mas não vai confessar, vai morrer dizendo que tudo estava planejado. Nesse aspecto, nosso presidente é figura ímpar no mundo. A imprensa internacional tem se referido a ele como ‘negacionista do coronavírus’”.

Osmir finaliza dizendo que é cedo para avaliar quais serão as consequências dessa crise. “Sabemos que o mundo não será mais o mesmo. Muitas empresas irão quebrar, muitos perderão seus empregos, outros perderão suas vidas. Os sobreviventes irão avaliar as atitudes dos governos. Ao passo que os governantes terão que prestar contas de seus atos, e também de suas omissões”.

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