Desafios e adaptações das igrejas e eventos cristãos durante a pandemia

Katiane Fermino
Agência Comunitária de Notícias
11 min readSep 25, 2021

Retiros, eventos, cultos, grupos de oração e movimentos foram parados por um vírus que mudou a humanidade.

Foto da Paróquia de Nossa Senhora Aparecida, em Natal, que representa a situação de diversas igrejas de todo o país. Foto: Douglas Lemos/Inter TV Cabugi.

A humanidade toda passa por um momento atípico da história do mundo, a pandemia do novo Coronavírus causou mudanças em todo o modo de se viver porque os seres-humanos são acostumados com contato, abraços, beijos e carinhos. Pessoas passaram a usar máscaras, crianças não podem brincar juntas em parques, festas foram canceladas, trabalhos passaram a ser em home office e a espiritualidade passou a ser vivida de uma maneira diferente.

Para tratar do âmbito espiritual, os fiéis se direcionam às igrejas, onde os momentos de encontro com si mesmo, os irmãos de caminhada e Deus são realizados. Como todas as outras áreas, as igrejas sofreram as dores do isolamento social, distanciamento, redução de fiéis nas celebrações e outros inúmeros resultados gerados pela covid-19. Os cuidados tanto físico, como os protocolos de segurança, quanto mental são importantes, por isso muitas pessoas recorrem às religiões para a busca de paz interior.

No dia 20 de março de 2020 o decreto municipal n° 15.313 proíbe a realização de qualquer atividade em igrejas, como missas, cultos, confissões e reuniões na cidade de Cascavel. A partir desse momento tudo passa a ser on-line. Entre vários decretos que liberava, fechava, reduzia e aumentava a capacidade de público nessas atividades, no dia 08 de junho de 2021 a lei municipal nº 7.240 reconheceu as igrejas e os templos de qualquer culto como atividade essencial no município de Cascavel. A partir daí, as igrejas passaram a acolher 50% da capacidade.

Diante desse cenário, como as instituições religiosas têm buscado desenvolver seus trabalhos? Qual a situação de eventos e grupos de oração, que buscam trazer conforto espiritual, especialmente num período de tantas mudanças? Para responder sobre isso, a reportagem conversou com diferentes pessoas que passam por essa luta.

Servidores públicos em busca da união entre pessoas de diferentes religiões

A prefeitura de Cascavel tem um grupo de oração voltado para a religiosidade dos cristãos, católicos e evangélicos. A participação é, na maioria, dos servidores públicos, mas o grupo também é aberto a todos que querem compartilhar do momento.

A servidora e coordenadora do grupo, Denise Pandolfo, fala como foi lidar com o grupo de oração no decorrer da pandemia. “Durante o ano de 2020, nós tivemos que cancelar o grupo de oração, para manter as medidas sanitárias, e não optamos pelo grupo on-line. Foram momentos de muita escuta e oração pessoal”. Depois de um ano sem o momento de louvor e agradecimento, em março de 2021 o grupo presencial retornou, mantendo as regras de distanciamento e o uso de máscaras.

Grupo de oração da prefeitura.

Por se tratar de um grupo ecumênico, é feita uma troca de cuidados para a organização do louvor, uma semana quem conduz são os católicos, pela coordenação da própria Denise; na outra, os evangélicos, pela coordenação do pastor Daniel Orlandi. Eles revezam os representantes, mas o objetivo é sempre a busca pela intimidade com Deus. “Independente de qual religião está conduzindo, sentimos o amor de Deus e isso é o importante, a união e a compaixão pelo próximo”, afirma Denise.

Ela acrescenta que o grupo de oração serve para entrega, de si mesmo para com os colegas, a comunidade e toda a sociedade. “Sentimos que o grupo de oração traz paz interior, harmonia no ambiente de trabalho, respeito aos irmãos de outras denominações e, mais do que tudo, levamos a palavra de Deus para todos”.

O grupo de oração da prefeitura acontece todas as quintas-feiras das 8h às 8h25. “ Eu deixo o convite para todos que se sentirem tocados e interessados pela experiência de oração. E a expectativa que tenho como coordenadora do grupo é que ele cresça, tanto em quantidade de pessoas quanto em frutos para o reino de Deus”.

Participantes do grupo de oração na prefeitura.

Clamor por amor a Cascavel

Todos os anos, no mês de agosto, é realizado na Praça da Bíblia de Cascavel, o clamor por amor à Cascavel, o movimento está incluso no calendário oficial de eventos municipais e foi instituído no dia 18 de outubro de 2018 através da lei municipal 6.904.

A lei foi sancionada pelo atual prefeito da cidade, Leonaldo Paranhos, escrita e organizada pelos vereadores Alécio Espinola e Misael Junior, do PSC (Partido Social Cristão); Damasceno Junior, do PSDC ( Partido Social Democracia Cristã); Celso Dalmolin, do antigo PR (Partido Republicano, agora Partido Liberal — PL); Parra, do MDB (Movimento Democrático Brasileiro); e Josué de Souza, do PTC (Partido Trabalhista Cristão).

Pastores e prefeito Leonaldo Paranhos, no louvor pela cidade em Agosto de 2021.

O clamor é organizado, anualmente, pelo presidente da Ordem dos Pastores Evangélicos de Cascavel (OPEVEL), Gilvano Souza. Todos os anos, cada dia do mês de agosto é dedicado para oração e intercessão de um assunto que a cidade, o estado ou até mesmo o Brasil necessita.

“Nasceu do coração de Deus pela necessidade que temos de ser uma igreja de oração, sentimos a vontade de orar de forma objetiva, por causas específicas. Estamos vivendo um momento de pandemia e muitos sofrimentos, então cremos que as orações movem os céus e podem trazer curas e restauração”, afirma Gilvano.

Mas os anos de 2020 e 2021 estão sendo atípicos por conta da pandemia, por isso agora a equipe de organização reserva um dia para cada igreja, assim o pastor responsável leva uma equipe de mais ou menos 20 pessoas e realiza o momento de oração. Tudo que envolve um grande ajuntamento de pessoas é um grande desafio: é preciso uni-las mantendo certo distanciamento. Então a orientação do presidente para os pastores é que cada um cuide com o limite de pessoas que leva à Praça da Bíblia, a fim de respeitar os protocolos de segurança municipal.

Fiéis no movimento clamor por amor à Cascavel, na Praça da Bíblia em Agosto de 2021.

O Clamor por Amor a Cascavel tem como intenção orar pelo país, pela cidade, por vidas, pelo corpo clínico dos hospitais e por todos os profissionais. “Oramos para que Deus venha capacitar eles. E a cada ano levantamos uma bandeira específica, a desse ano foi a oração pelo Brasil e pela pandemia” acrescenta Gilvano.

“Qualquer pastor que está integrado à OPEVEL pode participar com os fiéis, temos os canais de comunicação para contato. O pastor que desejar pode se inscrever com sua equipe e entrar na escala. Cada dia do mês de agosto, um pastor fica responsável. Se fechar os 30 dias não tem problema, desde que haja distanciamento” explica o pastor.

De acordo com o pastor, a expectativa para o próximo ano é fazer algo mais amplo, já que o movimento foi restringido por conta da pandemia. A ideia é fazer algo maior e intenso para integrar o máximo de pessoas e igrejas da cidade no evento. Mas as possibilidades serão estudadas dentro da realidade da pandemia e da cidade. O presidente da OPEVEL acrescenta: “Ano que vem esperamos estar mais flexível, para podermos realizar o sonho de Deus para Cascavel, a evangelização”.

Um chamado de amor para o mundo

O Ministério das Universidades Renovadas (MUR), que tem como lema “Um chamado de amor para o mundo”, é integrado ao movimento da Renovação Carismática Católica (RCC). Eles realizam nas universidades de Cascavel, grupos de oração de 15 minutos, a fim de auxiliar os universitários na vida espiritual. Para um aprofundamento da espiritualidade, todos os meses eles realizam um encontro de oração em união com todas as universidades, denominado “Abastecimento”

Os encontros de oração nas universidades eram realizados toda semana de modo presencial, para qualquer acadêmico. A missão dos grupos de oração, durante a pandemia, é aproximar o universitário para uma intimidade com Deus, mostrar como agir no trabalho e na faculdade diante das muitas provações e dificuldades.

A coordenadora arquidiocesana do MUR, Luana Assunção Delgado, fala como é para o jovem passar pelo momento de transição para a vida adulta. “Muitos jovens deixam de acreditar no que aprenderam por estar em uma nova vida, que agora é adulto e sozinho, por isso nos apoiamos e somos muito unidos, para nos auxiliar tanto nos estudos quanto no trabalho, mostrar que existe um Deus, que ama a todos”.

Em 2020 e 2021 a mudança de estilo de vida é brusca e altera toda a rotina de quem trabalha e estuda em ambientes diferentes, para apenas a tela do computador. Agora, sozinho para estudar, trabalhar, ter uma vida espiritual e lidar com a perda de pessoas queridas para a COVID-19, como amigos e familiares. “Isso muda a perspectiva do jovem, muitos vieram me perguntar o que fazer, e que estavam passando por luto, desânimo e tristezas. A minha resposta foi a fé, viver em comunidade, como grupo de oração e a reinvenção para um novo modo de viver a vida”, conta a coordenadora.

São oito Grupos de Oração Universitário (GOU´S) e um Grupo de partilha de profissionais (GPP) na Arquidiocese de Cascavel, alguns pararam, outros passaram a ser de forma on-line e dois deixaram de existir ou se uniram a outros.

Acadêmicos no Grupo de Oração Universitário São Francisco de Assis, do centro FAG.

O GOU do Centro Universitário FAG continuou durante todo o ano de forma on-line e voltou às atividades presenciais no dia 30 de Julho com uma homenagem à professora de ciências contábeis, Márcia Kounrouzan, que faleceu de câncer na mesma semana.

Luana diz que nem todos os participantes continuam indo, tanto nas aulas quanto na igreja, muitos têm receio por ter familiares com comorbidades. “Eles perderam o costume, o compromisso de ir estudar e ir ao grupo de oração. Agora é um período de adaptação e estão voltando a andar em união” diz a coordenadora.

O momento de adaptação foi vivido com incertezas e grandes expectativas. “Ficamos na expectativa de voltar ao presencial, dúvidas de como fazer de forma on-line, mudar a realidade de tantos estudantes, sair de uma sala ou da capela de dentro da faculdade e ir para a tela de computador, foi um grande desafio. As lives e ferramentas de reunião, que antes eram usadas de forma esporádica, para fazer uma live de divulgação, viraram rotina para todos os grupos de Cascavel e passamos a aprender na prática”.

A expectativa dos grupos de oração é trazer cada vez mais pessoas para o movimento. “Queremos levar o sonho de amor para o mundo dentro das universidades, resgatar essa identidade para os jovens, trazer novas pessoas para o movimento e fazer ele reconhecido em toda a cidade. Para que mais universitários possam conhecer e passar a participar. Porque ninguém gosta do que não conhece”, conclui a coordenadora do MUR.

Acadêmicos de todos os GOU’s de Cascavel no abastecimento (encontro de oração extraordinário).

Retiro de primeira experiência para jovens

O Restaura Jovem é um retiro de primeira experiência organizado pelo Ministério Jovem (MJ) da Renovação Carismática Católica (RCC). Foi incluído no calendário oficial de eventos municipais no ano de 2019, através da lei 7.011.

A lei foi escrita e apoiada pelos vereadores Olavo Santos do PHS (Partido Humanista da Solidariedade); Pedro Sampaio do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira); Jaime Vasatta do PODE (Podemos); Carlinhos Oliveira, Alécio Espínola e Misael Júnior do PSC (Partido Social Cristão); Rafael Brugnerotto do PSB (Partido Socialista Brasileiro); Fernando Hallberg, Serginho Ribeiro e Cabral do PDT (Partido Democrático Trabalhista); Valdecir Alcântara, Mazutti e Rômulo Quintino do PSL (Partido Social Liberal); Policial Madril do PMB (Partido da Mulher Brasileira); Mauro Seibert do Progressistas, Celso Dal Molin do PL (Partido Liberal); Josué de Souza do PTC (Partido Trabalhista Cristão); Roberto Parra do MDB (Movimento Democrático Brasileiro); Dr. Bocasanta do PROS (Partido Republicano da Ordem Social); Nadir Lovera do AVANTE e Paulo Porto do PCdoB (Partido Comunista do Brasil).

Em 2018, antes da pandemia, o retiro foi transferido de salões paroquiais para um centro de eventos, a fim de que nenhum jovem ficasse sem participar dos momentos. Depois da decisão da troca, ele passou a contar com capacidade de 3000 inscrições, que era preenchida facilmente nos lançamentos.

O retiro tem como objetivo trabalhar as diversas áreas da vida do jovem. O coordenador do MJ e do Restaura Jovem, Lucas Gelinski, explica como é realizado. “Trazemos o batismo no espírito santo, o primeiro encontro com Deus. Através do Restaura, temos diversas curas na vida do jovem, como na sexualidade desregrada, na volta de viver a castidade nesse encontro com Deus. Muitos jovens que estão perdidos no mundo da droga, damos esse apoio e ajudamos para a conversão e o servir. Ele é esse divisor de águas na vida de muitos”.

Juventude no retiro de primeira experiência em 2019.

Por conta da pandemia e a fim de respeitar os protocolos de segurança, esse ano o retiro foi reduzido para trabalhar na espiritualidade de apenas 1000 jovens e será realizado no Seminário São José. A expectativa do coordenador é que nos dias 6 e 7 de novembro de 2021 o seminário esteja com todas as cadeiras ocupadas.

“Minha expectativa é que possamos, em primeiro lugar, fazer a vontade do Senhor na vida dos jovens, que possamos ser instrumento na vida de cada um. Para que Deus possa reanimar os corações cansados e abatidos, sem ânimo para lutar, para que Deus possa dar um sopro de inspiração para eles” completa Lucas.

Equipe de organização do Restaura Jovem de 2019.

Teatros que auxiliam na espiritualidade dos jovens

A Nova Igreja Batista de Cascavel, realiza todos os anos os Teatros para a integração e união dos jovens de Cascavel. Eles têm como base a construção de relacionamentos amigáveis e a pandemia limitou esse contato.

O pastor responsável pelas artes e pela juventude, Felipe Albrecht, fala sobre os desafios de lidar com os jovens durante a pandemia. “Creio que foi a maior dificuldade, aqueles que já tinham tendência acabaram desanimando e se isolando, por isso a comunhão foi a maior barreira neste tempo”.

Os ensaios do grupo foram cancelados durante o ano de 2020 e voltaram no dia 4 de setembro de 2021 de forma reduzida. “As expressões de arte, como dança e teatros não foram totalmente canceladas, nos adaptaram para a maneira on-line, mantendo algumas apresentações e ensaios nesse formato” afirma o pastor.

O pastor conta que, depois da liberação para participação de cultos, em março de 2021, os jovens tiveram um pouco de resistência e medo para voltarem a participar dos encontros de oração, mas com o tempo voltaram a retornar a normalidade, com os devidos cuidados de distanciamento, uso de máscaras e álcool em gel.

Felipe ressalta a importância das artes na espiritualidade. “A arte está presente em qualquer meio, a arte faz mais parte do nosso cotidiano do que imaginamos, e usamos ela como ferramenta de levar a mensagem do verdadeiro amor, os jovens entendem o poder da arte e encontram nesses movimentos um propósito”, explica.

Victor Uchoa participa dos teatros todos os anos e explica o porquê de gostar tanto. “É uma das áreas artísticas que sempre tive afinidade, por isso gosto de atuar. Na minha espiritualidade, influencia nas tomadas de decisão, pois, se estou atuando, todos estão olhando, logo tenho que expressar da melhor forma o papel a mim incumbido e isso, na vida espiritual, me leva a buscar mais intimidade com Deus, no objetivo de levar sua palavra sem “heresia” nenhuma. Também é gratificante saber que alguém aceitou a Cristo através de uma peça na qual estive envolvido, dá a sensação de trabalho realizado com sucesso”.

O teatro deste ano será realizado com o projeto Sonho de Natal, teatro que tem como intuito mostrar a magia do natal. Os ensaios foram iniciados no primeiro final de semana de setembro com todas as medidas de segurança e as apresentações seguirão os protocolos sanitários com relação à covid-19.

Teatro a Bela e a Fera, realizado no ano de 2019.

--

--