Feminismo no século XXI

O impacto do movimento na nova geração e seus dilemas atuais

Crédito da imagem: Nadezda_Grapes — iStock
Crédito da imagem: Nadezda_Grapes — iStock

O feminismo é um movimento político social que tem como pauta a luta por igualdade de gênero, ou seja, para que mulheres e homens tenham os mesmos direitos e oportunidades.

Em 1808, o termo feminismo foi utilizado pela primeira vez, pelo filósofo Charles Fourier, ele dizia que a liberdade das mulheres seria um pré-requisito para o progresso da sociedade e do mundo.

O livro “ O que é feminismo”, de Branca Moreira Alves e Jacqueline Pitanguy, diz que “[…] é difícil estabelecer uma descrição precisa do termo, porque ele traduz todo um processo que tem raízes no passado, que se constrói no cotidiano, e que não tem nenhum ponto pré-determinado de chegada. Como todo processo de transformação, contém contradições, avanços, medos, receios e alegrias […]”.

O feminismo não é o oposto do machismo. A base é a igualdade de direitos, e sua luta é contra as atitudes machistas decorrentes da cultura patriarcal em que se constituiu nossa sociedade.

Existem muitas pautas que o movimento evidencia, entre elas estão: combate a violência contra a mulher, maior representatividade feminina na política, igualdade salarial, combate ao assédio e vários outros temas importantes que questionam as desvantagens das mulheres perante os homens.

No período das revoluções liberais, século XVIII, a ideia de liberdade ganhou força, mas foi durante a revolução industrial, no século XIX, que as mulheres finalmente passaram a lutar por igualdade, pois queriam carga horária e salários igualitários.

A história do feminismo é dividida em quatro partes, chamadas de ondas. A primeira foi a luta pelos direitos básicos durante a Revolução Francesa no século XIX. A segunda onda surgiu a partir de 1960 e tinha como principal objetivo a liberdade e autonomia sobre o próprio corpo. A terceira onda, em 1980, debateu principalmente o conceito de feminilidade. Já a quarta onda, a atual, desenvolve-se a partir de 2010, devido ao desenvolvimento digital que impulsionou o acesso das pessoas à informação e mobilização em massa.

A 4° onda do feminismo

Foto: Reprodução/Agência Brasil
Foto: Reprodução/Agência Brasil

O acesso à informação cresceu drasticamente no século XXI, sendo assim, o ciberfeminismo passou a fazer parte do cotidiano das mulheres da atualidade. O impacto desta nova fase já pode ser visto nas novas gerações.

Ana, Erika, Julia e Samela, por exemplo, são meninas entre 12 e 16 anos, que estão em ciclos socioeconomicoculturais diferentes, que ja compreendem as dores do chamado “sexo frágil” na sociedade.

Assuntos como “assédio”, “rivalidade feminina”, “padrões estéticos” e “desigualdade de gêneros” foram pontos comuns entre as respostas em um bate papo feito separadamente com cada uma delas.

“Uma vez, no ônibus, um senhor encostou em mim e eu não tive nenhuma reação, fiquei com medo e fui para perto de outras mulheres”.

“Não concordo que após o almoço as mulheres vão para a cozinha lavar a louça e os homens fiquem conversando e se divertindo”.

“Quando uma menina beija mais que uma pessoa, chamam ela de rodada, mas quando um menino faz o mesmo, ele é pegado”.

“Preciso cuidar da forma que me visto, pois sou alvo de comentários desagradáveis”.

A vivência destas adolescentes, mesmo muito novas, exemplifica as experiências comuns das mulheres. Quando perguntadas sobre o feminismo, três delas se reconhecem como parte do movimento e ainda discorrem sobre a sua importância.

“O feminismo é um pilar importante pra sociedade, pois nós precisamos lutar por igualdade”.

“Acho que o feminismo é um movimento super importante para a emancipação das mulheres do patriarcado”.

“Feminismo é essencial na sociedade em que vivemos, pois é importante para defender os direitos das mulheres e lutar por igualdade”.

A atualidade trouxe facilidade para propagação do conteúdo sobre os movimentos sociais, o que faz diferença na forma como a sociedade lida com a desigualdade.

A geração Z das mulheres

foto: reprodução/ revista Claudia
foto: reprodução/ revista Claudia

Kaoana Sopelsa, doutora em Historia pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) , diretora do podcast @Segundas feministas, mulher não-binariA, pansexual e vegana aponta que a nova geração de mulheres vem mais forte. “Existe uma perspectiva mais humanitária para a nova geração de mulheres, com mais sororidade e menos rivalidade feminina”.

Em contrapartida, ela frisa que ainda existem muitos quesitos a serem alcançados na luta do feminismo.

Alguns temas novos e outros recorrentes como a dupla ou tripla jornada de trabalho das mulheres, a objetificação do corpo feminino, o feminicídio, a intersexualidade, a educação sexual e o bullying são abordados na busca de discussão e compreendimento da sociedade.

“Existem muitas brechas na constituição brasileira que contribuem para a desigualdade de gênero, e, por esse motivo, é crucial que as causas do movimento sejam propagadas para as futuras representantes da bandeira feminista”, afirma Kaoana.

As vertentes do feminismo

FOTO: Marcha das mulheres pela igualdade — Nova York (1970)

Não há definição única para o feminismo, pois ao longo dos anos de luta houve uma separação de vertentes. As principais são: o feminismo liberal, que se organiza na busca dos direitos dentro do sistema capitalista; o feminismo marxista, que, além dos direitos igualitários, também questiona a economia como princípio que contribui com o patriarcado; o feminismo radical, que busca compreender as origens da opressão à mulher;o feminismo negro, que frisa o preconceito racial alem do gênero e entende que as outras vertentes não abrangem todas as causas como a pauta racial; e o feminismo intersexional que parte de uma ideia que, além das questões de genero, considera raça e classe como quesitos determinantes na opressão às mulheres.

O boom do movimento feminista veio a partir da tecnologia, principalmente quando se trata de mídias sociais. Paula Borges, coordenadora do coletivo Florescer Feminista da Univerdade estadual do oeste do parana (Unioeste), aponta que “O feminismo liberal, mesmo que não sendo uma revolução e apenas uma melhoria da opressão é a porta de entrada para o conhecimento sobre o movimento e seus ideais, por isso acaba sendo importante para proliferação de informações”. Ela ainda questiona o tom mercadológico que esse tipo de conteúdo propicia, já que é direcionado a um público padronizado, excluindo a pluralidade dos tipos de mulheres.

A cultura pop, por exemplo, é uma das maiores referências do feminismo para a juventude por meio das mídias alternativas.

Isso está diretamente ligado à representatividade, que também é um ponto importante quando falamos de feminismo para a geração Z. Para fugir das bolhas que mascaram ainda mais a ideia de igualdade de direitos, ter pessoas com as quais se identificam é um incentivo para todas as mulheres.

O feminismo negro, por exemplo, direciona a atenção ao lugar das relaçoes sociais em que mulheres pretas e brancas estão. O objetivo é mostrar as realidades diferentes e resquícios culturais que impactam de forma negativa em maior número e de diferentes formas para as mulheres pretas.

A luta não pode parar

foto: Marcha das mulheres pela igualdade — Nova York (1970)

Por mais que a informação esteja chegando cada vez mais longe, ainda existem muitas meninas e mulheres que não tiveram contato com o feminismo e não entendem o que ele representa, por isso, discutir sobre o assunto nunca é demais.

Kaoana destaca que o feminismo aborda incontáveis temas, todos muito importantes para o desenvolvimento igualitário entre os gêneros na sociedade. Feminicidio, estupros, prostituição, gestação, virgindadde, violência física e piscológica, transfobia e muitos outros são pautas necessarias para o crescimento intelectual de qualquer individuo. “É indispensável que o movimento nunca pare, e adquira cada vez mais força para seguir conquistando espaço e reconhecimento”, finaliza.

“Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante toda a sua vida.” Simone de Beauvoir

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