Histórias de Fronteira

Thiago Willian
Agência Comunitária de Notícias
4 min readMar 29, 2020

Brasileiros impedidos de voltar ao Brasil e sofrimento de população pobre com a pandemia provocada pelo novo coronavírus

Foto: Assessoria de Imprensa Polícia Militar

A pandemia provocada pelo novo coronavírus divide opiniões. De um lado, pessoas defendem medidas de isolamento domiciliar e social; do outro, a opinião é de que a economia não pode parar por conta do vírus. No meio desse cabo de guerra de qual é a melhor ação adotada pelos governantes, está a fronteira mais movimentada do Brasil, em Foz do Iguaçu, que teve o fluxo de veículos e pessoas interrompido.

A Ponte Internacional da Amizade liga o Brasil ao Paraguai. São 600 metros por onde passam diariamente mais de 40 mil veículos e pelo menos 100 mil pessoas de todos os cantos do mundo, local ideal para a propagação do vírus. A estrutura liga a cidade turística de Foz do Iguaçu à Cidade do Leste, paraíso de compras do lado paraguaio. Para reduzir os riscos de transmissão da Covid-19, os governos dos dois países determinaram o fechamento da fronteira, e o que restou foi um cenário parecido com o “deserto”.

Em meio à crise gerada pelo coronavírus, uma família do Paraguai roubou a cena e chamou a atenção para o bloqueio das fronteiras. Com malas nas mãos, quatro pessoas, entre elas uma criança, foram a pé em direção à Cidade do Leste. Desempregados pelo fechamento do comércio de Foz do Iguaçu, a família não teve opção a não ser retornar ao país natal, que também determinou o fechamento do comércio, ou seja, continuam sem alternativa.

Foto: Portal Catve.com

No Brasil, eles ganhavam a vida vendendo doces e artesanatos nos terminais de ônibus e pontos turísticos da cidade e moravam de forma improvisada na casa de amigos. Segundo informações da Polícia Rodoviária Federal, a família conseguiu cruzar a fronteira e deve ficar em quarentena, conforme orientações da Organização Mundial da Saúde. Aos inspetores da PRF, a família informou que não sabe para onde vai, pois os parentes moram em Assunção, localizada a cerca de 357 quilômetros da fronteira, mas esperam ajuda do governo paraguaio.

O jornalista Júnior Rocha, de Foz do Iguaçu, comenta sobre a situação em que a cidade se encontra. “O município decretou estado de emergência. Resumindo, a cidade está parada, não se pode sair de casa. Aqui já registramos casos confirmados de coronavírus e temos cerca de 70 leitos, mas as autoridades de saúde não sabem se será suficiente para atender todos os pacientes, pois ainda estamos no período inicial da doença, não atingimos o pico, que deve ser nas primeiras semanas de abril”.

A cidade já contabiliza cinco casos confirmados de Covid-19 e investiga outros 140. “Outro fator que preocupa as autoridades do município é de que Foz do Iguaçu é uma cidade fronteiriça, e isso facilita o aumento de casos, as duas pontes que levam ao Paraguai e Argentina estão bloqueadas, apenas caminhoneiros com cargas podem passar”, relatou Rocha.

No Peru, um empresário cascavelense disse que o fechamento das fronteiras provocou transtornos aos brasileiros que encontraram dificuldades para retornarem ao Brasil. João Biasio relatou que viu brasileiros passando fome por falta de ajuda do governo. “Eu fiquei em boas condições, paguei um hotel, mas vi pessoas que ficaram sem comer e sem onde dormir, ficaram abandonados, sem ajuda dos governos”, comentou o empresário.

Foram quase dez dias “preso” no Peru. João comentou que os brasileiros se ajudavam como podiam. “Apesar das dificuldades, nos ajudávamos, na medida do possível, porque não sabíamos por quanto tempo iríamos ficar lá, era um futuro incerto, não tinha ônibus e nem avião para ir embora”.

O empresário só conseguiu deixar o Peru quando o governo brasileiro enviou um avião da Força Aérea para resgatar o grupo. “Eu consegui voltar para casa, mas ainda ficou bastante gente por lá, creio que só na cidade que eu fiquei, Cusco, sejam mais de 250 brasileiros. Será um trabalho difícil, mas que precisa ser feito e com urgência”, encerrou João Biasio.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a estimativa é de que cerca de 2,5 milhões de brasileiros vivam no exterior. O fechamento das fronteiras vai muito mais além das barreiras econômicas, ou do certo ou errado. Do outro lado da fronteira, existem histórias, milhares delas, que não podem ser descartadas, todas são importantes.

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