O que muda nos direitos do trabalhador durante período de isolamento

Esane Barreto
Agência Comunitária de Notícias
5 min readApr 14, 2020

Antecipação das férias e suspensão de contrato de trabalho são algumas das alterações

Foto: Shutterstock

Em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, muitas pessoas passaram a trabalhar de suas casas, o chamado home office. Nem todos, contudo, podem exercer sua ocupação nesse sistema e aqueles cujas funções não permitem essa nova rotina permanecem em isolamento, cheios de dúvidas e receios.

Essa é a situação da camareira Eliene Ribeiro que, desde que foi decretado o isolamento social, ouviu do seu empregador que ela seria suspensa do trabalho por alguns dias, mas sem previsão de retorno.

“Ele disse que não são férias, mas tenho medo de ser dispensada quando voltar”, conta a camareira.

O caso da Eliene se aplica na MP 936/2020, que assegura a permanência do trabalhador na empresa durante o afastamento e até 60 dias após o seu retorno ao trabalho. Ou seja, o emprego fica garantido por lei durante quatros meses após o aviso de suspensão.

A advogada e analista judiciária do Tribunal Regional do Trabalho/PR, Márcia Peixoto, explica que a MP 936 trouxe a possibilidade de suspender o contrato de trabalho pelo prazo de até 60 dias, podendo ser fracionado em dois períodos de 30 dias. “O empregador tem que garantir, durante o período da suspensão mais os 60 dias seguintes, que não vai dispensar o empregado sem que ele cometa falta grave”, detalha.

Enquanto estiver em isolamento, o empregado que tiver o contrato suspenso, terá direito a um benefício pago pelo governo. Esse “socorro”, no entanto, não passa do valor de um salário mínimo. Por exemplo, se o trabalhador ganha R$ 1,5 mil mensais e for suspenso, terá direito a receber o equivalente ao que receberia no caso do seguro-desemprego, usado nas demissões, ou seja, o valor do salário mínimo. Independente de suspensão de contrato, o direito ao salário desemprego está assegurado normalmente, para o caso de demissão futura.

Quanto ao INSS, Márcia diz que, durante a suspensão de contrato, o empregador não faz o recolhimento da contribuição previdenciária. O trabalhador é que terá que fazer o recolhimento, de 7,5%, sobre o valor do benefício recebido. Ele poderá recolher como se estivesse na condição de autônomo. Caso não seja feito, pode perder a qualidade de beneficiário do INSS.

Houve mudanças também no que tange ao adiantamento das férias. Segundo a advogada, pelo regime celetista, as férias são concedidas aos trabalhadores que tiverem completado 12 meses na empresa. Para isso, o empregador deve comunicar o funcionário, por escrito, com antecedência mínima de 30 dias.

Mas, com a medida 927/2020, o empregador pode antecipar as férias dos funcionários, mesmo que não tenham completado o período aquisitivo de serviço. E o empregador pode avisar ao empregado com até 48 horas de antecedência. Márcia destaca que as particularidades dessa medida continuam. Enquanto pela CLT o pagamento das férias, acrescido de mais um terço, tem que ocorrer em até dois dias antes do início das férias, com a Medida Provisória, ficou diferente: “O empregador pode pagar as férias junto com o salário, ou seja, até o 5° dia útil do mês subsequente ao do início das férias e o terço constitucional, em vez de pagar junto com as férias, pode ser pago até o vencimento do 13° salário, que é até o dia 20 de dezembro”, explica Márcia.

Férias antecipadas

A operadora de telemarketing, Edilaine Viana de Oliveira, foi comunicada pelo empregador que teria suas férias adiantadas. Com apenas sete meses de serviços prestados, ela não esperava receber o benefício neste momento. O susto veio depois que foi informada sobre as mudanças nos prazos de pagamentos.

“ A gente tem conta, tem aluguel, tem luz, eu tenho um neném. Eu fiquei preocupada, tentei conversar, ver o que eles podiam fazer pra ajudar, mas não tem muito o que fazer, né?! O governo liberou, eles estão dentro da lei, então eu tenho que acatar. A gente tá economizando de todos os lados, se apertando pra conseguir resolver a situação.”

A analista do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), Márcia Peixoto, diz que esse prazo serve para dar um fôlego ao empregador, já que ele não estava planejando conceder férias ao empregado neste momento. O mesmo vale para a concessão de férias coletivas da empresa ou de um determinado setor. O que diferencia das férias individuais é que, nesse caso, o empresário não precisa comunicar a Secretaria do Trabalho e nem mesmo os sindicatos. O aviso fica limitado apenas aos funcionários.

De acordo com a CLT, as férias coletivas devem ter, no máximo, dois períodos, com duração mínima de 10 dias cada. Mas, diante dessa situação excepcional, essa regra pode sofrer alterações em razão da possibilidade de fechamento provisório das empresas.

A medida provisória 927 ainda prevê a possibilidade de antecipação de feriados. Ou seja, parte ou o total das folgas que o empregado receber durante o isolamento podem ser compensadas com as folgas que ele receberia no feriado. Essa decisão cabe somente ao empregador, exceto para feriados religiosos. Nesse caso, deve haver concordância por parte do trabalhador.

Mas, por mais que a MP editada tente amenizar as consequências econômicas para empresas e trabalhadores, não alcança a todos. Um estudo divulgado nesta semana pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) informa que a pandemia do novo coronavírus pode deixar um saldo de 12,6 milhões de desempregados no país. O Instituto diz que, no pior cenário econômico, o nível de desemprego saltaria dos atuais 11,6% para algo próximo a 24%, nos próximos meses.

Muita gente perdeu o emprego mesmo em decorrência da pandemia. Sarah Sousa é um desses casos. Ela era operadora de caixa num restaurante localizado no aeroporto de Salvador e, com a queda nas demandas de voos e cancelamentos, o fluxo no estabelecimento caiu e o empregador não viu outra opção senão dispensar parte de seus funcionários. Mas criou a expectativa de possível recontratação quando tudo voltar ao normal.

“Ele disse que nosso trabalho era bom, mas que ele não conseguia arcar com os pagamentos dos outros meses. Disseram que quando tudo passasse eles gostariam de contratar alguém que já conhecesse o ritmo do lugar”, conta.

Segundo Sarah, em torno de 40 pessoas foram demitidas somente neste estabelecimento. No aeroporto, apenas o check-in continua funcionando e uma ou outra loja, como exceções.

Sobre o que espera do futuro, Sarah diz que tem fé no que está por vir depois da crise. Ela confia nas palavras do ex-chefe e acredita que sua vaga estará garantida no lugar onde trabalhava e completa:

“Era um lugar bom, eu gostava. Enfim, eu acredito que vai dar tudo certo no final!”

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