Sua equipe está comemorando?

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No livro “The Startup Way” (2017), Eric Ries explora o conflito das empresas entre manter os negócios atuais e serem inovadoras, para isso propõe que os modelos de administração tradicional e empreendedor convivam. Os gestores precisam de mecanismos para fazer a separação entre a prática que garante a sobrevivência a curto e médio prazo e a experimentação que leva à evolução e futuro da corporação. Em um dos casos explorados, um executivo envolvido em experimentações e também nos produtos tradicionais da empresa, com prática em cobrar resultados e justificativas quando as coisas não saem como o planejado, decide experimentar a abordagem de “Startup” em uma iniciativa tradicional e faz as seguintes perguntas a um colaborador que logrou insucesso: O que você aprendeu? Como você sabe? Com o aprendizado ele percebeu que a situação era bem mais desafiadora e incerta do que inicialmente imaginado e agora teria insumos para avaliar uma mudança de estratégia. Desta forma, embora existam dois modelos de administração, a empresa é única e a inovação não deveria ser atribuição de um único setor, mas de toda a organização. Assim as métricas e responsabilização tem que estar alinhada com o tipo de iniciativa para gerar engajamento e motivação nas pessoas. Para gerar este engajamento, não basta propagandas e faixas pedindo aos colaboradores que tenham “sentimento de dono” e “comprometimento” enquanto a responsabilização e os processos levam à uma cultura de punição pelas falhas ao invés de incentivo à inovação e aprendizado.

Triangulo dividido em quatro partes. Com as seguintes palavras de baixo para cima: RESPONSABILIZAÇÃO, PROCESSOS, CULTURA E PE
Triangulo dividido em quatro partes. Com as seguintes palavras de baixo para cima: RESPONSABILIZAÇÃO, PROCESSOS, CULTURA E PESSOAS.

Isto também nos leva a seguinte questão: devemos celebrar as falhas ou devemos comemorar o sucesso? Jurgen Appelo em Management 3.0 (2011) propõe um meio termo. Assim como Ries, ele separa as práticas do dia-a-dia das experimentações e propõe uma dinâmica chamada “Celebration Grid” que consiste de uma grade que mapeia o aprendizado separando sucessos, falhas e levantando o aprendizado.

Imagem da dinâmica do celebration grid do management 3.0. Consiste em três colunas com os títulos ERROS, EXPERIMENTOS e PRÁTICAS. Do lado esquerdo do quadro tem o título FALHAS e do lado direito tem o título SUCESSO. Há uma linha diagonal cortando as três colunas, do canto superior esquerdo até o canto inferior direito (desta forma, Falha representa metade do quadro e sucesso a outra metade). Abaixo está escrito aprendizado com uma forma indicando que se aprende mais no experimento e menos na prática e nos erros.

Temos escritores que clamam que “aprendemos somente quando falhamos” ou que devemos “nos permitir falhar”, já outros colocam que devemos “focar no sucesso” e que “sucesso gera sucesso”.

Para esta questão Jurguen coloca que estudos sobre sistemas indicam que se aprende mais quando as falhas estão em torno de 50%. Desta forma, quando os experimentos têm iguais chances de sucesso e fracasso, geram mais informações para o aprendizado pois tanto falha como sucesso geram aprendizado e aprendemos mais quando experimentamos coisas que nunca fizemos.

Por outro lado, quando apenas repetimos práticas estabelecidas, como podemos saber se poderíamos fazer melhor?

Da mesma forma, se cometemos sempre os mesmos erros, então também não estamos aprendendo nada novo.

O aprendizado acontece quando você pensa “Eu não sabia disto, mas estou feliz por ter descoberto porque agora posso fazer melhor!”. Para isto precisamos incentivar a inovação.

Então, ao invés de simplificações como “eliminar as falhas” ou “celebrar as falhas” e celebrar os sucessos ou falhas, vamos criar um ambiente onde podemos celebrar o aprendizado.

Mas tanto excessiva como insuficiente probabilidade de falha reduzem a eficiência de gerarmos informação, então as organizações não deveriam ter como meta minimizar a quantidade de falhar, assim como não faz sentido maximizar os erros. É necessário maximizar a compreensão dos seus problemas e a meta deveria ser encontrar a taxa de aprendizado ideal.

É uma boa ideia focar em boas práticas ao contrário de punir erros pois você tende a ter mais daquilo que você foca e também é positivo discutir práticas já conhecidas, pois estaremos reforçando boas práticas e é provável que outras pessoas passem a adotar estas práticas.

Quando você da ênfase nas boas práticas, criando rituais para celebrá-las, além das pessoas criarem mais boas práticas, elas irão ficar mais livres para usar seu poder mental para aspectos mais incertos e complexos do trabalho. Este princípio de criar rituais para simplificar a tomada de decisões também foi usado na criação do framework Scrum e suas cerimônias que simplificam a vida dos times.

O cérebro humano é programado de forma a ter uma quantidade limite de decisões que podem ser tomadas diariamente, então boas práticas que simplificam ou evitam decisões economizam recursos celebrais para serem usados em tarfas criativas.

Por isto temos vantagens em sempre celebrar o sucesso, seja ele vindo de erros, experiências ou práticas. Pode não fazer muito sentido comemorar falhas originadas em erros, porem o aprendizado das falhas originadas de experiências certamente precisam ser celebradas. Mesmo falhas de práticas parecem ser fonte de aprendizados importantes e merecem ser celebrados.

Para o caso do sucesso originado de uma falha, considere a descoberta de penicilina, pela história foi um erro operacional que levou à sua descoberta. Uma outra situação interessante pode ser uma falha originada em uma prática. Imagine que cartões de agradecimento (como kudo cards) são distribuídos entre os membros da equipe de forma espontânea, nesta situação uma pessoa não recebendo pode ficar desmotivada e isto poderia ser considerado como uma falha em uma prática. Ao aprender com isto podemos tomar ações e gerar a melhoria do sistema.

Para a dinâmica do “Celebration Grid” os membros de uma equipe, setor, board, etc. Montam o grid e passam a responder algumas perguntas poderosas escrevendo livremente em “post-its” o que aprenderam no período analisado e colocam nas áreas do grade onde consideram que melhor se encaixa.

Perguntas poderosas são questões abertas que levam as pessoas a refletir. Existem várias alternativas para estas perguntas como as mencionadas anteriormente, também posso indicar as seguintes para a dinâmica:

· O que fizemos bem (seguindo as práticas)?

· O que aprendemos (executando experimentos)?

Particularmente prefiro usar as seguintes:

· Qual comportamento gerou sucesso?

· Qual comportamento gerou falha?

Faça a primeira pergunta e aguarde todos colocarem as suas respostas no quadro, então faça a próxima pergunta. Isto deve estimular na identificação de falhas. Sempre é mais fácil identificar sucessos.

Triangulo dividido em quatro partes. Com as seguintes palavras de baixo para cima: RESPONSABILIZAÇÃO, PROCESSOS, CULTURA E PESSOAS.

Após isto podem agrupar por similaridade e alguém passa a ler as anotações e avaliar em grupo se está ou não no local correto. Proponho que a cada item de aprendizado avaliado seja feita uma celebração. Abraços, Palmas, dancinha, sino, qualquer coisa que faça sentido para o grupo. Esta celebração deve ser sincera, visível, memorável e única como uma assinatura do grupo. A cerimônia da celebração é uma poderosa energizadora que gera motivação e cria identidade na equipe, além disto neste contexto passa confiança para que todos possam manifestar-se. No livro “Scrum a arte de fazer o dobro do trabalho na metade do tempo”, Jeff Sutherland dá o exemplo do Haka feito pelo All Blacks que é a seleção de hugby da Nova Zelandia. Segundo ele está dança passa uma energia de cada jogador onde quem assiste pode perceber a unidade.

Adicionalmente passei a experimentar questões complementares para a definir as ações para melhoria contínua e para isto desenho um funil na parte de cima do grid.

Foto de um quadro de Celebration Grid com post-its e que tem um desenho de um cone na posição horizontal na parte de cima com a parte maior para a esquerda.

Então após a fase de levantamento de aprendizado e celebração, para levantar oportunidades de melhoria proponho a seguinte questão para o time: Quais novos experimentos podemos fazer?

Baseado nos pontos discutidos analisamos como podemos melhorar. De forma livre todos podem fazer sugestões sobre o que podemos fazer como ação de melhoria, escrevemos nos post-its e colamos no funil.

A pergunta final serve para convergir e reforçar o comprometimento de todos buscando um consenso sobre quais ações serão executadas: Com quais podemos nos comprometer?

Então podemos usar votação por pontos (por exemplo) e mover as escolhidas para o final do funil.

A prática do “Celebration Grid” une retrospectiva e futurospectiva ajudando a não cairmos na “lavação de roupa suja” e contribuindo para construir um ambiente seguro. Isto não significa que não podemos fazer críticas, podemos e devemos sempre de forma construtiva e focando nos resultados e não nas pessoas. Por isto seja claro e apresente evidências. Considere também que profissionais iniciantes reagem melhor a feedbacks positivos enquanto que para os experts o feedback negativo é mais efetivo. E não se esqueça de celebrar, não fique limitado a celebrar nas reuniões de melhoria continua ou retrospectivas, pois as celebrações devem ser frequentes para fortalecer o sentimento de união, pertencimento e incentivar o aprendizado.

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Edson Antonio de Lima
Agile lean thinking and Business Agility

Agile Coach, Consultant, Facilitator and Instructor of Agile Methods, Lean Inception and Management 3.0. https://www.linkedin.com/in/edsonalima/