#paracegover: uma ilustração colorida com o fundo azul claro. No lado esquerdo, tem uma cadeira de rodas preta, com um rosto sorrindo no encosto dela e um balão de fala escrito "Woohoo!". Ela possui dois braços que estão movimentando as rodas, de um lado para o outro. No lado direito, uma cadeira de madeira não possui braços e permanece estática. Seu rosto expressa descontentamento.

Teoria do Beija-Flor e os espaços acessíveis

Malu Dini
Agile Content Teamwork
5 min readMay 29, 2018

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É engraçada a história de como surgiu a Teoria do Beija-Flor. Eu sempre achei o beija-flor um tipo de passarinho muito bonito e diferente. As curiosidades sobre ele são bem impressionantes e um dia desses minha atenção voltou-se pra ele. Tive a dúvida de como poderia chamá-lo em uma cidade urbana como São Paulo, que possui pouquíssimas árvores e flores. Mais especificamente para a janela do meu quarto — aliás, deve ser uma delícia acordar com passarinhos em casa, não? Depois de algumas pesquisas descobri que, para chamar o beija-flor, bastava implementar um bebedouro colorido com água limpa e açúcar. Com o tempo ele descobriria esse novo recurso e viria até mim. E era isso. Simples assim.

Você deve estar se perguntando o que essa teoria tem a ver com a construção do espaço seguro e acessível, certo? Te explico: acontece que algumas pessoas são uma espécie de beija-flor. E falo especificamente dos grupos de minorias.

Uma observação: Utilizo como termo minoria, o grupo de pessoas que tem menos direitos e/ou se encontram fora do padrão determinado pela sociedade. Portanto, não o digo no sentido quantitativo, embora sejam impressionantes as medidas desproporcionais, por exemplo, com relação à quantidade de pessoas com deficiência no mercado de trabalho comparada à quantidade total de pessoas com deficiências no Brasil. (Segundo o Censo Demográfico do IBGE, 24% dos brasileiros possuem algum tipo de deficiência e apenas 0,77% das pessoas com deficiências estão formalmente inseridas no mercado de trabalho. Fonte: Estadão.)

Acessibilidade (ou a falta dela) VERSUS Tecnologia de Informação

Diariamente as pessoas com deficiência sofrem com a falta de acessibilidade em lugares privados e públicos. As barreiras de comunicação afetam a comunidade surda e as pessoas com deficiência auditiva pela falta de legendas em vídeos e ausência de intérpretes de língua de sinais (Libras). Calçadas esburacadas, elevadores quebrados, entradas pequenas, banheiros não-adaptados afetam tanto cadeirantes quanto pessoas com mobilidade reduzida. A falta de pisos táteis e referências sonoras afetam as pessoas cegas. Enfim, a lista é longa.

Partindo por essa lógica, por que a área de Tecnologia de Informação seria diferente, então?

Resposta: ela não é diferente. Não restam dúvidas de que a tecnologia veio para facilitar a vida de todos mas, para as pessoas com deficiência, ela conseguiu transformar algumas coisas inacessíveis em possíveis. A exemplo disso, temos o boom do WhatsApp e redes sociais que tornaram o acesso possível para as pessoas surdas se comunicarem por escrito, sem precisar fazer qualquer ligação ou gastar uma fortuna, como fazíamos há um tempo com SMS — ou não fazíamos. O mesmo serve para as pessoas cegas, com a chegada dos leitores de tela cada vez melhores e capazes de reconhecer diversas línguas do mundo.

O Youtube e o Facebook possuem agora um recurso para criar legendas e closed caption. Quantos de nós estamos preocupados e habituados em sempre transcrever um vídeo de 3 minutos, por exemplo? Quando postamos uma linda imagem com um texto, estamos lembrando de que os leitores de tela ainda não são capazes de transcrever uma imagem para uma pessoa cega? Estamos habituados a não nos apoiar somente nas cores como indicativos, mas adicionar também, alguma legenda ou ícones simples e com contrastes, para as pessoas com autismo e/ou daltônicas?

O que diferencia nós que trabalhamos na área de Tecnologia de Informação dos profissionais de outras áreas, é que temos bastantes recursos, tanto tecnológicos quanto sociais pelo privilégio e acesso às informações e notícias mas mesmo assim ainda não estamos maduros o suficiente para utilizar a tecnologia a favor de todos e todas. A tecnologia avança e evolui

cada vez mais rápido à medida que a nossa consciência humana está cada vez mais longe e atrasada. E o mais contraditório disso tudo, é que a tecnologia só existe graças à consciência humana.

Começando pelo começo

Agora, fazendo ponte com a Teoria do Beija-Flor: quando a gente trabalha, transita e frequenta ambientes presenciais e virtuais pensados somente para pessoas sem deficiência, nós, pessoas com deficiência, somos os beija-flores dessa sociedade. Isso significa que, se não tiver o bebedouro com água e açúcar, estão nos dizendo que aquele espaço não é nosso — mesmo que ele seja nosso por direito.

Portanto, é nosso papel social e como profissionais da T.I, implementarmos um bebedouro gigante. Precisamos internalizar uma cultura da acessibilidade, começando pela nossa consciência, mudando nossos hábitos e valores de inclusão e pôr a mão na massa na rotina do trabalho também. E então, como fazer isso?

  • Se você tem um colega ou uma colega com alguma deficiência no seu trabalho, comece a conversar com ele/ela. Troquem experiências. Isso contribui para a construção de novas ideias e agilidade na solução de problemas.
  • Leia artigos, estudos e pesquisas sobre Acessibilidade na Web.
  • Questione a falta de acessibilidade nos eventos de T.I. Com o mercado em expansão, há uma grande probabilidade de vermos mais pessoas com deficiência atuando na área. Logo, é direito de todo mundo ter acesso à informação por igual.
  • Chame os amigos, divulgue os eventos que contam com acessibilidade. Se vai criar um evento, faça um check-list de recursos essenciais para tornar um espaço possível e acessível. Lembre-se, a maioria dos espaços não estão preparados para receber o público com deficiência. Você vai precisar divulgar, por exemplo, que o evento contará com intérprete de libras. Ou que tem entrada para cadeirantes. Ou que haverá audiodescrição. Deixe tudo isso bem claro ou as pessoas com deficiência não se sentirão convidadas.
  • Permita-se errar, sempre. Mas também permita-se entender que errou e diminuir a margem de erros a todo momento. Ninguém nasce sabendo e tudo bem. Estamos aqui para aprender com todo mundo.

É importante lembrarmos que a diversidade existe e não tem como escaparmos dela. No campo de tecnologia e produtos, a diversidade contribui para novas ideias, trabalho em equipe, criatividade e agilidade na solução de problemas. A experiência de cada pessoa que trabalha na empresa, é um passo muito importante para a criação de produtos inovadores. Portanto, usufrua desse privilégio e faça parte desse mundo tão diverso.

E os beija-flores virão.

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