Narcizo, pai.
Sua história começou em 1920, nove anos antes da grande depressão. Seus pais, donos de um armazém em Rio Claro, interior de São Paulo, viviam da renda do estabelecimento.
1929, a quebra da bolsa de Nova Yorque fez com que os agricultores queimassem a colheita de café do ano no porto de Santos. Os pais de Narciso viram o negócio ruir. A família passou grande necessidade.
Narcizo e seu irmão mais novo Olívio passavam o dia caminhando entre plantações de cana e melancia. Lá matavam a fome. Olívio contou que, certa vez, os dois irmãos comeram cana de açúcar e dormiram. Quando acordaram, o canavial estava em chamas — Foi uma infância de muitas aventuras.
Ao chegar ao final da adolescência, a família se mudou para Mogi das Cruzes. Narcizo conheceu Conceição, uma jovem que havia se mudado de Paraibuna para a cidade. Ali nascia a família Carmo.
Extremamente esforçado, Narcizo trabalhou na construção Civil e na indústria. Morou alguns meses em São Paulo, no bairro de Santana. Lá construiu uma casa, bem ao lado de onde poucos anos depois seria construído o presídio do Carandiru.
De volta para Mogi, Narciso trabalhou em uma empresa chamada Griffith, um laboratório alimentício. Ali, ele quase perdeu um braço em um acidente de trabalho. E para se recuperar ficou mais de 40 dias internado em um hospital. A cicatriz no braço nunca lhe impediu de trabalhar.
Quando mais jovem, Narcizo ia todos os Domingo a missa. Preferia a missa das sete, enquanto Conceição ia na missa das nove. Sua bicicleta Peugeot, azul, era sua fiel companheira. O bagageiro grande era perfeito para carregar as verduras que Narcizo trazia do varejão, local que ele frequentava todos domingos após a missa, uma espécie de ritual.
Sua vida foi pautada em honestidade, amor e carinho. Narcizo não era de muitas palavras, mas usava das poucas palavras para compartilhar sabedoria e amor.
A infância difícil lhe deixou cicatrizes que ele carregou por toda vida. Os banhos eram curtos, pois ele tinha medo de gastar energia. O temor que a escassez voltasse, fez com que ele guardasse dinheiro por toda a vida.
Colchão, buracos na parede, esconderijos no guarda roupa, eram alguns dos seus lugares favoritos para confiar suas economias.
De tempos em tempos, Conceição, entre uma faxina e outra na casa, encontrava um desses tesouros, e esses eram dias em que comiam uma carne especial. Narcizo quando descobria ficava possesso, Conceição sempre negava tudo.
Alguns desses dinheiros se desvalorizaram com o tempo. Eram tempos em que Bancos quebravam de uma hora para outra, que a inflação cavalgava em ritmo acelerado.
Quando Conceição partiu, foi como se um pedaço dele tivesse partido. Os dois eram companheiros, amores e tudo mais que um casal pode ser.
O amor dos filhos e sua saúde impecável lhe manteve vivo até os 95 anos. Seu maior legado é ser um exemplo de paciência, honestidade e amor.