Pele divina

por Renato Mateus

Ibrahim
Alan Turing morreu com seios
3 min readSep 23, 2017

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Detalhe da mão de “David”, de Michelangelo

A história que vou narrar se passa dentro de um ônibus. É de dentro da artéria da cidade que pulsam as emoções descritas. Pulsões. Desejos. O ir-vir dos que trabalham, dos espoliados que produzem a ordem social criminosa.

Já se disse que a filosofia é a criação de conceitos. Mas, aqui, não existe o ato de filosofar. Essa escrita é de ficção. E ficção não cria conceitos, a ficção cria mundos. Novos mundos.

Perdido é a atual condição de quem não está sozinho, mas se sente só. Estamos dentro da superlotação, estamos entreolhares de bichos civilizados. Este ser que quer dizer não ao trabalho enquanto vaga pelas ruas molhadas pela chuva.

O ônibus percorre o trajeto de uma hora até chegar na parada de sua casa. E para chegar é preciso dar voltas, é preciso mais de um ônibus. Tudo aconteceu quando já havia embarcado no seu terceiro meio de transporte. Estava ali exausto, olhava o mundo que acelerava e desacelerava pela janela. Uma respiração diferente se aproxima e um arrepio lhe percorre seu órgão mais extenso. Tua respiração muda de compasso, e seu coração bate demasiadamente forte. Uma senhora ao nosso lado sorri. Somos três seres vivos em inconstante pulsação. Sua mão toca e aquecem-se num calor que faz corar.

Aproxima deste corpo que toca suavemente. Rijo percebo seu sexo. Rijo percebo nossos sexos. A senhora ainda sorri enquanto nos olha. Molhado está o seu sexo. Talvez, seja o sorriso de quem se sabe viva. Teu sexo pulsa feito o corpo da jovem lésbica que se ajeita no dorso da namorada. Estar molhada é estar viva no deserto do real.

A mão agora segura o pau latejante. Sente o seu coração pulsando no seu pau. Um cheiro no cangote e desperta. Mesmo que a beleza dê prazer aos olhos goza de olhos fechados. A senhora agora está de fronte à nós: vendo a protuberância do corpo em nossas roupas.

A libido está nua, pensa. Seu sexo ainda pulsa junto com o nosso. Somos três. Somos múltiplos. A Santíssima Diversidade.

Enquanto os três desejam o gozo o mundo desaba em água. São águas de verão. Os vidros embaçados escondem o mar que está lá fora. Só se ouve os cantos das sereias. Rainhas do mar, soberanas.

Em terra firme, no desembarque do terminal, antes do último ônibus, uma breve despedida. A senhora nos diz adeus com os olhos; brilhando. Escrevo na pele de Verônica, e tens o seu telefone gravado na pele com tinta de caneta Bic; assim a vemos sair com o pau pulsando na calcinha. Ainda com a Bic na mão e nada a dizer. Não há o que se dizer quando os corpos se entendem. Afinal, esta é a Arte de Amar.

Renato Mateus é goiano, mas atualmente vive em Florianópolis. É filósofo de rua, ininterruptamente apaixonado, extravagante, barquinho de papel jogado nas corredeiras da inconstância.

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Ibrahim
Alan Turing morreu com seios

Possui múltiplas personalidades e cada uma delas é bipolar.