Zé Agripino e Regina

_erinhoos
Alan Turing morreu com seios
1 min readJan 7, 2021
Imagem.

Zé Agripino conheceu Regina em um desses aplicativos de relacionamento. No início estava tímido. A condição da viuvez, a que impiedosamente fora lançado nas primeiras semanas da epidemia, parecia destacar a tão aparente ignorância nas artes da paquera.

Para um quarentão, ele dizia, a coisa da relação remota era estranha. Contudo, foi uma estranheza deveras relativizada pela paixão que ele passou a cultivar pela mulher intocável.

Às vésperas do armistício viral, eles marcaram o tão esperado encontro, clímax calculado da dedicação de meses de contemplação virtual. Na sua última aparição digital, na manhã do dia D, Regina mal conseguia respirar, de tanta ansiedade.

Ela, contudo, não compareceu ao Bar Brahma, e sequer respondeu às intermináveis e desesperadas ligações de Zé. Ele não esperava, horas depois, após arrombar uma porta nos Campos Elíseos com a ajuda daquele que, sonhava, viria a ser seu enteado, encontrar, nauseabundo, a mulher amante cujas dimensões reais até então desconhecia, a sua parte prometida e entediada, estirada atravessando o corredor, com o laço rosicler e as maçãs do rosto ostentando desencarnado rubor.

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_antropólogo, barista informal, errante incorrigível, cantor de karaokê, sérião nas horas vagas