O craque só desabrocha na velhice

Alessandro Caldeira
Ale Calldeira
Published in
3 min readAug 23, 2020

A partida de amanhã pela UCL não é a melhor final possível para o campeonato, mas para o brasileiro. O jogo enfatiza o camisa 10 da equipe francesa, onde alguns torcerão para que o craque seja confirmado (mesmo que o craque nunca seja para o presente, mas falo disso depois); outros, no entanto, estão enamorados com a ideia de sua derrota. O revés, para o brasileiro, possui sinais, contornos e sorrisos loureiros.

O jogo, porém, traz o gemido ensurdecedor do brasileiro em busca de emoção. Não houve, na história, nenhum momento onde a torcida suspirasse, desejando uma final europeia como agora.

Alguns, justificam o clima porque o sistema de eliminação decidido através de uma partida favorece o apelo dos arruídos. Há os que creditam ao campo neutro, pois anula o favoritismo.

Contudo, a razão para o deleite, clamor e tormento de cada torcedor está amplamente fincada em nossa alcova: a falta de ânimo.

Muito se discute sobre quanto que o futebol está cravado nos nossos sentidos e espírito, uma vez que a formação do brasileiro significa um punhado de partidas históricas de futebol argumentando sobre nossa consagração.

E é estranho que, hoje, momentos antes da final, esteja surpreendido com a ideia debitada em minha cabeça: o futebol, também, evidencia a nossa dor.

Agora mesmo estou imaginando alguém estendendo o cobertor por sobre sua cama e brandindo todo o seu pó e gosto de morte na eternidade de um encontro histórico.

Ainda existem os que são capazes de garantir que toda essa devoção é um humilhante indicador de que essa é a causa da nossa nacionalidade ser subvalorizada; mas, não há alguém com a mesma aptidão para assumir que o que menos dói, até então, é a brevidade que se assoma em todo ser que ousa escancarar a sua vida, torcendo.

Mas é preciso entender que em cada um de nós vive algo de moribundo e pachola para contemplar uma vida banal. Principalmente, agora, que os nossos quartos apresentam, de maneira insuportavelmente simples, a nossa cretinice e hostilidade.

Mas, não vou embargar apenas nesse assunto, ainda preciso falar do craque que é inútil para o presente. Não obstante, é necessário narrar um pequeno diálogo que tive com um colega.

Pois bem, ele dizia que não acredita que o craque brasileiro será reabilitado de corpo e alma em seu país, algo que concordei e retorqui: o craque não é para o presente.

Até hoje me lembro de Van Gogh dizendo para o padre em seu manicômio: não sou para essa geração. Creio que, assim como o pintor, nenhum craque está á disposição para o presente. Embora, o tempo possua leis mortais; no futebol, o tempo para o craque é aliado para a sua vida.

Pelé não foi unanimidade entre os brasileiros em sua época. Inclusive, hoje, ainda alguém aponta o dedo para a realeza, em tom desafiador: duvido que faria isso no futebol atual.

No entanto, todo lance último, absolutamente todos, estão ligados em raias que o craque deixou para o campo. Não há quem não pise em um gramado e diga ao Sol, em sinal de oração: estou andando no mesmo gramado em que um gênio pisou.

Por fim, o gênio que quiser ser ovacionado em sua época não pode ter ar de superioridade, é preciso ser um pouco estúpido, canalha e anêmico para que não rebaixe a nossa eterna religiosidade pelo medíocre.

Hoje, com uma vitória, o craque brasileiro irá marcar o gramado para ser lembrado depois da velhice.

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