Os Garotos de Rostov
Amigos, preciso confessar para tentar, ao menos, buscar me convencer de que são minhas próprias palavras: não aprecio mais o futebol. Falarei alguns motivos, aqueles onde mais me atingem.
Um deles se trata da qualidade dos jogos, embora ainda seja o menor deles, não posso deixar de manifestar o quão hediondo está sendo acompanhar o futebol de algumas equipes, como Bayern, Juventus, Real Madrid e o Flamengo.
Nenhum deles conseguem me arrancar algum tipo de sobressalto, lamúria ou mesmo um suspiro qualquer que fosse. Salvo os analistas esportivos que temos como estimação para replicar alguma ideia futurista no futebol.
Os gritos proféticos de “olha o gol”, típico do torcedor em estado de excitação não é possível de ser realizado. Ao invés disso, o grito passa arrastado e surdo, como a um moribundo que nota a sua comida acabando nas suas mãos.
Em um dos jogos do Barcelona, por exemplo, acreditei que Messi viria ser meu Esculápio e me fazer voltar a sentir prazer. Porém, os seus jogos estão sendo um verdadeiro caso de enforcamento, mas é preciso dizer que para sucumbir de tal modo é essencial que algo nos cause um amor conciso, por isso; apenas gozei de uma humilhante sensação de morte.
Um surto se apossou de mim ao perceber que existira não um mundo, mas um outro “eu”. Um, na qual, mudara em relação ao que era antes da pandemia. De repente, sinto que me misturava entre o que sou e o fato de uma outra partida.
A partida, no caso, foi realizada no campeonato russo entre Rostov x Socchi, que procedeu meu único momento de esperança em ser salvo, pois me invadiu uma vergonha da morte ao presenciar que os garotos de Rostov tiveram de enfrentar os soldados de chumbo de Socchi.
Explico: Rostov teve seis casos de covid-19 dentro de seu elenco, mas como “peças” (sinto-me contrariado ao colocas aspas) foram substituídos por garotos do sub-17.
Tão logo pensei, quando os garotos entraram no campo, que não deve ter sido muito difícil convence-los. Os jovens não sabem, ainda, como negar com veemência.
Pois bem, e os garotos de Rostov não demoraram para abrir o placar e aquilo me introduziu a um estado de indignação, não sabia se era submissão ou coragem; estupidez ou ódio. “Por Deus, que seja por ódio”. A verdade, é que a história mudou: eles foram goleados, ou melhor, sufocados por uma goleada por 10 a 1.
Cada gol nos enunciava (como se fosse um universo de lamentações gerado em nossos sentidos) cada um dos seis jogadores contaminados se estapeando a procura de ar.
No entanto, o que me deixou envergonhado não foi a goleada, mas o gol dos garotos como se nos pedíssemos para viver e não os deixar sozinhos.
Os gols do adversário, porém, me jogara na lama, estava sendo sepultado, enquanto refletia: será possível que só eu tenha mudado?
A cada gol eu me ajoelhava, igual a uma mãe presenciando o assassinato de seu filho, e pedia, como a uma oração: não comemorem.
Por Deus! Foram os meus últimos gritos vivos, mas perdi as forças antes mesmo do quinto gol.
Os soldadinhos de chumbo comemoravam, cada vez com mais força, ate que a morte passou a ser banal de tanto que matavam. (certamente já não ficamos de luto como antigamente).
Ao final da partida me rendi como Mineirinho: o nono gol me compadeceu, mas o decimo me matou.
Essa é maior razão para que eu tenha me afastado do futebol: nesses tempos, é inevitável que a cada gol tenha um sonoro ruído de dor.